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São Paulo, sábado, 14 de junho de 2003

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CONTRA A CORRENTE

Intelectual petista recebe na USP título de cidadão paulistano e volta a criticar governo Lula

Medo venceu a esperança, diz Oliveira

DA REPORTAGEM LOCAL

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva reforça "a porta fechada" para o crescimento com inclusão social no Brasil. Mais ainda, a eleição do "maior partido de esquerda do mundo" pode legitimar a operação política em curso de diminuição da capacidade de ação do Estado.
As teses são do sociólogo Francisco de Oliveira, apresentadas anteontem durante discurso após receber o título de cidadão paulistano. Foram sintetizadas por ele, intelectual petista, com a inversão do slogan da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. "O medo venceu a esperança", disse.
Oliveira recebeu a "nova cidadania" em cerimônia da Câmara dos Vereadores transferida excepcionalmente para o auditório de história da USP.
Para ele, a tarefa da "social-democracia periférica", na qual incluiu indistintamente PT e PSDB, tem sido a de realizar a "funcionalização do capital, já na sua escala global, sem ter feito antes a tarefa da redução radical da desigualdade". "A social democratização é ela mesma a globalização", afirmou.
"A vontade política, na qual se colocou o acento da mudança, está sendo enquadrada pelos rigores da nova forma do capital", disse. Nova forma que é a porta fechada para o crescimento. "Com financeirização desaparece a porta. Ela está fechada com o cadeado dos juros, com a exportação de 9% do PIB como serviço da dívida externa."
Para Oliveira, o crescimento econômico experimentado pelo Brasil nas décadas de 50 e 70 não diminuiu, mas "fundou a exceção" -a miséria e a exclusão social- por concentrar renda em vez de distribuí-la. "Se crescimento a essas taxas ainda fosse possível, a exceção seria maior, não menor. Porque o desemprego seria maior, e não menor."
E as políticas estatais públicas atuais, segundo ele, são "políticas de exceção" para "compensar aquilo que a sociedade e o Estado não podem dar". "Quando se fala da Bolsa-Escola, está-se falando de uma escola que não pode ser frequentada. Quando se fala de Fome Zero, está-se falando exatamente de uma fome que não pode ser debelada."
Oliveira criticou a proposta de reforma da Previdência, segundo ele um "ataque ao caráter republicano do Estado, em nome do combate à desigualdade, que reitera a desigualdade".
Na cerimônia em que se tornou cidadão paulistano, o sociólogo se referiu diversas vezes ao seu Recife natal -chorou na primeira delas- e disse que, em nome da "exceção", vinha ali cobrar São Paulo por não ter usado seu poder econômico para "varrer os estigmas de uma má formação republicana antidemocrática" no país todo.
"Essa é uma cobrança em nome de toda a federação, dos que permanecem na província e dos que foram obrigados a emigrar", disse. "Mesmo que a história dessa migração possa ser contada romanceadamente pela Rede Globo como uma espécie de caminho de Garanhuns para a Presidência da República."
Ele disse ter odiado essa migração forçada na primeira vez que chegou a São Paulo. "Não ajudava muito, ao contrário, o preconceito contra os baianos, que reiterava a exceção da exclusão, e que ainda graça, veja-se a infeliz frase do atual ministro da Segurança Alimentar [José Graziano, que relacionou migração e violência na cidade]."


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