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São Paulo, sábado, 11 de outubro de 2003

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CIDADÃ REVISTA

Especialistas divergem se Nelson Jobim deve ser punido por incluir na Constituição artigos sem votação

Para advogados, Carta perde credibilidade

Sergio Lima/Folha Imagem
Francisco Fausto, do TST, que defende uma nova constituinte


LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Constituição perdeu credibilidade após a revelação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Nelson Jobim de que pelo menos dois artigos foram incluídos no texto final da Carta de 1988 sem o conhecimento dos constituintes. A opinião é compartilhada por quatro dos cinco advogados constitucionalistas ouvidos pela Folha.
A maioria criticou abertamente a atitude do ministro, mas nem todos defenderam uma punição.
"A Constituição não existe. Perdeu a validade", afirmou o advogado Ives Gandra Martins, que, em 1988, acompanhou os trabalhos dos constituintes.
A polêmica declaração de Jobim foi feita às vésperas do aniversário da Constituição, há uma semana, quando o ministro afirmou que dois artigos foram incluídos sem serem votados. A iniciativa, segundo ele, teria partido do então presidente da Assembléia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, em reunião com pelo menos cinco líderes partidários.
"É um precedente perigosíssimo. Como esses dispositivos [incluídos sem votação] não têm validade jurídica, a Constituição não tem validade, apesar de ter criado um efeito jurídico", disse Gandra Martins. Para ele, a única solução seria o governo federal enviar ao Supremo uma ação declaratória de constitucionalidade pedindo para validar os novos artigos.
Jobim, que é vice-presidente do Supremo, não pode ser punido, disse Gandra Martins. "Ele não fez nada sozinho. Se fosse punido, todos os demais constituintes também deveriam ser."
A reação mais dura às declarações de Jobim partiu do conselheiro da seção paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) Luiz Antonio Sampaio Gouveia, pré-candidato à presidência do órgão. Anteontem ele enviou um pedido à OAB pedindo a destituição de Jobim do cargo de ministro do Supremo.
"Como membro do STF, Jobim é o guardião da Constituição. Ao insinuar que houve fraude no processo, desrespeitou a Constituição e desmoralizou a instituição jurídica brasileira. É crime de falsidade ideológica", afirmou Sampaio Gouveia.
Amigo de Ulysses Guimarães, o advogado Goffredo da Silva Telles afirmou que o ministro foi "extraordinariamente imprudente". "Eu conheci Ulysses e duvido que ele tivesse conhecimento dessa ilegalidade. É uma imprudência que jamais poderia ter sido cometida", disse Silva Telles, que defende a reforma da Carta.
O jurista Miguel Reale disse que o melhor, "nesta altura do campeonato", é deixar a Constituição como está. Para ele, deve prevalecer o entendimento de que é intangível o texto promulgado em 1988. Sobre a atitude de Jobim, disse que não iria comentar.

Livro
Quando afirmou, no domingo passado, que dois artigos haviam sido incluídos na Constituição sem o conhecimento dos parlamentares, Jobim revelou apenas um deles -o que trata da independência e da harmonia entre os Poderes. O segundo, disse, irá guardar para o livro que pretende escrever sobre 1988.
A intenção foi criticada pelo presidente da OAB paulista, Carlos Miguel Aidar. "Jobim não tem o direito de sonegar uma informação como essa, ainda mais porque quer guardar para um livro, isso não existe."
Para o presidente da OAB, no entanto, a revelação de Jobim não pode ser punida. "Não existe crime para aquilo que não há pena prevista em lei."


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