São Paulo, quinta-feira, 10 de maio de 2001

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ÚLTIMO ATO

"Não vejo nenhum crime nisso", diz o ex-ministro, que deixou o cargo após suspeitas de irregularidades

De saída, Bezerra libera R$ 80 milhões

WILLIAM FRANÇA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

No seu último dia como ministro da Integração Nacional, o senador Fernando Bezerra (sem partido-RN) liberou mais de R$ 80 milhões em verbas para convênios com prefeituras e emendas de parlamentares ao Orçamento.
"Não vejo nenhum crime nisso. Os recursos estavam aí, liberados, à disposição do ministério, faltando apenas algumas assinaturas", afirmou Bezerra. "Não é esse um dos papéis de ministro?", completou, com uma interrogação.
Bezerra espera a confirmação da sua "exoneração a pedido" feita por carta ao presidente Fernando Henrique Cardoso, entregue ontem à noite, para "retomar dois cargos e tomar uma atitude".
A saber: reassumir a presidência da CNI (Confederação Nacional da Indústria), às 12h, depois de retornar ao Senado e, assim, estar apto a assinar o requerimento da CPI da corrupção.
Até a conclusão desta edição, a Casa Civil da Presidência não confirmava a publicação da exoneração de Bezerra no "Diário Oficial" da União de hoje, que é necessária para que ele esteja livre para assinar o pedido da CPI.
O senador José Eduardo Dutra (PT-SE) procurou Bezerra ontem pela manhã, para que ele assinasse o requerimento antes de a oposição protocolá-lo.
"Não podia fazer isso. Só amanhã [hoje], quando serei ex-ministro", acreditava Bezerra. Mas ele se precaveu diante da possível demora estratégica do governo: "Vou assinar de qualquer forma, mesmo que tenha apenas um valor simbólico e não tenha mais validade na conta oficial".
A decisão de apoiar a CPI foi objeto da última conversa entre Bezerra e FHC. Num telefonema por volta das 16h15, Bezerra pediu desculpas por ter pedido demissão ao vivo, pela TV, sem ter comunicado a decisão antes ao presidente e justificou sua assinatura.
"Eu disse que era para que pudesse preservar a minha honra, para que não pairassem dúvidas sobre as denúncias de mau uso do dinheiro da Sudene", afirmou Bezerra. "O presidente disse que compreendia o meu gesto."
Dizendo-se "bastante aliviado" -sua pressão sanguínea, que é 12 por 8, havia atingido 17 por 11 no dia da demissão-, Bezerra foi ontem com um grupo de 11 amigos almoçar na churrascaria Porcão, a mais cara de Brasília (R$ 34,50 por pessoa). O grupo tomou três garrafas de vinho português da marca Esporão (R$ 80 a garrafa). Depois, dividiu a conta.
Ao final do almoço, Bezerra retomou em público um de seus hábitos privados: fumar charuto.
"Não vejo o charuto como status de opulência, como sempre vi, desde criança, em Santa Cruz do Inharé, no sertão potiguar. Para mim, é relaxante", afirmou.
Ele manteve as críticas ao PMDB. "Só recebi um telefonema de apoio: do deputado Michel Temer (SP), que disse que não pactuava com as decisões da tal cúpula do partido e que não aceitará ser ministro no meu lugar."


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