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INTERVENCIONISMO
Arrecadação de impostos chegou, nos últimos quatro anos, a um patamar superior a 28% do PIB
Estado cresce, apesar do "neoliberalismo"
GUSTAVO PATÚ
Sucursal de Brasília
DENISE CHRISPIM MARIN
da Sucursal de Brasília
Oito anos de abertura econômica, privatizações, discursos oficiais em favor da economia de
mercado e ataques da oposição ao
neoliberalismo não fizeram o Estado brasileiro encolher. E o que
parece mais surpreendente: o Estado está crescendo nos anos 90.
Os números mais usados nesse
tipo de medição (a proporção entre receitas, dívidas e gastos públicos e o tamanho total da economia) mostram que o Estado brasileiro nunca foi tão grande na comparação com o cômputo de bens e
serviços produzidos no país.
Uma série histórica sobre a carga
tributária produzida pelo Ipea
(Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada, ligado ao Ministério do
Planejamento) revela que a arrecadação geral de impostos chegou,
nos últimos quatro anos, a um patamar superior a 28% do PIB (Produto Interno Bruto).
Esse percentual oscila ao longo
dos anos, mas apresenta uma tendência de crescimento desde 1947
não interrompida nos anos 90,
marcados pelas reformas liberais
dos governos Fernando Collor de
Mello e Fernando Henrique Cardoso.
Apesar de não haver uma série
comparável sobre o gasto público,
o aumento do déficit da União,
dos Estados e dos municípios sob
o governo FHC autoriza a conclusão de que os gastos do Estado, na
comparação com o PIB, cresceram nos últimos anos e estão nos
níveis mais altos da história.
"Em plena época do suposto
triunfo do neoliberalismo, os Estados nacionais aumentam a participação na economia", diz o economista Paulo Nogueira Batista
Júnior, que aponta, com dados da
revista inglesa "The Economist",
fenômeno similar nos EUA e no
Reino Unido, nos quais os governos Reagan e Thatcher, respectivamente, tornaram-se referências
da doutrina neoliberal.
O ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, hoje na Consultores Associados e presidente do
Conselho de Reforma do Estado,
endossa. "É falsa a sensação de
que, desde a década de 80, o Estado estaria diminuindo."
"Discussão esotérica"
Aparentemente, há um paradoxo: se de fato vivemos a época do
neoliberalismo, que prega um Estado mínimo, parece difícil entender como os gastos públicos crescem no Brasil e em países desenvolvidos. Mas existem explicações.
"Há muita mistificação, muito
discurso ideológico, no debate entre defensores e críticos do neoliberalismo", diz Batista Júnior. Governos que fazem a apologia do
neoliberalismo não praticam o
que pregam, e a oposição ataca o
que não está acontecendo. "É uma
discussão esotérica", afirma.
Mailson tem outra tese. "Os serviços sociais do Estado beneficiam
a classe média e são difíceis de serem reduzidos devido à importância eleitoral dessa faixa da população. E, de outro lado, o Estado tem
sido cada vez mais chamado a
atender os mais pobres."
O fato é que há muita confusão
em torno do que seja o neoliberalismo e as reformas que ocorreram
no Brasil e em outros países. Genericamente, aceita-se que a doutrina neoliberal tenha surgido nos
anos 30 a partir de uma revisão do
liberalismo clássico -que defende um mercado absolutamente livre de interferências do Estado.
Economistas associados ao neoliberalismo mantêm o livre mercado como princípio, mas aceitam
o Estado em funções como o controle da inflação, a defesa da concorrência e a segurança pública.
Esses teóricos rejeitam a função
assistencial do governo. Com base
nesse pressuposto, surgiu a proposta de um programa de renda
mínima -pelo qual o Estado, em
vez de programas sociais, proporciona uma renda mínima aos cidadãos e que, ironicamente, tem no
senador Eduardo Suplicy (PT-SP)
seu mais notório defensor no país.
Má qualidade
Pode-se dizer que, embora não
tenha diminuído, o Estado brasileiro tornou-se mais liberal nos últimos anos, interferindo menos
diretamente nas relações econômicas. É criticado pela má qualidade dos serviços que oferece, mas
está longe de ser um Estado mínimo e tende a crescer ainda mais.
O economista Ricardo Varsano,
coordenador de estudos setoriais
do Ipea e responsável pela equipe
que concluiu, em setembro de 97,
o estudo sobre a carga tributária,
acha que há margem para um aumento maior da receita pública.
A carga tributária no Brasil de 97
deverá repetir a dose de 96, de
28,93%. No governo FHC se registram os percentuais mais altos da
história, variando em torno de
29% -em 94, como costuma
ocorrer em anos de planos econômicos, a carga foi mais alta.
De acordo com os cálculos de
Varsano, o máximo de tributação
tolerável nas condições atuais de
renda do país seria de 36% do PIB.
Mas ele recomenda que o esforço
fiscal não ultrapasse 34% do PIB.
Segundo Varsano, a chave para
decifrar o tamanho do Estado está
nas despesas -na qualidade e no
custo delas. Quanto mais serviços
prestados à sociedade a custos menores, menor o seu peso.
Mailson aposta que o gasto público, hoje acima dos 30% do PIB,
também tende a subir: "A reforma
do Estado não reduz o gasto público, ela melhora a qualidade e a eficiência do gasto". Na sua opinião,
"o mercado financeiro acredita
que a reforma administrativa trará
uma grande economia de gastos, o
que não é verdade".
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