São Paulo, domingo, 14 de maio de 2006

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JANIO DE FREITAS

Os benfeitores

Eram chamados de malfeitores. Sem maiores distinções. Hoje são chamados de bandidos. Sem maiores nem menores distinções. Assaltantes pequenos ou graúdos, traficantes, contrabandistas de quinquilharias, homicidas ferozes, parlamentares e outros políticos da variada corrupção respondiam, todos, pela condição brandamente generalizada de malfeitores. Viraram todos bandidos sem diferenciações, diria uma explicação cordial, porque malfeitor ressoava jornalismo antiquado. Explicação mais objetiva está no engrossamento geral do jornalismo, pelo menos do nosso, e não só vocabular. Mas, já que se fala deste, dirá tudo a "liberdade" de publicar palavrões insultuosos que você não diz à sua filha ou ao filho, à sua mãe ou ao pai. À margem disso prevalece ainda, no entanto, a diferença entre liberdade e cafajestice.
Pois bem, nesta manhã de sábado leio em um grande jornal que delegacias e postos da PM de São Paulo "foram metralhados ontem à noite, supostamente por bandidos ligados a uma facção criminosa". Se é apenas suposição que sejam "bandidos de uma facção criminosa", talvez fossem, então, frades e freiras, cirurgiões e redatores, que se organizaram para atacar delegacias e PMs por diletantismo? Abandonados na suposição, não sabemos. Há 50 ou mais anos os leitores saberiam, pelo menos, que foram malfeitores.
Em louvor aos tempos atuais, porém, é justo fazer uma ressalva. Por serem malfeitores, os "supostamente bandidos de uma facção criminosa" não ficam impedidos de ser benfeitores. O ataque a instalações e integrantes das polícias, com as conseqüências brutais que buscou e alcançou, está mostrando a São Paulo que a chamada criminalidade urbana subiu muitos níveis. No Brasil todo, sim, e sem a exceção que São Paulo, por seus ilusionismos jornalísticos, parece ser.
O ataque em São Paulo não foi um erro geográfico, de um ataque que devesse ocorrer no Rio. É obra do nível que a ação da criminalidade alcançou também em São Paulo e outros Estados, em armamento, estrutura e disposição de buscar os seus objetivos. Esse nível não subiu repentinamente. Avança como em degraus. Mas, como resposta, não houve nem há iniciativa alguma, de ordem legal ou de reformulação institucional, que procure os modos mais adequados de elevar o nível de proteção das cidades ao mesmo nível crescente do que as ameaça de dentro.
O Rio, Belo Horizonte, Recife, entre tantas, têm os núcleos da criminalidade disseminados na zona urbana principal. São Paulo, diferente, está cercada. Mas o efeito não difere. Hoje, as tais "supostamente facções criminosas" guerreiam-se e agem, no crime, por conta própria. No dia em que perceberem a sua força caso se unam -paro aqui. É melhor não imaginar, se nem para a realidade já à nossa frente os poderes e as "elites" voltam mais do que a atenção burocrática.


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