São Paulo, domingo, 11 de abril de 1999

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SISTEMA FINANCEIRO
Banco salvo da quebra pelo BC em janeiro ganhou e perdeu com agressividade no mercado financeiro
Patrimônio do Marka dobrou com o Real

ALEX RIBEIRO
da Sucursal de Brasília


Os sócios do Banco Marka, que comprou dólar abaixo da cotação do Banco Central em uma operação secreta de socorro, conseguiram mais do que duplicar seu capital investido no banco durante o Plano Real.
Em dezembro de 1994, ano de lançamento do Real, o patrimônio líquido (dinheiro aplicado no banco pelos acionistas) do Marka se resumia a R$ 28,250 milhões.
Graças à estratégia de correr altos riscos para ampliar os lucros, o patrimônio líquido do Marka saltou para R$ 68,074 milhões em dezembro de 98 -pouco depois, em janeiro, o BC injetaria no banco volume ainda desconhecido de recursos públicos para salvar o banco da quebradeira.
O Marka é uma das instituições que serão investigadas pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos bancos no Senado.
Os senadores vão apurar se houve favorecimento ou se o BC exorbitou seus poderes no socorro.
Antes de quebrar, o Marka era festejado como um banco lucrativo que, graças a sua administração agressiva, figurava na lista das instituições financeiras com maior rentabilidade no mercado.
A história de sucesso do Marka vem pelo menos desde 93, quando o banco conquistou o primeiro lugar no ranking dos mais lucrativos.
No ano seguinte, o presidente do Marka, Salvatore Alberto Cacciola, anunciou a transferência do banco para uma sede duas vezes maior, no Rio, e investimento de R$ 700 milhões em equipamentos de informática, soma considerável para um banco de pequeno porte.
Já naquela época, em entrevista à Folha, Cacciola fazia a apologia da estratégia de altos riscos, conhecida no meio financeiro como alavancagem: "Quanto mais oscilações você tiver, mais aumenta seu risco, mas mais pode aumentar sua alavancagem de ganho".
O passo seguinte, em 1995, foi a internacionalização, com a abertura de um escritório nas Bahamas, conhecido paraíso fiscal.
O ano de 1996 foi um dos melhores da história do Marka, que lucrou R$ 15,272 milhões, segundo as contas de resultado apresentadas nos balancetes do sistema eletrônico de informações do BC.
O lucro de 1996 pode ser considerado extraordinário, considerando que no início daquele ano o patrimônio líquido da instituição era de apenas R$ 37,976 milhões. Ou seja, para cada R$ 1 de capital empregado no banco, os controladores lucraram R$ 0,40.
Performances mais do que satisfatórias também foram obtidas em 1997, com lucro de R$ 14,776 milhões, e em 1998, em meio à crise russa, R$ 10,743 milhões.
Na desvalorização promovida pelo ex-presidente do BC Francisco Lopes, Cacciola quebrou ao reproduzir a mesma estratégia que trouxe lucros anteriormente: a alta alavancagem.
O Marka apostava que a política cambial do governo seria mantida, sem uma desvalorização brusca do real. Isso lhe valeu lucros antes, mas em janeiro sua aposta se mostrou errada.
O banco tinha 12.600 contratos no mercado futuro de dólar, representando negócios de R$ 1,26 bilhão. Esse número era equivalente a 20 vezes o patrimônio do banco, então em R$ 62,632 milhões.
Por esses contratos, o Marka se comprometeu a vender dólar a R$ 1,22. Foi uma aposta alta na manutenção da política do BC. Na época, o BC mantinha o dólar em um valor praticamente fixo e garantia que não desvalorizaria a moeda.
Em 13 de janeiro, Lopes colocou em prática um sistema de câmbio que, na prática, deixou a cotação do dólar oscilar até R$ 1,32.
O Marka perdeu dinheiro porque se comprometeu a vender dólar por R$ 1,22 quando ele já custava R$ 1,32: estava perdendo R$ 0,10 em cada dólar vendido.
Grosso modo, o prejuízo do banco podia ser estimado em R$ 126 milhões, ou o dobro do patrimônio líquido do banco. Ou seja, o dinheiro investido pelos controladores no Marka já não era suficiente para cobrir a perda. Foi aí que entrou o dinheiro público.
O BC vendeu dólar barato ao Marka, a R$ 1,275. Assim, cobriu parte do prejuízo. Tendo como base o teto da banda cambial (R$ 1,32) que vigorava em 14 de janeiro, dia do socorro, o Banco Central arcou com um prejuízo que deveria ser do Marka de R$ 54 milhões.
Em relação à cotação que outros bancos pagaram naquele dia para bancar suas posições, de R$ 1,55, o BC aliviou o prejuízo do Marka em cerca de R$ 270 milhões.
O BC sustenta que o socorro foi necessário para evitar uma crise no sistema financeiro. Caso o Marka e o FonteCindam quebrassem, a instituição diz que temia que o mesmo ocorresse com outros bancos, agravando a crise cambial.
Essa não foi a primeira vez que o Marka se deu mal em mudanças cambiais. No primeiro semestre de 1995, o banco teve o resultado mais modesto de sua história, com lucro de apenas R$ 286 mil.
Naquele ano, foi implantado o primeiro sistema de bandas cambiais, idealizado pelo então presidente do BC, Pérsio Arida.



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