São Paulo, quinta, 12 de março de 1998

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CASO CPEM
Petista disse a comissão que ajudou a levantar US$ 400 mil para resgatar sobrinho de Teixeira em 93, mas dinheiro não foi utilizado
Lula intermediou pagamento de sequestro

LUIZ MAKLOUF CARVALHO
da Reportagem Local

O pré-candidato do PT à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, intermediou diretamente, junto a "empresários amigos", a arrecadação de US$ 400 mil para pagar o resgate do sequestro, em dezembro de 1993, de um sobrinho do advogado Roberto Teixeira, seu compadre e dono da casa em que mora de graça desde 1989.
A história foi revelada pelo próprio Lula em depoimento prestado em 30 de junho do ano passado à Comissão Especial que investigou o caso Cpem.
Ele contou sobre a arrecadação do dinheiro quando discorria sobre a relação de amizade com Teixeira. Pediu claramente que não fosse registrada nos autos -"também não quero que saia aqui", disse- mas não foi atendido.
A reportagem da Folha procurou Lula para perguntar quais empresários contribuíram e o que foi feito do dinheiro - já que o sobrinho saiu ileso e não houve necessidade de pagar o resgate aos sequestradores.
A resposta foi dada por Francisco Rocha, membro do Diretório Nacional do partido: "Eu, o Lula, ou qualquer outro, não temos obrigação de dar informações públicas sobre coisas internas do PT", disse.
Caso Cpem
A reportagem da Folha obteve a íntegra deste depoimento de Lula. Obteve, também, a íntegra do processo (407 páginas) da Comissão Especial de Ética que avaliou o comportamento do filiado Paulo de Tarso Venceslau -o economista que ano passado denunciou tráfico de influência favorecendo a Cpem -empresa que prestou diversos serviços a prefeituras petistas.
Lula também depôs nesta última comissão -assim como José Dirceu, Aloizio Mercadante, Gilberto Carvalho e o próprio Paulo de Tarso Venceslau.
"Foi 11 dias de sequestro", disse Lula em português descontínuo e arrevesado, que caracteriza os dois depoimentos que o petista concedeu.
"O Roberto é um cara que tem muito patrimônio mas é um duro, pra você ter uma idéia, Hélio, (Bicudo, deputado federal, integrante da Comissão Especial) quem teve que ir atrás de dinheiro, era US$ 400 mil, fui eu que fui atrás de uma parte dele, sabe, pedi pra empresários amigos, olha tem uma situação delicada de sequestro de uma pessoa, o irmão do Roberto queria vender a casa, queria vender o carro, ninguém consegue vender as coisas assim de uma hora para outra, eu lembro que teve empresários nossos amigos que eu também não vou citar o nome aqui, que eu sou muito grato, porque a hora que a gente pediu, o cara no mesmo dia arrumou uma parte do dinheiro, e graças a Deus não precisou utilizar o dinheiro porque prenderam o sequestrador (...)".
Jeitinho
Os integrantes da Comissão -Bicudo, o vereador José Eduardo Martins Cardoso e o economista Paul Singer- ouviram o pré-candidato contar sobre o momento em que "o Roberto Teixeira caiu em desgraça no PT", outra "coisa interna" do partido.
Segundo o relato de Lula, Teixeira flagrou, em 83, sete vereadores do PT de São Bernardo dando um "jeitinho" para pagar o partido sem que lhes pesasse o bolso.
O "jeitinho" era receber o pagamento adiantado, colocar na poupança, e pagar os 30% de contribuição com os rendimentos da ciranda inflacionária.
"Quando ele descobriu isso, os sete vereadores viraram inimigos do Roberto e começaram a queimar", disse Lula. Houve ameaças respectivas de comissões de ética, mas ficou tudo por isso mesmo. Segundo Lula, o episódio agastou Teixeira e fez com que aos poucos fosse se afastando do PT.
Houve um outro "problema muito sério" em 1988, prossegue Lula. Deu-se que Maurício Soares, eleito prefeito de São Bernardo pelo PT, convidou seu amigo Teixeira para assumir a secretaria jurídica do município.
Já com planos de mudar-se para Miami, Teixeira relutou -e foi preciso "um trabalho muito longo de convencimento" para que aceitasse. "Quando o Roberto aceitou, essa é outra coisa que eu não queria que tivesse no relatório, a mulher do Maurício vetou..."
"A mulher do Maurício", comentou um integrante da comissão. E Lula retomou: "Porque tinha um conflito com as duas mulheres que eu não vou entrar nessa história".
O fato é que, a partir daí, embora crescendo a relação de amizade com Lula, o advogado ficou ressentido e foi se afastando.
Campinas
Outra coisa que Lula não queria que saísse -e novamente pediu isso à comissão- diz respeito à sua opinião sobre o ex-petista Jacó Bittar, ex-prefeito de Campinas, no momento arrolado como testemunha de defesa de Lula em um dos processos judiciais que está movendo contra Paulo de Tarso Venceslau.
A pergunta da comissão versava sobre o encontro que teria havido entre Jacó, Lula e Venceslau, onde o segundo tentaria convencer o terceiro sobre a conveniência de contratar a Cpem em Campinas (99 km a noroeste de SP).
Lula negou o encontro, com a seguinte declaração: "Eu nunca confiei politicamente no Jacó, portanto eu jamais iria conversar de dinheiro com o Jacó, ou seja, o Hélio (Bicudo) foi candidato majoritário em 82 e o Jacó nunca foi uma pessoa que merecesse da minha parte confiança sobre assuntos que não pudessem ficar públicos (...) Eu tinha uma desconfiança política no Jacó muito grande e quem conhece o Jacó bem sabe também que ele não teria coragem de discutir um assunto qualquer fosse desses em público (...)".



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