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SUCESSÃO NO ESCURO
Cúpula vai discutir com economistas não filiados documento com as bases de seu programa econômico
PT abre debate de seu projeto para o país
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O PT dá início na segunda-feira,
para todos os efeitos práticos, à
campanha eleitoral para 2002, ao
mesmo tempo em que busca sair
do gueto de esquerda em que ficou confinado nas três eleições
presidenciais anteriores que disputou (e perdeu).
No dia 18, o partido apresenta a
economistas de fora do PT um
documento elaborado pelo Instituto da Cidadania, a organização
não-governamental comandada
por Luiz Inácio Lula da Silva, virtual candidato presidencial do
partido. Dele constam as bases
para um novo modelo de desenvolvimento e planos de transição
entre o atual e o futuro modelo.
Estão convidados, entre outros,
três economistas historicamente
vinculados ao PMDB, mas agora
afastados, casos de João Manuel
Cardoso de Mello, Luiz Gonzaga
Belluzzo e Luciano Coutinho (todos da Unicamp, o primeiro deles
já aposentado).
Também estará presente o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, afastado da presidência
do Instituto Brasileiro para Relações Internacionais, uma dependência do Itamaraty, pelas suas
fortes críticas à entrada do Brasil
na Alca (Área de Livre Comércio
das Américas).
Mas também foi convidado um
economista que não tem tradição
nem de esquerda nem de centro-esquerda, caso de Antoninho
Marmo Trevisan, da consultoria
Trevisan e Associados.
O fato de o documento, depois
de ter sido discutido internamente, passar pelo crivo externo coincide com uma difusa mas generalizada sensação de que o governo
Fernando Henrique Cardoso está
esgotado ou se esgotando.
Se essa sensação corresponde
aos fatos, natural que se passe
também à discussão sobre um novo modelo, até porque o PT acredita que "o modelo neoliberal está
se esgotando na América Latina",
como diz o deputado federal Aloizio Mercadante (SP), uma espécie
de economista-chefe do partido.
O PT quer, por isso, apresentar
o seu próprio modelo, ao mesmo
tempo em que responde aos ataques de personalidades do governo federal, em especial o ministro
Pedro Malan (Fazenda), que tem
defendido a tese de que o PT deveria assumir bandeiras como a
da estabilidade da moeda e a da
responsabilidade fiscal.
"Não somos contra a estabilidade, mas queremos outras bases
para ela", devolve Mercadante.
O deputado petista diz que uma
visão "estritamente monetarista"
do ajuste fiscal levou a aceitar a
imposição do FMI (Fundo Monetário Internacional) segundo a
qual investimentos de estatais são
gastos, em vez de investimentos.
"Por isso não se investiu em
energia, o que, com o racionamento, vai levar a uma queda de
pelo menos 1,5 ponto percentual
no crescimento e a uma perda de
receita fiscal de cerca de R$ 6 bilhões", ataca Mercadante.
O deputado critica também o
fato de o ministro ter cobrado do
PT apoio à LDO (Lei de Diretrizes
Orçamentárias). Segundo Mercadante, a LDO foi elaborada levando em conta um crescimento de
4,5% da economia, uma inflação
de 4% neste ano, um dólar a R$
2,15 e juros básicos de 13,2%. "Esses números são realistas?", pergunta o deputado, sabendo que o
próprio governo e a realidade, no
caso do câmbio, já trabalham com
outras medidas para todos os
quatro quesitos.
Mercadante diz também que o
PT não é contra a meta de inflação, mas acha que ela não pode
ser excludente. "Evidente que é
uma meta importante, mas meta
de crescimento também é", diz.
O PT vai insistir na sua proposta
de uma Carta de Responsabilidade Econômica e Social, que contenha metas prioritárias (inflação,
crescimento, emprego, exemplifica Mercadante) e metas complementares.
O acompanhamento de tais metas seria feito pelo Parlamento e
também por meio de audiências
públicas. Seria uma das maneiras
de fugir do que o deputado define
como "privatização da agenda
nacional", ou seja, a sua apropriação pelos agentes de mercado,
que determinam o que os partidos e, por extensão, os governos
podem e não podem propor.
A Folha apurou que o mercado
continua, em relação ao PT, com
as mesmas reservas e prevenções
de sempre.
O PT, por sua vez, assume, pela
voz de Mercadante, que haverá
restrições a seus planos de governo tanto pelo lado da debilidade
externa da economia brasileira,
que necessita de capitais por natureza assustadiços, como pelo lado das finanças públicas.
"São restrições que terão que ser
enfrentadas", diz Mercadante.
O que o partido não aceita é a tese de independência do Banco
Central, que vem sendo esgrimida
por setores do governo.
O argumento de Mercadante é
poderoso: "Imagine um Banco
Central independente e presidido
por Gustavo Franco, com sua defesa intransigente do câmbio fixo.
Seria o fim de qualquer política
econômica", diz o petista.
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