São Paulo, segunda-feira, 14 de maio de 2001

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ENTREVISTAS DA 2ª

Convocado por Parente, professor Vicente Falconi tem receita para definir metas de corte

Governo vai testar método japonês no plano do apagão

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

O método japonês de planejamento Hoshin Kanri, aplicado pela Fundação de Desenvolvimento Gerencial em mais de 800 empresas brasileiras, vai orientar o governo no racionamento de energia previsto para junho.
O maior especialista do método no Brasil, o mineiro Vicente Falconi Campos, 60, foi convocado sexta-feira pelo ministro Pedro Parente para integrar o "ministério do apagão" -oficialmente, a Câmara de Gestão da Crise de Energia.
O método, também chamado de "gerenciamento por diretrizes", vai definir metas de cortes por regiões, por distribuidoras de energia e por usuários. Segundo Falconi, várias empresas que adotam o modelo no Brasil, como a Belgo-Mineira, Sadia, Acesita, já se ofereceram para ceder pessoal técnico para ajudar no trabalho.
Autor de seis livros sobre gerenciamento e programas de qualidade, professor aposentado da Universidade Federal de Minas Gerais, Falconi encarou o convite como uma missão e deve embarcar hoje para Brasília levando roupas para uma semana. Mas já avisou à mulher e às duas filhas que não tem data para voltar. É o único integrante da força-tarefa que não pertence ao governo.
Leia os principais trechos da entrevista concedida sexta-feira à noite, pouco depois de ele ter sido convocado por Parente.

Folha - Quais serão as suas funções na força-tarefa?
Vicente Falconi -
Estão contando comigo para ajudar no planejamento. Eles querem montar um gerenciamento de todo o programa, desde a meta maior, de redução do consumo de energia, até as metas estaduais, as metas por operadora, por setor de economia e os planos de ação.

Folha - Por que o sr. foi escolhido para isso? Tem experiência de planejamento de racionamento?
Falconi -
É isso exatamente o que nós fazemos na fundação: planejamento das empresas, estabelecimento de metas e controle.

Folha - Mas, desta vez, parece bem mais difícil. Uma fórmula aplicada às empresas pode ser usada para um país?
Falconi -
Pode, a fórmula é a mesma. Tem-se que estabelecer metas relacionadas umas com as outras. Meta principal, metas secundárias e metas terciárias. Cada uma delas com um plano de ação, com responsáveis e reuniões de acompanhamento. Não é colocar a meta e esperar que ela aconteça.
Ainda não sabemos como será feito o racionamento. O planejamento geral é que vai determinar isso. As pessoas é que imaginam que será por apagões, mas pode ser que surjam outras idéias.

Folha - Como funciona esse esquema de metas? Na sua concepção, como será o trabalho?
Falconi -
A meta principal será o total de consumo a ser cortado. Três regiões terão de sofrer cortes de energia. Dividimos a meta principal em três contribuições e definimos com quanto cada região vai contribuir e cada uma delas passa a ter uma meta a cumprir. Depois, analisamos a situação das operadoras e estabelecemos a meta de corte para cada uma. Em seguida, vemos, dentro de cada operadora, qual é o consumo dos setores industrial, comercial, residencial e do setor público e estabelecemos uma meta para cada setor. Feito isso, definimos os responsáveis pelo cumprimento de cada meta.
Ouviremos cada operadora para conhecer suas sugestões para reduzir o consumo e iremos compondo o plano de ação. Os técnicos é que nos indicarão as ações para cada setor.

Folha - Essa fórmula se aplica a qualquer setor?
Falconi -
Essa fórmula se aplica a qualquer coisa: empresas privadas, governos estaduais, prefeituras, governo federal. A AmBev e o grupo Gerdau, por exemplo, adotam essa metodologia.

Folha - Esse tipo de planejamento tem nome específico?
Falconi -
Gerenciamento por diretrizes. É derivado do japonês: Hoshin Kanri. É um método no qual se congrega uma quantidade muito grande de pessoas em torno de uma meta. Por meio desse método, consegue-se atribuir responsabilidades específicas, planos específicos e cobranças específicas. Tem-se uma responsabilidade distribuída entre um número muito grande de pessoas.

Folha - Isso já foi usado alguma vez para racionamento de energia?
Falconi -
Não que eu saiba. Mas é um método usado no mundo inteiro por grandes empresas.

Folha - Quem desenvolveu esse método?
Falconi -
Foi desenvolvido nos EUA, na década de 70, pelo professor Peter Drucker. Os japoneses o aperfeiçoaram para ser aplicado a um grande número de pessoas. Estamos muito avançados em sua aplicação no Brasil.

Folha - Ministérios e operadoras de energia conhecem o método ou a fundação terá que ensiná-los?
Falconi -
Não é preciso ensinar nem orientar. Vamos distribuir as metas e colocar gente nossa em cada frente de trabalho para ajudar a montar os planos de ação. As cobranças serão feitas por meio dos gráficos de controle.

Folha - Quantas pessoas da fundação estarão envolvidas?
Falconi -
Ainda não sei. Serão envolvidas quantas forem necessárias. Se tivermos de parar todas as outras atividades, nós vamos parar. Além disso, várias empresas clientes nossas me telefonaram dizendo que não apenas podemos suspender os serviços que prestamos a elas, como se ofereceram para emprestar pessoal. Belgo-Mineira, Sadia, Acesita, são algumas das que ofereceram pessoal que conhece o programa.

Folha - O sr. não acha que o tempo está muito exíguo, uma vez que o racionamento começa no dia 1º de junho?
Falconi -
Uai, estamos diante de um problema e temos de resolvê-lo da melhor maneira que pudermos.

Folha - Quais são as dificuldades que o sr. vê pela frente?
Falconi -
Na segunda-feira [hoje" é que vou ficar sabendo. Fui pego de surpresa. Vou fazer tudo para afetar o menos possível as empresas de mão-de-obra intensiva e a economia.


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