São Paulo, quinta, 12 de março de 1998

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REGIME MILITAR
Militares dizem que presidente sabe quem é Fayad por tê-lo nomeado, pela primeira vez, ano passado
FHC mantém general acusado de tortura

RUI NOGUEIRA
da Sucursal de Brasília

O presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou ontem que vai manter no cargo o general Ricardo Fayad na subdiretoria de Saúde do Exército.
O general é acusado por grupos de defesa dos direitos humanos de conivência com torturas durante o regime militar (1964-1985).
Fayad é subdiretor desde fevereiro deste ano e foi promovido a general-de-brigada em 94 pelo então presidente Itamar Franco.
Os militares não aceitam a saída do general e têm quatro argumentos para defender a sua manutenção nas funções atuais.
O primeiro argumento: FHC sabe quem é o general porque já o tinha nomeado, por meio de portaria no "Diário Oficial" da União, em 97, para a função de 1º subdiretor de Saúde do Exército.
Anteontem, o porta-voz da Presidência da República, Sergio Amaral, disse que FHC "não tinha conhecimento dos fatos que foram apontados pela imprensa" e que iria se informar melhor sobre o caso com o ministro Zenildo de Lucena (Exército). Até ontem à noite, o presidente não tinha chamado o ministro. A Folha apurou que o chamado formal para pedir explicações ao ministro não acontecerá.
Ao final de 97, o Exército fez uma reforma administrativa na área de saúde e fundiu a 1ª e 2ª subdiretorias em uma única subdiretoria entregue a Fayad.
Em carta enviada a FHC, o Grupo Tortura Nunca Mais lembrou que o general teve o seu registro profissional cassado pelos conselhos Regional e Federal de Medicina. Fayad serviu, nos anos 60 e 70, no quartel da rua Barão de Mesquita, na Tijuca (zona norte do Rio), como médico que verificava as condições dos presos políticos para suportar torturas.
O segundo argumento: Fayad não pode ser proibido de exercer as funções de médico por ser militar. Pela lei 6.681/79, médicos militares não são sujeitos à ação disciplinar de conselhos de medicina.
O terceiro: a Justiça Federal decidiu, em um processo de Fayad contra os conselhos de medicina, que ele pode continuar exercendo a profissão.
Ontem, o porta-voz da Presidência disse que FHC já fora informado da situação de Fayad pelo ministro-chefe da Casa Militar, o general Alberto Cardoso.
Segundo Sergio Amaral, Fayad fica no cargo por três motivos: porque não houve qualquer promoção, porque as funções são administrativas e porque ainda corre na Justiça um recurso do Conselho Regional de Medicina do Rio.
Julgado o processo, se nenhuma das três explicações dos militares convencer FHC, eles vão lançar mão de um quarto e último argumento político-ideológico.
Vão lembrar a FHC que o Exército ficou calado durante o processo de indenização das famílias dos presos e desaparecidos políticos.
Por não terem contestado a decisão de governo de conceder as indenizações, o Exército quer que o governo respeite a nomeação de Fayad.
Em carta enviada aos jornais ontem, o general Helio Ibiapina Lima, presidente do Clube Militar, defende a manutenção de Fayad no cargo e pede, ainda, que cesse a "vingança contra os militares".
Ele diz que a anistia ampla geral e irrestrita concedida pelo presidente João Figueiredo aos marxistas, terroristas e corruptos de todas as espécies é mitigada, particular e restrita para os outros.
"Enquanto isso, assassinos, ex-terroristas, assaltantes, sequestradores viraram heróis do cinema e figuras de projeção nacional premiados com opulentas indenizações", afirma na carta.


Colaborou William França, da Sucursal de Brasília


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