São Paulo, quinta-feira, 09 de dezembro de 2004

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Chile contesta papéis sobre dinheiro de Pinochet que envolvem até Brasil

FABIANO MAISONNAVE
DE WASHINGTON

Um documento recém-divulgado e que havia sido apresentado pelo ex-ditador Augusto Pinochet (1973-90) ao Banco Riggs para justificar a origem do dinheiro mantido nos EUA é provavelmente falso, disse ontem o governo chileno. Na terça-feira, o "New York Times" havia informado, com base nesse documento, que ao menos US$ 12,3 milhões da fortuna do general vieram de depósitos efetuados por diversos governos, entre eles do Brasil e dos EUA, de 1974 a 1997.
"O que estamos fazendo é questionar se esse documento existe ou não, mas as primeiras informações que tenho é de que não existe. Amanhã [hoje] estaremos em condições, como governo, de refutar a origem da fonte [das informações]", disse ontem o ministro interino da Defesa, Francisco Vidal, segundo o jornal chileno "La Tercera".
O documento que serviu de fonte para o "NYT" foi divulgado na semana passada pela jornalista chilena Patricia Verdugo. Segundo ela, que refuta as informações do diário americano, um informe do Ministério da Defesa chileno encaminhado ao Senado americano pelo Riggs demonstra que o ex-ditador recebeu US$ 6,8 milhões do Ministério da Defesa chileno para serem usados em viagens ao exterior.
O Banco Riggs apresentou esses documentos à investigação no Senado em 2002 para poder justificar a origem de até US$ 8 milhões de Pinochet em contas secretas e assim se defender da acusação de que estava lavando dinheiro para o ex-ditador.

Duas interpretações
Sob o título "Comissões de Serviço ao Estrangeiro Realizadas pelo sr. Augusto Pinochet", o documento do Ministério da Defesa chileno demonstra que o ex-ditador recebeu, entre outros pagamentos, US$ 800 mil para uma viagem ao Brasil, em 1974, e US$ 3 milhões para uma visita oficial aos EUA, em 1976.
Anteontem, no entanto, o "NYT" apresentou uma nova interpretação. Segundo a reportagem, co-assinada pelo correspondente no Brasil Larry Rohter, o documento mostra na verdade depósitos a Pinochet feitos por governos de outros países, inclusive um pagamento conjunto feito pelo Brasil, pela Malásia e pelo Reino Unido.
Esse pagamento, de US$ 3 milhões, teria sido feito em 1995, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Na época, Pinochet ocupava o cargo de comandante do Exército.
Na verdade, o general chileno realizou, em setembro daquele ano, uma viagem por esses três países, conforme noticiado pela imprensa chilena à época, indicando que a versão de Verdugo é a mais plausível.
A versão do "NYT" sobre o documento está sendo contestada no Chile. Os principais jornais do país não deram destaque à reportagem do diário americano e questionaram suas conclusões.
Os advogados de defesa de Pinochet negaram que o general tenha recebido dinheiro de outros países. Um deles disse ao jornal "La Tercera" que não há registros de que Pinochet tenha recebido dinheiro do exterior. "É provável de que se trata de um má interpretação sobre diárias de viagem".

"NYT se equivocou"
Verdugo, uma das principais especialistas chilenas sobre o regime de Pinochet e a primeira a avaliar o teor do documento, acredita que "o "NYT" tenha se equivocado" na interpretação dos documentos recebidos.
"Trata-se de dinheiro que o Ministério da Defesa do Chile entregou a Pinochet, e não de dinheiro que os países visitados entregaram a Pinochet. A fonte é um documento do Ministério da Defesa, Subsecretaria de Guerra, dando conta dos pagamentos a Pinochet por diárias de viagens".
Segundo Verdugo, autora de vários livros sobre o regime de Pinochet, a reportagem do "NYT" chegou ao valor de US$ 12,3 milhões porque somou pesos chilenos como se fossem dólares.
O setor de relações públicas do "NYT" voltou a informar à Folha ontem à noite que as informações da reportagem estão corretas.


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