São Paulo, quarta-feira, 14 de janeiro de 2004

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OPERAÇÃO ANACONDA

Polícia Federal sempre negou apreensão de material

Norma diz que tinha fitas sobre o caso Santo André

MARIO CESAR CARVALHO
ROBERTO COSSO
DA REPORTAGEM LOCAL

A ex-auditora da Receita Federal Norma Regina Emílio Cunha disse ontem, em depoimento ao TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região (em São Paulo), que a Polícia Federal apreendeu em sua casas as fitas cassetes com gravações sobre a investigação do assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), ocorrido em janeiro de 2002.
A PF sempre negou que houvesse encontrado esse material no apartamento de Norma, na praça da República (região central de São Paulo). O ex-marido de Norma, o juiz federal João Carlos da Rocha Mattos, sustenta desde o início das apreensões da Operação Anaconda, em 30 de outubro do ano passado, que a PF desaparecera com as 42 fitas que continham, segundo ele, conversas telefônicas que comprometeriam integrantes da cúpula do PT. A versão do juiz tenta dar à operação uma motivação política que a Polícia Federal nega.
Rocha Mattos havia determinado a destruição das fitas sob o argumento de que a Polícia Federal fizera os grampos ilegalmente, mas preferiu guardá-las no apartamento da ex-mulher por razões que nunca explicou direito.

Sonegação fiscal
Norma reconheceu no depoimento à desembargadora Therezinha Cazerta, do TRF, que sonegou Imposto de Renda. A PF apreendeu em seu apartamento US$ 550.549, divididos em 19 pacotes. O volume de dinheiro apreendido é uma das provas citadas pelo Ministério Público Federal para sustentar a acusação de que ela cuidava do caixa da suposta quadrilha que negociava a venda de sentenças judiciais.
Segundo o advogado Paulo Esteves, que a representa, Norma afirmou que os US$ 550 mil em dinheiro encontrados em sua casa pela PF foram obtidos com a venda de quatro casas na Flórida (EUA), ocorrida em 1990, e com os ganhos de trabalhos de garimpo. Ela é registrada como garimpeira, conforme documentos apreendidos pela própria PF. Segundo Esteves, Norma disse que o dinheiro estava em sua casa -e não em um banco- por ser dinheiro sonegado.
Em entrevista à Folha em dezembro, o proprietário do condomínio em que Norma e Rocha Mattos tinham quatro casas, norte-americano Lincoln Motta, disse que o juiz investira US$ 200 mil nos imóveis, e não US$ 500 mil.
Documentos apreendidos no apartamento de Norma mostram que ela continuava a pagar taxas das casas em 2002.
A procuradora da República Janice Ascari, que acompanhou o depoimento, disse que Norma não pode ser acusada de sonegação fiscal porque o crime prescreve em cinco anos -que já passaram. Esteves disse que o crime ainda não prescreveu porque a prática de sonegação ocorreu até a apreensão do dinheiro.
A lei brasileira prevê que qualquer pessoa pode se livrar de um processo penal por sonegação fiscal se fizer o pagamento dos impostos antes do recebimento pela Justiça da ação penal.
A respeito do fato de ser proprietária de uma "offshore" (empresa com ações ao portador e sem identificação pública de seus donos) constituída no Uruguai, Norma disse que comprou a empresa para fazer uma transação financeira que acabou não acontecendo. "Essa empresa nunca teve um cruzeiro, nem um dólar", afirmou o advogado Esteves.
Norma afirmou ao TRF que mentiu em conversas telefônicas interceptadas pela PF nas quais fez acusações contra Rocha Mattos. Ela afirmou que tentava prejudicar o juiz que a havia desprezado. Foram "maledicências", segundo sua definição.
Ela contou à desembargadora que agiu para se vingar das traições conjugais de Rocha Mattos. Norma desceu a detalhes do comportamento do ex-marido: afirmou que não perdoava o fato de Rocha Mattos ter levado uma outra mulher para a mesma cama que ela dividia com o juiz.
A ex-auditora negou participar da suposta quadrilha. "Vamos condená-la pelo que ela faz, não pelo que ela não fez", disse o defensor de Norma.
Após o depoimento, ela retornou para Brasília, onde se encontra detida na carceragem da PF.


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