São Paulo, segunda-feira, 09 de outubro de 2000

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INVESTIGAÇÃO
Em gravação do FBI, brasileiro preso nos EUA diz que receberia mais US$ 3 mi por corrupção na Prefeitura de SP

Fita sugere que MetroRED pagou suborno

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

A MetroRED, empresa do grupo norte-americano Fidelity, pagou US$ 1,5 milhão pela corrupção de autoridades da Prefeitura de São Paulo em 98, diz o empresário preso em Miami José Maria Teixeira Ferraz em gravação do FBI (polícia federal dos EUA).
Obtida pela Folha, a gravação mostra o brasileiro preso relatando a um informante do FBI como foi a operação na qual autoridades foram subornadas para que dessem autorização à MetroRED para instalação de cabos de fibras ópticas em São Paulo.
Segundo as gravações, a MetroRED prometeu ainda pagar pelo menos mais US$ 3 milhões a Ferraz e a seu sócio Oscar de Barros. Os dois brasileiros estão presos em Miami sob acusação de envolvimento com o narcotráfico.
A Fidelity, administradora do maior fundo de investimentos do mundo e dona da MetroRED, é investigada por promotores de Nova York devido à ação de sua controlada no Brasil. O caso foi revelado pela Folha em abril.
De acordo com as gravações, os dois empresários receberam apenas US$ 1,5 milhão do prometido porque, depois de descobrir indícios de corrupção, a sede da Fidelity nos EUA mandou demitir três diretores da MetroRED no Brasil e interrompeu os pagamentos.
O informante do FBI, o ex-doleiro Jamil Degan, que fez a gravação em seu escritório em Nova York, explicou a promotores dos EUA que os "mil e quinhentos" a que se refere na fita são US$ 1,5 milhão. "Para despistar, usei mil em vez de milhão", disse Degan à Folha. Logo depois de Degan falar "mil e quinhentos", Ferraz afirma ainda faltar "US$ 3 milhões".
A MetroRED constrói redes de fibras ópticas e fornece serviços de telecomunicações a empresas. Em 98, começou a funcionar em São Paulo depois de vencer resistências do Convias, departamento da Secretaria de Vias Públicas.
Nas gravações, Ferraz reclama de ele e de o sócio não terem recebido US$ 3 milhões. O FBI investiga ainda o valor total do negócio, que poderia chegar a US$ 8 milhões se concretizado.
"Nós fizemos dinheiro com esse caso", disse Ferraz na gravação, referindo-se à MetroRED. "Mas o que aconteceu é que o cara deve US$ 3 milhões ao escritório. O que aconteceu é que ele foi demitido porque descobriram algumas coisas que ele fez e o demitiram."
Ferraz conta ainda que consultou um advogado, aventando a possibilidade de processar a Fidelity para receber o que a MetroRED prometera. Segundo ele, o advogado disse que ele poderia tentar um processo no Brasil, mas não nos EUA. "Se eu tivesse um pequeno pedaço de papel que me permitisse processar a Fidelity aqui", lamenta Ferraz.
O nome de Ferraz e de Barros veio a público pela primeira vez em 1998, quando tentaram lucrar com a venda do dossiê Caribe. A Folha revelou ontem que eles negociavam os papéis contra o presidente Fernando Henrique Cardoso e tucanos.
O dossiê é um conjunto de papéis sem autenticidade comprovada sobre uma suposta conta secreta de FHC, do ministro José Serra (Saúde), do governador Mário Covas (SP) e de Sérgio Motta, ministro das Comunicações que morreu em 1998.
Além do dossiê Caribe, outras gravações do FBI, também em poder da Folha, revelam ainda a ligação de Ferraz e de Barros com o narcotráfico e mostram que ambos montaram em Miami uma fábrica de crimes com conexões em Brasília e em São Paulo.
O FBI investiga um esquema que se especializou em lavar dinheiro para políticos brasileiros, intermediar corrupção empresarial, falsificar documentos e, nos últimos dois anos, envolveu-se com o narcotráfico.
Pelas gravações, Ferraz menciona ter conseguido o contrato com a MetroRED pela influência de um "pastor", que seria amigo de um dos diretores da empresa.
Segundo o FBI, esse pastor é Caio Fábio d'Araújo Filho, o mesmo evangélico que, a pedido de Barros e de Ferraz, tentou vender o dossiê Caribe em 1998 a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), então candidato a presidente, e a outros políticos de oposição a FHC.
Segundo as gravações do FBI, ao explicar por que o negócio com a MetroRED não havia sido concluído, Ferraz disse: "Não funcionou porque o pastor teve problemas e um cara perdeu seu trabalho. O amigo do pastor. O negócio era o seguinte: o cara era presidente de uma multinacional. Ele queria usar cabos na Prefeitura de São Paulo".
O FBI identificou Jorge Luiz Frederich Vital, ex-diretor da MetroRED, como sendo o amigo do pastor. O nome Vital e do pastor constam de intimação do FBI obtida pela Folha.
Desde novembro de 1999, baseado em relatório do FBI e de informações entregues extra-oficialmente por autoridades brasileiras, um grupo de promotores de Nova York reuniu documentos, impressões digitais, extratos bancários e fotografias indicando que a empresa pagou propina a fim de obter autorização para instalar cabos em São Paulo.
Os documentos apreendidos pelo FBI em janeiro estavam no escritório de Barros e de Ferraz. Além de Barros e de Ferraz, o FBI investiga ainda, no caso MetroRED, Flávio Maluf, filho do ex-governador e candidato à Prefeitura de São Paulo, Paulo Maluf.


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