São Paulo, quinta-feira, 13 de abril de 2000


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REFORMA
Cai proposta que mantinha o julgamento do presidente em foro privilegiado após o fim do mandato
FHC é derrotado em votação na Câmara

da Sucursal de Brasília


O governo foi derrotado ontem na votação da reforma do Judiciário. A Câmara dos Deputados derrubou a proposta que mantinha o julgamento do presidente da República por crime comum em foro privilegiado mesmo depois do fim do mandato.
A proposta, apoiada pelos partidos da base governista (PFL, PMDB, PSDB, PPB e PTB), também beneficiava os próprios deputados, os senadores, os ministros de Estados, o vice-presidente e outras autoridades federais.
Foram 277 votos a favor da mudança, 142 contrários e 6 abstenções. Os governistas não conseguiram os 308 votos necessários para mudar o texto da relatora, deputada federal Zulaiê Cobra (PSDB-SP).
Pelo texto da reforma do Judiciário, as autoridades têm direito a julgamento em foro privilegiado (tribunais de instância superior, como o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça) somente no exercício do cargo público e para crimes comuns (homicídio, por exemplo).
Uma mudança feita anteriormente no plenário da Câmara estendeu o foro privilegiado para os crimes de improbidade administrativa (corrupção, por exemplo).
Deputados governistas derrotados na votação de ontem prometem mudar a proposta no segundo turno e manter o texto da Constituição. O atual texto não faz restrições ao período em que ocorreu o crime, o que permite o julgamento em foro privilegiado por infrações cometidas antes do mandato.
O deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA), vice-líder do PSDB e autor da emenda, disse que ministros de Estados, por exemplo, terão de guardar dinheiro para se defender em ações que poderão ser movidas contra eles em todo o país. "Eles vão gastar uma fábula em viagens e honorários de advogados", afirmou.
Os governistas argumentaram que os julgamentos em primeira instância poderão ser motivados por divergências políticas e os juízes poderão ceder a pressões de adversários de ex-autoridades acusadas.
"Isso é uma agressão aos demais cidadãos. A Casa das leis diz que há juízes indignos para julgar seus membros, mas não para julgar o cidadão comum", rebateu o deputado Marcelo Déda (PT-SE).
Ontem a Câmara concluiu a votação da reforma do Judiciário em primeiro turno, que começou em dezembro do ano passado. A proposta agora volta à comissão especial para redação do texto final e, depois, vai a plenário para votação em segundo turno.
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Carlos Velloso, já havia criticado anteriormente a proposta de conceder foro privilegiado a ex-autoridades públicas.
Velloso e o ex-presidente do STF Celso de Mello sustentam que o Congresso deveria eliminar tal "privilégio" para todos os cargos, inclusive o de presidente da República, em vez de ampliá-lo.
Ambos argumentam que essa proteção especial contraria o princípio republicano da igualdade entre as pessoas. Os dois citaram o exemplo dos Estados Unidos, onde não há foro privilegiado.
A Constituição nunca protegeu os ex-ocupantes de cargos públicos. O STF admitiu o foro especial para ex-autoridades por 35 anos, mas a rejeitou, em 1999, por decisão unânime, por entender que a proteção é ao cargo e não à pessoa que o ocupa ou que o ocupou.
Para Velloso, "além de não prestar obséquio aos princípios republicanos, (a proposta) vai agravar a lentidão da Justiça".
Mello questionou a existência de compromisso deles com os princípios republicanos. "O Congresso, ao ampliar as hipóteses de foro privilegiado, parece ir na contramão de uma tendência que, se fosse fiel ao postulado republicano, na verdade deveria reduzir até a supressão total."


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