São Paulo, Segunda-feira, 13 de Setembro de 1999
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GOVERNO
Dinheiro virá do total do superávit que ultrapassar a meta com o FMI
FHC usa verba e juros para aumentar popularidade

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília

VALDO CRUZ
Diretor-executivo da
Sucursal de Brasília


Depois de contornar a crise que culminou na demissão do ministro Clóvis Carvalho (Desenvolvimento), o presidente Fernando Henrique Cardoso saiu da defensiva e tenta recuperar sua popularidade na opinião pública e no Congresso.
A estratégia de FHC começou com duas providências: a liberação de verbas para os partidos aliados, por meio de seus ministérios, e a adoção de medidas para reduzir as taxas de juros para empresas e consumidores.
O ministro do Planejamento, Martus Tavares, confirmou para a Folha a liberação de verbas, mas nega que isso signifique que o governo esteja abrindo as torneiras de seu cofre. Segundo ele, a meta de um superávit primário de 2,5% do PIB neste ano não será, em nenhuma hipótese, desrespeitada.
"Não se trata de abrir as torneiras, mas de fazer o que todos vivem cobrando que o governo faça, que é investir no social com os recursos que pode usar", disse.
Segundo ele, o governo pretende liberar apenas a parcela de recursos que superar a meta de superávit primário (descontados os juros) acertada com o FMI (Fundo Monetário Internacional) para o governo central. Os ministérios do Planejamento e da Fazenda estão fazendo os cálculos para estimar de quanto será essa "sobra" de recursos.
Conforme a Folha apurou, o superávit primário deve passar em R$ 1,8 bilhão a meta acertada com o FMI. É esse total que começou a partir deste mês a ser repartido entre os ministérios de PMDB, PFL, PSDB e PPB.
O problema, como admite Martus Tavares, é que os pleitos dos ministros são pelo menos cinco vezes maiores do que a expectativa de excesso de superávit em relação à meta acertada com o FMI. Um problema de difícil solução, reconhece.
No caso dos juros, além das medidas já tomadas, como a redução do compulsório sobre os depósitos à vista, o Banco Central deve concluir até a próxima semana um estudo sobre como reduzir as taxas de juros para empresas e consumidor. A medida é considerada fundamental para garantir a retomada do crescimento econômico.
FHC espera ainda que a chegada de Alcides Tápias, que toma posse amanhã no lugar de Clóvis Carvalho, faça o Ministério do Desenvolvimento começar a atuar como planejado inicialmente, ajudando a reduzir as críticas do empresariado.
O presidente tem reclamado com seus auxiliares que o governo, até agora, tem estado apenas na defensiva neste segundo mandato. FHC, em suas reuniões, tem exigido dos ministros o que seus assessores classificam de "virada de jogo" a partir da segunda quinzena de setembro.

Verbas liberadas
Um detalhe curioso é que a negociação para liberação de verbas, em alguns casos, não ocorre na Fazenda, no Planejamento ou na Casa Civil, mas no gabinete do secretário-geral da Presidência, Aloysio Nunes Ferreira, que ocupa função política.
Os dois primeiros ministérios atendidos foram Transportes, do PMDB, e Saúde, do PSDB. Na fila, já estão Meio Ambiente, do PFL, Educação, do PSDB, e Integração Nacional, do PMDB.
Na semana passada, Martus também conversou com vários ministros e recebeu apelos quase dramáticos
"Pelo amor de Deus, libere qualquer coisa", pediu-lhe na sexta-feira o ministro Fernando Bezerra (Integração), que já chegou a comprar uma dúzia de copos com seu próprio dinheiro para oferecer água a uma delegação da Espanha. O ministério não tinha verbas nem para isso.
O Orçamento da União para 1999 está engessado desde o dia 21 de abril, quando o governo foi forçado a fazer um corte drástico para enfrentar os efeitos da crise na economia.
José Serra (Saúde) alega sempre que os problemas financeiros de sua pasta foram bastante agravados pela mudança de política cambial, pois o ministério trabalha com vacinas e equipamentos importados, por exemplo.
Ele obteve na quinta-feira passada uma vitória no Planalto e no Planejamento: um projeto de lei enviado ao Congresso para a liberação de R$ 270 milhões para o pagamento de medicamentos.
Agora, insiste para a liberação, até novembro, no máximo, de uma parcela de R$ 700 milhões para o pagamento em dezembro dos hospitais vinculados ao SUS (Sistema Único de Saúde).
Outro ministro do PSDB que está com pedidos de verbas engatilhados no Planejamento é Paulo Renato Souza (Educação). Ele reivindica pelo menos R$ 200 milhões para o Fundef (fundo de valorização do magistério).
Os ministérios do PMDB estão sendo tratados em bloco, enquanto o seu presidente, senador Jader Barbalho (PA), recua nas críticas ao governo e ao presidente FHC.
As verbas para o Ministério dos Transportes são, principalmente, para as duas estradas consideradas estratégicas e prioritárias no governo: a "rodovia do Mercosul", no trecho entre Florianópolis e Curitiba; e a Fernão Dias, que liga São Paulo a Minas Gerais.
O caso do Ministério da Integração é mais genérico, porque além da verba de investimentos, falta dinheiro também para o seu próprio funcionamento.
No PFL, o primeiro ministro na fila é Zequinha Sarney (Meio Ambiente), filho do senador peemedebista José Sarney (AP). O seu pedido, porém, parece bem modesto: R$ 13 milhões para combate às queimadas. Deve sair já no início desta semana.
Na avaliação política do Palácio do Planalto -já manifestada à Folha por Aloysio Nunes Ferreira-, a compressão excessiva das verbas federais estava dificultando ainda mais as relações do governo com o Congresso.
A liberação, contudo, deverá ter uma contrapartida. Num jantar entre FHC e seu comando político, no Alvorada, quarta-feira, ficou acertado que os ministros serão "convidados" a participar dos programas dos seus partidos no rádio e na televisão, para defender suas pastas e o governo ao qual servem.
Além de liberar as verbas, o governo quer que os políticos reconheçam e a opinião pública fique sabendo. As pesquisas que começam a chegar no Planalto acusam uma recuperação ainda pálida da popularidade de FHC. O governo não vai poupar esforços para uma recuperação mais rápida e sensível.


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