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Sobrevivente, 109, não gosta do beato
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CANUDOS
A carteira de identidade em cima da mesa comprova. Aos 109
anos -110 em 18 de julho-, o
vaqueiro aposentado Antonio
Dantas de Oliveira diz ser a única
pessoa viva que conheceu Antonio Conselheiro. Se vangloria de
ter tido inúmeras histórias para
contar aos seus 8 filhos, 27 netos e
mais de 50 bisnetos.
Magro, sempre deitado em uma
rede, Oliveira tinha cinco anos
quando os seus pais o levaram para conhecer Conselheiro. "Era um
homem velho, magro, usava roupa azul e tinha uma barba muito
grande. Falava manso, sempre
olhando para os olhos das pessoas
que o cercavam", lembra, referindo-se ao beato cearense que liderou o levante popular com contornos religiosos e políticos em
Canudos (BA), entre 1893 e 1897.
O aposentado lembra que Antonio Conselheiro era muito admirado pelos moradores do sertão
baiano. "O Conselheiro não gostava de andar sozinho, sempre era
seguido por muita gente. Os meus
pais gostavam muito dele."
Três vezes viúvo, Oliveira diz
que não gosta do beato. "Antonio
Conselheiro era um louco, vivia
falando que era o Bom Jesus. Apesar de ter tomado a sua bênção,
nunca gostei da sua figura esquisita. Ele era malvado, matou muitas
pessoas e merece o inferno."
Sempre sorridente e lúcido, o
aposentado conta que, depois do
final da guerra, somente voltou
duas vezes à cidade em que nasceu. "Não tenho vontade de voltar
a uma terra amaldiçoada pelo
próprio homem", disse Oliveira,
que mora em Euclides da Cunha,
a 62 quilômetros de Canudos.
Outro personagem polêmico
que o aposentado diz ter conhecido foi Virgulino Ferreira da Silva,
o Lampião. "Lampião foi em minha casa três vezes. Ele ficava o dia
todo dentro de casa, mas fazia
questão de dormir no mato."
Ao contrário de Conselheiro, o
aposentado baiano, que conheceu
o mar aos 107 anos, quando foi
submetido a uma cirurgia no olho
direito em Salvador, tem boas
lembranças de Lampião. "Ele era
um homem honesto, não fazia
mal a ninguém. Ele só matava
quem o desafiava."
Apesar de não ter conhecido
Antonio Conselheiro, o aposentado João Reginaldo de Matos, 94,
tem muitas lembranças da guerra
que deixou mais de 20 mil mortos, segundo historiadores.
"Meus avós e cinco tios foram
assassinados pelo Exército", diz
Matos, que mora a menos de 500
metros do local onde foi abandonado o corpo do coronel Antonio
Moreira César, comandante de
uma das expedições do Exército
derrotada pelos seguidores de
Antonio Conselheiro.
Mais de cem anos depois da
guerra, as condições de vida do
aposentado não diferem muito
daquelas de seus antepassados.
Ele mora em uma pequena casa
sem energia e água, a menos de
três quilômetros de Canudos.
Ele garante que já encaminhou
três cartas ao presidente Fernando Henrique Cardoso solicitando
energia para sua casa. "Até hoje
nada foi feito", disse.
Para assistir à televisão, o seu
passatempo preferido, Matos recorre à tecnologia -instalou uma
parabólica no quintal de sua casa
e comprou uma televisão que funciona só quando ligada a bateria
que ele instalou em sua casa.
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