São Paulo, Sábado, 10 de Julho de 1999
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BNDES apóia acordo com empresa

FERNANDO RODRIGUES
da Sucursal de Brasília

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) defendeu enfaticamente, em documento reservado enviado ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, a instalação da Ford na Bahia com incentivos federais como forma de reduzir a desigualdade econômica do Nordeste em relação a outras regiões do país.
Apesar disso, por causa de eventuais reclamações de outros países, o Brasil talvez "tenha que fazer concessões comerciais aos parceiros do Mercosul e a alguns da OMC (Organização Mundial de Comércio)", diz o estudo do BNDES.
Obtido pela Folha, o documento do BNDES tem sete páginas e vem assinado pelo presidente do banco, José Pio Borges. Foi entregue a FHC no último dia 6, terça-feira desta semana.
Embora o governo já tenha anunciado ontem que pretende manter a Ford na Bahia, o presidente vai usar esses argumentos do BNDES como parte de sua decisão sobre vetar, sancionar ou sancionar parcialmente a medida provisória aprovada pelo Congresso na semana passada, que beneficia a instalação da montadora em Camaçari, cidade próxima a Salvador -inclusive com um empréstimo da ordem de R$ 700 milhões do BNDES.
Um dos argumentos numéricos apresentados por Pio Borges é a brutal concentração de empréstimos do BNDES para as regiões Sul e Sudeste nesta década.
Em 91, segundo o documento do BNDES, 25% dos empréstimos do banco foram para o Nordeste, e 64%, para as regiões Sul e Sudeste. No ano passado, esses percentuais foram de 10% para o Nordeste e 79% para o Sul e para o Sudeste. "Esse quadro, de concentração espacial dos desembolsos, tende a se acentuar pela própria dinâmica da economia, acirrando ainda mais os desequilíbrios regionais do país", escreveu Pio Borges em seu estudo para FHC.
Apesar de fazer ampla defesa da instalação da Ford na Bahia, o BNDES apresenta também algumas ressalvas importantes sobre a reação internacional.

Mercosul
No âmbito do Mercosul, diz texto de José Pio Borges, não há nada que formalmente "impeça a edição de medida alterando o regime automotivo brasileiro até o final de 99".
Os países do Mercosul acertaram apenas que pretendem caminhar para um regime automotivo único a partir de 1º de janeiro do ano 2000. Até lá, cada país faz o ajuste que desejar, segundo o estudo do BNDES.
Já perante a OMC, conforme escreveu Pio Borges, esse tipo de incentivo para o desenvolvimento regional "não pode ser acionado para um setor industrial específico (deve ser genérico)". Em seguida, o relatório conclui que, por parte da OMC, "há possibilidade de haver contestação".
No caso da Argentina, esse país estaria insatisfeito porque a instalação da Ford no Rio Grande do Sul (como era o plano inicial da montadora) traria "compensações comerciais naturais" à economia argentina. A indústria de autopeças do país vizinho se preparava para fornecer material para a Ford. Agora, pela distância da Bahia, isso fica inviabilizado.
Por conta dessas eventuais contestações internacionais é que o BNDES considera que o Brasil venha a ter de fazer concessões a alguns de seus parceiros comerciais do Mercosul e da OMC.

Incentivos
Pio Borges usa cinco argumentos para rebater as críticas sobre os incentivos concedidos à Ford:
1) renúncia fiscal do Estado - trata-se de uma "isenção temporária do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)". A "renúncia é feita em relação a uma receita virtual". Hoje, a receita de ICMS da Ford para com a Bahia é zero.
Pio Borges acha "improcedente" criticar a renúncia fiscal, pois, "se a empresa não recebesse o benefício, ela simplesmente não se instalaria no local, e, consequentemente, a receita dela derivada também seria nula";
2) isenção temporária - o Estado da Bahia não concederá indefinidamente o benefício à Ford, mas por um prazo determinado;
3) outras indústrias - a instalação da Ford, ainda que com isenção de ICMS, "colocará em ação todo um vasto conjunto de indústrias fornecedoras de produtos para tal montadora" que estarão pagando impostos normalmente. Portanto, argumenta Pio Borges, "o Estado passará a ter mais receita do que a que teria sem a instalação da montadora em questão";
4) isenção federal - apesar de a Ford ficar isenta temporariamente de alguns impostos federais, diz o documento do BNDES, "irá recolher outros, como, por exemplo, a CPMF ou a Cofins, de tal modo que haverá um ganho líquido de receita";
5) empregos - haverá criação de empregos com a implantação da montadora. "Ou seja", escreveu Pio Borges, "o balanço de custos e benefícios de uma iniciativa empresarial desse porte, do ponto de vista governamental, deve levar em conta não apenas o cálculo econômico, mas também os ganhos sociais que isso implica".


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