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CELSO PINTO
Na zona de
turbulência
Cinco meses depois do início
da crise externa, em agosto, o
Brasil acumula uma perda de
mais de US$ 40 bilhões por
meio dos câmbios flutuante e
comercial. Na crise asiática de
97, ao contrário, no quinto
mês depois da crise, havia um
ganho líquido acumulado de
US$ 3,6 bilhões, que subiu para US$ 11,1 bilhões ao final de
seis meses.
A observação é do ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore. Ela reforça
sua conclusão de que a velocidade de redução dos juros deverá ser menor do que a observada na crise asiática, porque
os efeitos da atual crise têm sido muito maiores.
O espaço para reduzir os juros ficou ainda mais estreito,
nos últimos dias, pelo forte aumento nos juros dos títulos da
dívida brasileira no exterior e
pela queda das reservas.
O governador Itamar Franco, como ficou claro na entrevista que deu no sábado,
achou divertido o impacto de
sua moratória. Com um sorriso e muita ironia, disse estar
"muito preocupado" com suas
ações em Tóquio, Hong Kong e
Nova York.
Os mercados, contudo, não
acharam graça na moratória.
Emissões brasileiras foram
adiadas e o prêmio de risco pago pelos IDUs (títulos da dívida externa brasileira) subiram para quase 1.600 pontos
básicos de porcentagem acima
dos títulos do Tesouro americano, a pior marca desde outubro. É o dobro do que o Brasil pagava no Natal e 60% acima dos 980 pontos que pagava
logo antes da moratória.
O aumento da rentabilidade
do papel brasileiro no exterior
acaba atraindo aplicações de
quem aceita correr o risco Brasil e pode optar entre colocar o
dinheiro aqui ou lá fora (o que
inclui investidores brasileiros). No passado, quando a remuneração do IDU esteve
muito superior aos juros internos, houve saída mais forte de
dólares.
Tomando por base cálculos
do Banco Liberal, com o IDU
rendendo 20,5% ao ano (prêmio de risco de 1.570 pontos), a
taxa de juro líquida no Brasil
teria que estar em 40% para
ser competitiva e não em 29%.
Isso, sem considerar o Imposto
de Renda, que elevaria a taxa
bruta para mais de 44%. Os
40% permitiriam ter um rendimento igual ao do IDU, com
proteção contra desvalorização cambial.
Em outros termos, com o aumento da remuneração dos
papéis brasileiros no exterior,
pela maior percepção de risco,
a pressão é para subir os juros,
como forma de reduzir o risco
de saída de capitais.
Os termos do acordo do Brasil com o FMI também empurram para cima os juros. As reservas líquidas ajustadas, que
não consideram o dinheiro da
ajuda externa do FMI e do G-
7, já estariam em torno de US$
32 bilhões, no cálculo de um
grande banco americano.
Já é menos do que o piso que,
pelo que se sabe, está embutido no acordo com o FMI para
todo o primeiro trimestre (US$
33,2 bilhões). Quando a reserva cai abaixo desse piso, o
acordo induz a um aperto monetário gradual compensatório, ou seja, empurra para cima os juros.
A dificuldade em conciliar a
pressão política crescente e
ampla pela redução dos juros,
com a pressão "técnica" pelo
aumento dos juros, por sua
vez, aumenta ainda mais a
desconfiança dos mercados.
Por trás dessa dificuldade se
forma uma percepção: o custo
recessivo embutido na estratégia de defesa da taxa de câmbio está ficando alto demais.
Quando há dúvidas políticas
sobre a capacidade de levar a
estratégia adiante, aumentam
as dúvidas sobre o futuro do
regime cambial.
A força da crise externa só
complica o cenário. Na crise
asiática de 97, a perda de reservas foi aguda, mas rápida.
No câmbio comercial, como
mostra o trabalho de Pastore e
da professora Maria Christina
Pinotti, já no terceiro mês após
o início da crise, o saldo havia
ficado positivo em US$ 277 milhões.
O câmbio flutuante continuou negativo, mas já a partir
do quinto mês, os ganhos acumulados no câmbio comercial
(US$ 18 bilhões) permitiram
ao país ter um saldo cambial
positivo, apesar do câmbio flutuante. A resposta do mercado
ao aumento de juros foi rápida
e positiva.
Desta vez, o saldo acumulado nos dois câmbios continua
muito negativo. No final do
quinto mês, em dezembro, pelo comercial o saldo acumulado estava negativo em US$
21,2 bilhões e pelo flutuante,
em US$ 18,1 bilhões, um total
de US$ 39,3 bilhões. Considerando a perda adicional de
US$ 880 milhões na primeira
semana de janeiro, a perda
acumulada supera US$ 40 bilhões.
Em novembro e dezembro,
observa o trabalho, as saídas
superaram US$ 7 bilhões, numa velocidade semelhante à
de outubro, no pico da crise,
apesar do pacote de apoio externo e dos juros altos. O prêmio de risco, com a ajuda de
Itamar, também voltou aos níveis de outubro. O Brasil voltou a uma zona de intensa turbulência.
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