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São Paulo, domingo, 13 de julho de 2003

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NO PLANALTO

Berzoini e Benedita trocam "fogo amigo"

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo Lula começa a atingir um grau de harmonia jamais visto. Há ministros que nunca discutem. Na verdade, nem se falam. Respiram uma atmosfera de civilizado desacordo. É o caso de Ricardo Berzoini (Previdência) e Benedita da Silva (Assistência Social).
A geografia do poder impôs a Berzoini e Benedita uma proximidade administrativa que os condenou a um distanciamento tragicômico. Compartilham, em silenciosa algazarra, a gestão da filantropia governamental. Vivem trocando tiros. Usam armas com silenciador.
Chefe da grande família petista, Lula viu-se na contingência de ampliar o primeiro escalão. Construiu na Esplanada, a toque de caixa, pequenos puxadinhos. Só para abrigar velhos amigos.
Acomodou Benedita numa pastinha chocha. Para atenuar a insignificância do ministeriozinho, enxertou-lhe no organograma o CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social). Lida com as instituições ditas filantrópicas.
São entidades privadas que, em troca de isenção de tributos, deveriam socorrer a plebe. Embora nem sempre resulte em filantropia genuína, a generosidade do CNAS drena bilhões dos cofres de Brasília.
Só da Previdência, de cuja estrutura o conselho filantrópico foi arrancado, são sorvidos anualmente R$ 2,1 bilhões. Daí que, por precaução, Lula manteve nas mãos de Berzoini, dono da máquina arrecadatória do INSS, a incumbência de fiscalizar o sistema.
Logo que assumiu, Berzoini promoveu no setor filantrópico o que seus auxiliares chamam de "faxina". Uma das áreas "vassouradas" foi a Consultoria Jurídica da Previdência. A repartição funciona como filtro de decisões do CNAS.
Impressionado com a presença de escândalos filantrópicos nas paginas de jornal, Berzoini avaliou que, sob FHC, o filtro era demasiadamente poroso. Substituiu o consultor jurídico Antônio Glaucius de Morais. No rastro dele, saiu Indira Ernesto Silva Quaresma, segunda na hierarquia da Consultoria.
Berzoini confiou o setor jurídico de sua pasta a Jefferson Carús Guedes. Dono de um rigor técnico que se materializa na cassação de benefícios tributários de gigantes do ramo filantrópico, Carús Guedes abespinhou-se com alguns pareceres que encontrou nos arquivos da consultoria. Encaminhou-os ao Ministério Público.
Entre os documentos colecionados por Carús Guedes há pareceres que trazem as assinaturas de Glaucius e Indira. Encontram-se sob análise de procuradores que compõem uma força-tarefa dedicada a investigações filantrópicas.
Nos últimos 15 dias, os consultores que Berzoini considerou "inconfiáveis" foram aquinhoados no "Diário Oficial" com novos cargos de confiança. Benedita recontratou-os.
Glaucius chefia agora a Consultoria Jurídica da pasta da Assistência Social. Indira é a sua segunda. As nomeações passaram pelo crivo do ministro José "todo-poderoso" Dirceu (Casa Civil).
Indira considera "injusto" o juízo que se faz do trabalho dela. Diz ter assinado mais pareceres favoráveis à Previdência do que às entidades filantrópicas. Acrescenta: "Não fui exonerada da Previdência, pedi para sair".
Glaucius diz ter assinado, entre 2000 e 2002, 55 pareceres sobre filantropia. Desses, 42 resultaram em cassações. "O Jefferson [Carús Guedes] trabalha com a minha equipe. E utiliza pareceres do meu tempo para cassar certificados de filantropia."
Os ministros seguem atirando um no outro. Berzoini tenta convencer o Planalto da conveniência de forçar Benedita a rever as nomeações. Benedita luta para subtrair de Berzoini o poder fiscalizatório sobre a filantropia. A despeito dos silenciadores, o "fogo amigo" petista tornou-se ensurdecedor.
PS.: Antes que as reformas de Lula alcancem o legado do companheiro Vargas, saio em férias por 30 dias.


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