São Paulo, domingo, 12 de abril de 1998

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SUCESSÃO
Exposição provocada por bônus eleitorais no pleito de 94 privilegia o uso de métodos que não deixam marcas
Empresas reforçam doações subterrâneas

FREDERICO VASCONCELOS
da Reportagem Local


Levantamento realizado pela Folha nos últimos dois meses conclui que as empresas reforçarão os mecanismos subterrâneos de doação, na eleição de outubro.
Ressabiados com a exposição provocada pelos bônus eleitorais no pleito de 94, grandes grupos empresariais que costumam financiar eleições deverão concentrar o maior apoio eleitoral nos velhos esquemas que não deixam marcas.
Nos últimos dois meses, a Folha consultou 24 empresários -presidentes de grandes organizações, especialistas em marketing político e ex-tesoureiros de campanhas eleitorais-, que aceitaram fornecer informações, com o compromisso de terem seus nomes preservados.
Duas confirmações nessa sondagem: 1) os volumes registrados em bônus representam uma parcela muito reduzida dos valores realmente envolvidos numa eleição majoritária (em 94, a eleição de FHC consumiu R$ 33 milhões em bônus); 2) a transparência trouxe mais dissabores do que vantagens para os que optaram por abrir os cofres e o sigilo.
Quem contribuiu abertamente viu aumentada a desconfiança, de empresas concorrentes e da opinião pública, sobre o relacionamento com o governo. Quem deu recursos por baixo do pano manteve intocados os canais de influência junto aos lobbies no Congresso e aos governantes, seja nos municípios, nos Estados ou na esfera federal.
O financiamento legalizado não é, em princípio, ilegítimo ou imoral. Mas a divulgação obrigatória dos gastos alcança uma parcela ínfima do dinheiro transacionado.
O publicitário Luiz Fernando Furquim, que foi coordenador financeiro da campanha de Fernando Henrique Cardoso, em artigo na Folha, em setembro de 95, comentou as doações em material (móveis, imóveis e automóveis) na eleição de 94: "Foi por aí -apesar dos bônus- que os valores foram sub ou superfaturados, conforme a conveniência do momento ou de geração de sobras de campanha".
Os recibos eleitorais -que substituem os bônus - deverão ter grande valia. Por terem limites fixados em lei, servem de argumento para as companhias e os bancos inibirem maiores assédios; por serem públicos, permitem demonstrações de liberalidade política na superfície, enquanto volumes maiores podem ser destinados, via apoios submersos, aos candidatos que realmente interessam.
Em 94, o Itaú destinou R$ 499,9 mil, com bônus, para a campanha presidencial de Lula (PT). A Mendes Júnior foi generosa com a campanha de Leonel Brizola (PDT), que recebeu em bônus R$ 1,2 milhão da construtora.
Interesses em jogo
O levantamento da Folha também procurou identificar as questões de maior interesse para os segmentos empresariais que mais contribuíram na eleição de 94 -empreiteiras, bancos e usinas de açúcar e álcool- e as principais decisões de governo que afetaram, depois, cada setor.
Em 94, preocupava os empreiteiros a promessa do então candidato Fernando Henrique Cardoso, de que seu governo faria uma auditoria sobre a dívida federal com as empreiteiras.
Seu governo, contudo, abandonou a idéia -levantada em campanha- de manter um grupo permanente de investigação sobre as atividades dessas empresas.
Foi também desprezada a proposta feita por uma Comissão Especial de Investigação, que sugeriu o afastamento, em concorrências públicas, de dez grandes empreiteiras supostamente envolvidas em irregularidades.
Quanto aos usineiros, o governo aumentou o preço do álcool, em 95, sem repasse ao consumidor, e autorizou a Petrobrás a antecipar a compra do produto. O prejuízo foi bancado pela estatal, que recorreu a financiamentos externos obtidos pelo Banco do Brasil.
O governo também autorizou financiamentos para os usineiros pagarem dívidas de crédito rural.
Os bancos foram apontados pelos críticos do governo FHC como beneficiários do Proer, mas grandes suportes financeiros da campanha -como Bamerindus, Econômico e Nacional- não sobreviveram ao ajuste do sistema.
Controlando excessos
Os empresários trabalham com a hipótese de reeleição certa do presidente Fernando Henrique Cardoso, o que reduzirá a chamada contribuição "ideológica" -ou seja, um maior aporte de recursos para inviabilizar uma candidatura de esquerda.
Segundo os especialistas, a experiência mostra que, nos casos de favoritismo, não costumam faltar recursos. O problema seria disciplinar os excessos.
Prevê-se, por isso, uma concentração de contribuições junto a grandes grupos. Pulverizar a tomada de recursos, nesse cenário, é sempre um risco para o candidato.
Isso inibirá uma maior pressão com vistas à eleição presidencial, permitindo às empresas redirecionar os recursos para os Estados, podendo também realimentar as bancadas fiéis no Congresso.



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