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DOMINGUEIRA
Contra os dois
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo
Escrevo da ensolarada e encantadora Lisboa, capital do país
europeu que, por todos os motivos, inclusive o geográfico, menos
riscos corre de se envolver com a
guerra movida pelos EUA e seus
comandados contra Milosevic.
Ainda assim, como em toda parte, ainda mais tratando-se de um
membro formal da Otan, Portugal
discute a guerra. Há campanhas
de ajuda aos refugiados e debates
diários na TV e na imprensa. Nas
ruas, prevalece a indiferença, a
não ser por faixas e pichações do
PCP e grupos de esquerda condenando a ofensiva "aliada".
O fato é que a Otan tem, principalmente na Europa, a desvantagem, em relação ao ditatorial Milosevic, de ter que travar uma segunda guerra: a da comunicação.
Como convencer o sujeito das
ruas, a chamada opinião pública,
de que aqueles milhares de coitados do Kosovo, ali ao lado, são vítimas da Sérvia e estão sendo beneficiados pela intervenção militar?
Como provocar um sentimento
de adesão diante de imagens de
uma cidade européia, como Belgrado, sofrendo bombardeios e
ardendo em chamas?
Talvez fosse menos difícil se não
houvesse no ar a sensação, por sinal verdadeira, de que a Europa,
mais uma vez, está a reboque dos
norte-americanos, numa posição
obsequiosa e subalterna.
A situação entre os "aliados" é
ambígua, com divergências já explicitadas por Itália e Grécia. As
ameaças de Ieltsin, ainda que tomadas pelos americanos como
fanfarronice, são preocupantes
para os europeus, que já se sentem
desconfortáveis com o assédio de
mais estrangeiros em suas fronteiras. Situações bem menos complexas do que essa fogem ao controle.
O esforço das lideranças dos países envolvidos tem sido o de tentar
demonstrar que não havia mais
outra solução para interromper o
massacre étnico promovido por
Milosevic. Mas tampouco a intervenção militar, aos olhos do homem comum, parece ser a solução
-mesmo porque um desfecho
sem custos e sequelas é impossível.
É certo, por outro lado, que a
passividade européia diante das
atrocidades cometidas pela Sérvia, além de moralmente pusilânime, poderia acabar saindo mais
cara politicamente.
Como disse um amigo, que
acompanha de perto o conflito
por motivos profissionais, para
ele a batalha dos EUA contra Milosevic é como seria para um torcedor corintiano uma partida de
futebol entre a seleção da Argentina e o Palmeiras. Não há alternativa, senão torcer contra os dois.
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