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São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 2003

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Diretor da corporação espera ajuda de policiais que estão presos por participarem de suposto esquema criminoso

PF oferecerá benefício a colaboradores

ANDRÉA MICHAEL
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Polícia Federal oferecerá aos policiais envolvidos no suposto esquema de venda de decisões judiciais relacionadas à Operação Anaconda benefícios jurídicos em troca de informações sobre a atuação do grupo.
"Todos os policiais federais envolvidos são potenciais colaboradores. Se eles quiserem minorar as consequências de seus atos, receberemos de muito bom grado a colaboração", disse ontem Paulo Lacerda, diretor-geral da PF.
De acordo com a lei 9.807, de 1999, conhecida como "Lei de Proteção à Testemunha", o juiz poderá oferecer aos colaboradores redução de pena e até mesmo perdão judicial. Também está prevista a aplicação de "medidas especiais de segurança e proteção à sua integridade física".
A expectativa da PF é também contar com a colaboração de Norma Regina Emílio da Cunha, ex-mulher do juiz João Carlos da Rocha Mattos. Denunciados por "ocultação do produto do crime" e por "dirigir as investigações" de caso relacionado a um fundo de pensão, respectivamente, ambos estão presos na carceragem da Polícia Federal em São Paulo.
No pacote negociado, que dependerá de acertos também com o advogado de Cunha, Paulo Esteves, está sua transferência para a PF em Brasília e possivelmente a inclusão de seu filho de 12 anos em um programa especial de proteção à testemunha.
Segundo a Folha apurou, a PF acredita que Cunha esteja disposta a denunciar a quadrilha, principalmente porque um dos policiais denunciados pelo Ministério Público, José Augusto Bellini, teria ameaçado matar seu filho.
No material apreendido em 15 operações deflagradas no dia 30 de outubro, estão fitas cassete, encontradas na casa da ex-mulher de Rocha Mattos, nas quais Bellini foi flagrado afirmando que o filho do casal é muito esperto e que sabe demais sobre o esquema.
Bellini e o agente da PF César Herman Rodriguez foram denunciados pelo Ministério Público por planejar e executar ações criminosas que redundaram em arquivamento de inquérito policial. Ambos estão presos.
A Operação Anaconda começou em abril de 2002. O foco era o delegado da PF aposentado Jorge Luiz Bezerra da Silva, que tentou aliciar dois agentes da PF em Maceió para integrar um esquema de espionagem. Feita as primeiras escutas, autorizadas pela Justiça Federal em Alagoas, o trabalho se ramificou por outros Estados, tendo São Paulo como centro.
O conteúdo das gravações levou o Ministério Público a denunciar os juízes Rocha Mattos e os irmãos Casem e Ali Mazloum por formação de quadrilha.
Gravações feitas pela PF entre maio de 2002 e maio último indicam que Rodriguez intermediava interesses de grupos privados em face da administração pública e também comandava um caixa conjunto dos negócios intermediados pelo suposto esquema.
Na próxima sexta-feira, depois de um reforço na equipe de peritos que trabalha em Brasília, a PF deve apresentar um laudo parcial sobre os documentos e equipamentos apreendidos.
As análises da perícia revelam novos indícios de remessas de recursos dos integrantes da suposta quadrilha para o exterior. Para fazer o rastreamento do dinheiro, serão necessárias quebras de sigilo bancário no sistema financeiro internacional.
Triagem inicial, feita nos primeiros dias depois da apreensão, identificou depósitos que somariam até US$ 6,2 milhões em bancos na Suíça e nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal no Caribe.

Advogado de Norma
O defensor de Norma Cunha, Paulo Esteves, é contra a inclusão de sua cliente em negociações pelas quais ela passe a colaborar com a Justiça em troca de redução de eventual pena.
"Na situação em que minha cliente se encontra, se ela fosse condenada agora, amanhã estaria livre. Que vantagem ela teria?", questiona o advogado. E completa: "Além disso, tudo que ela teria a dizer, já disse nas fitas [das escutas telefônicas feitas pela PF]".
O Ministério Público denunciou Cunha por formação de quadrilha, cuja pena prevista é de até três anos de prisão. A lei, no entanto, prevê uma conjugação de fatores que, levando em conta os antecedentes da ex-mulher de Rocha Mattos e sua vida social, podem deixá-la em liberdade, depois de uma eventual sentença condenatória transitada em julgado e não mais passível de recurso.
Esteves também é contrário à inclusão do filho de Cunha e Rocha Mattos, de 12 anos, em um programa de proteção à testemunha. O menino seria alvo de ameaças do delegado Bellini, um dos um dos integrantes da suposta quadrilha investigada.
"Esses programas de proteção destroem a vida das pessoas. Ele [o menino] leva uma vida normal, na casa de parentes escolhidos pelos pais. E não poderia ser diferente disso", declarou o advogado.


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