São Paulo, domingo, 12 de abril de 1998

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Multis são mais discretas nas contribuições

da Reportagem Local

As companhias multinacionais são mais discretas nas doações eleitorais, por causa da legislação rigorosa nos países de origem.
A maioria das contribuições são feitas com o pedido explícito de que não haja recibo. Nesses casos, geralmente recorrem aos mecanismos usados por empresas locais para fazer sumir internamente os gastos (com a colaboração das agências de publicidade).
Reservadamente, empresários do setor confirmam que a indústria farmacêutica -com fortes interesses no projeto da Lei de Patentes- contribuiu, em 94, via associação de classe, a Abifarma (Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica), que teria centralizado as doações de grupos multinacionais.
Os laboratórios nacionais financiaram, com bônus, parlamentares que defendem suas posições. As empresas privadas interessadas em telecomunicações doaram, via bônus, R$ 1,1 milhão para a campanha de Fernando Henrique Cardoso, que acenava com a quebra do monopólio estatal no setor.
A Alcatel doou R$ 425 mil em bônus. A NEC, R$ 250 mil. O grupo considera que "o programa de governo estava de acordo com os anseios da empresa, e foi cumprido". A NEC ainda não definiu como procederá nesta eleição.
Peso da indústria
Grandes grupos industriais são listados entre os segmentos que mais contribuem, devido aos interesses específicos das áreas em que atuam.
É o caso de setores que são (ou já foram mais) suscetíveis a interferências oficiais, ou dependentes de políticas do governo, como a indústria do cimento (o grupo Votorantim doou R$ 2,6 milhões em bônus, em 94); a petroquímica (a Copene doou R$ 1,2 milhão) e a siderurgia (Gerdau, R$ 943 mil).
A indústria de papel, cujo produto final é indispensável em campanhas eleitorais, também costuma ser muito requisitada.
A Klabin, da qual é sócio o senador Pedro Piva (PSDB-SP), doou, em bônus, R$ 1,2 milhão na eleição de 94. O grupo Suzano doou R$ 854 mil.
Um maior número de indústrias -entre médias e grandes empresas- não costuma aparecer nas listagens de contribuintes porque, isoladamente, não tem suficiente, mas dispõe de força política nos Estados e de meios para contribuições não-financeiras, valiosas em campanhas eleitorais.
Por sua vez, as pequenas e médias indústrias, nas disputas eleitorais mais acirradas, costumam se aliar às grandes empresas na defesa de posições corporativas.
Fatores inibidores
Quando a contribuição é solicitada por uma liderança da comunidade onde a indústria atua, ou quando há uma razão plausível (religiosa, por exemplo), o empresário fica mais à vontade para dar transparência à colaboração.
Mas se o interesse está diretamente ligado ao seu negócio, a doação vai mesmo por baixo do pano. Há, entretanto, empresários que realmente ficam muito irritados quando são assediados por políticos antes das eleições.
Alguns segmentos -com interesses específicos- surpreendem os organizadores e tesoureiros de campanhas. Em 94, um empresário procurou o comitê de Lula, dizendo-se representante de escolas particulares. Exigiu do candidato um documento afirmando que o PT não estatizaria o setor.
Ele obteve a tal declaração, pois a questão não constava do programa. Mas não apareceu depois para dar a contribuição prometida.
Decisão fechada
As contribuições eleitorais normalmente não são submetidas aos conselhos de administração das companhias, mesmo nas empresas abertas (com ações em Bolsa). Geralmente o assunto aparece como decisão já tomada na cúpula, um gasto que o conselho autoriza, dentro dos limites previstos. Nas empresas familiares, contribuir ou não é uma decisão de família.
Apesar da distância que separa o pleito, o cerco a empresas por parte de candidatos já começou há mais de dois meses.
As dificuldades por que passam algumas empresas -diante dos juros elevados e do desaquecimento da economia- exigirão uma cuidadosa análise do custo-benefício, antes das doações.
Muitas empresas deverão optar pelas contribuições não-financeiras (ajuda material informal). Mas é certo que não faltarão dinheiro, engenho e arte para garantir que os interesses de cada setor continuem sendo defendidos. (FV)



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