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FOLCLORE POLÍTICO
O caso Márcio Moreira Alves
RAPHAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES
Não me venham com a idéia
da fidelidade partidária. A
cada eleição politicólogos, cientistas políticos e sociólogos lançam,
na mesa, a tese da fidelidade partidária. Associam-na à idéia de
governabilidade. E querem, pela
via da fidelidade partidária, submeter a vontade livre do parlamentar às determinações do comando partidário ou das lideranças parlamentares. Seria a institucionalização da ditadura da direção partidária, uma agressão
inominável à liberdade de consciência do parlamentar.
Exorcismo a tese lembrando o
caso, ocorrido em 1968 com o então deputado do MDB/RJ, Márcio
Moreira Alves. Márcio fizera, da
tribuna da Câmara, uma bravata
estudantil contra os militares.
Atrás de um pretexto para endurecer o regime, os ministros militares por intermédio do presidente da República, solicitaram à Câmara dos Deputados licença para
processar o inquieto, como jovem,
deputado carioca. Houvesse fidelidade partidária e a solução seria
simples: a Arena majoritária fecharia a questão, o líder votaria
pela bancada, a licença estaria
concedida, o deputado processado, e, provavelmente, condenado.
Mas a licença foi recusada. Graças ao voto majoritário dos deputados da Arena, partido de apoio
ao governo. Sob a liderança republicana do deputado da Arena,
pelo Rio Grande do Norte, Djalma Marinho, cujo eletrizante voto na Comissão de Constituição e
Justiça, definiu a sorte da votação
em plenário impondo ao governo
uma esmagadora derrota. E o
Djalma Marinho, na ocasião, festejado por sua integridade e bravura, ao caminhar pelo longo corredor que separa a ala das comissões do plenário, lançou, no ar,
uma frase chapliana - ele era a
encarnação do espírito chapliano
do doce e distraído herói ungido
pelas circunstâncias: "Estou farto
de toda essa evidência e notoriedade. A glória momentânea pesa
sobre estes ombros de um pobre
político de Nova Cruz".
Djalma Marinho votou com a
sua consciência. E levou seus
companheiros de partido a acompanhá-lo, contra a orientação do
governo e da liderança partidária. Existisse fidelidade partidária
e ele teria se curvado para não
perder o mandato. E não teria podido terminar o seu histórico discurso dizendo "a meu rei dou tudo -menos a honra. Nego a licença para processar o deputado
do MDB Márcio Moreira Alves".
RAPHAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES,
71, ex-governador da Guanabara e ex-ministro da Previdência do governo Sarney, escreve às quartas nesta seção
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