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São Paulo, domingo, 13 de julho de 2003

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POLÍTICA CIENTÍFICA

Temas escolhidos para a reunião deste ano, em Recife, são inclusão social, soberania e política externa

Governo Lula "pauta" encontro da SBPC

DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DO RIO

A 55ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) começa hoje à noite em Recife, Pernambuco, "afinada" com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ao menos em sua pauta de debates, orientada para a discussão de temas caros ao governo e até ao ministro Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia), que encontra resistências na comunidade científica.
Entre os grupos temáticos propostos aos participantes estão a política externa do governo Lula e a relação entre o conhecimento científico, a defesa e a soberania nacional. Amaral causou celeuma no governo (e no mundo) ao relacionar justamente esses temas, declarando em janeiro, à rede britânica BBC, que o Brasil não poderia renunciar ao domínio da tecnologia necessária para a fabricação da bomba atômica, ressalvando depois que isso não significava que o país fosse fabricá-la.
O subtítulo do encontro -Educação, Ciência e Tecnologia para a Inclusão Social- também sinaliza a influência do novo governo.
O sociólogo Flávio Pierucci, coordenador da organização do encontro, afirma que o governo Lula influenciou na escolha dos temas. "No momento em que a gente começou as reuniões da comissão de programação, o novo presidente estava começando suas viagens, dando importância à América Latina, uma afirmação mais pró-ativa do Brasil no cenário internacional. E a gente está enfrentando problemas de todo tipo. A biodiversidade, por exemplo. São questões que, de uma forma ou de outra, acabam tangenciando a questão da soberania."
Pierucci, no entanto, faz uma ressalva quanto a Amaral. "O episódio do ministro serviu como uma inspiração para nós, mas para discutirmos a questão da soberania de outra forma. Acho que a contribuição do ministro não foi a mais feliz. Ele vinha naquele momento com um discurso que nos pareceu ultrapassado."
O próprio Amaral fará uma conferência no encontro, dentro do ciclo "Integração e Soberania". Ele disse à Folha que reconhece afinidades entre a pauta de debates da SBPC e interesses do governo. "Acho excelente [que esses assuntos sejam discutidos]. Vejo que a pauta do governo federal está se transformando numa pauta da sociedade", afirmou.
Para o professor de ética e filosofia política da Unicamp Roberto Romano, "há uma ansiedade de toda a comunidade científica [em discutir esses assuntos]". Também ele fará uma conferência sobre o tema, amanhã, sob o título "Ciência e tecnologia para a defesa nacional".
"Como a política do ministro vai também nessa linha, houve uma união de preocupações. Mas é bom deixar ressaltado que a atitude da comunidade científica não é a favor ou contra a política do ministro. Ela quer é pensar", afirma Romano.
A política externa brasileira merecerá duas conferências no encontro, uma delas a ser apresentada pelo secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, que tem conhecidas posições contrárias à Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Apesar da "inspiração" da política externa de Lula para a discussão do tema, segundo Pierucci, por suas atitudes inovadoras no início do governo, Roberto Romano lembra que o governo vive um momento de aparente indefinição na área -e justamente por conta da negociação da Alca.
Outros grandes temas tratados, além de soberania e biodiversidade, serão "educação e inclusão social", "qualidade de vida" e "desigualdades no Brasil". Para Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE e diretor de informações gerenciais do Instituto Pereira Passos, entretanto, a agenda da SBPC está sintonizada com o momento brasileiro, mas não necessariamente com a agenda de governo.

Dissenso
Apesar de afinada com a agenda do governo, a reunião deve também ter dissensões. Pela primeira vez, a SBPC, tradicionalmente alinhada com o PT, se reúne quando o partido é governo. Simpatizantes petistas críticos em relação ao governo federal, como o sociólogo Francisco de Oliveira e o próprio Romano, têm falas agendadas na 55ª reunião.
O momento é de transição também na própria entidade. Após uma eleição disputada, em junho, a SBPC elegeu Ennio Candotti, da Universidade Federal do Espírito Santo, para substituir Glaci Zancan, da Universidade Federal do Paraná, que ficou quatro anos à frente da SBPC. Candotti toma posse na quarta-feira.
(RAFAEL CARIELLO E ANTÔNIO GOIS)


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