São Paulo, quarta-feira, 14 de setembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/FUNDOS DE PENSÃO

Banqueiro ensaia dizer na CPI que ex-ministro atuou para retirar o Opportunity e pôr os fundos no comando da Brasil Telecom

Dantas pode ligar Dirceu a disputa de teles

JANAÍNA LEITE
CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Encarada como trunfo contra o PSDB e o PFL na CPI dos Correios, a convocação do banqueiro Daniel Dantas pode acabar representando ainda mais dor-de-cabeça para o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). Dono do Opportunity, Dantas relata a amigos uma suposta atuação de Dirceu para que o banco transferisse aos fundos de pensão o controle da Brasil Telecom.
Dantas também afirma ter documentos registrados em cartório trazendo evidências de que a briga pelo controle da empresa tinha motivações políticas. E que o PT, mesmo antes de chegar ao governo, decidira afastá-lo da empresa.
Em junho de 2002, a Brasil Telecom apresentou um projeto de R$ 1,27 bilhão ao BNDES. O processo de aprovação consumiu dois anos, ainda que a empresa se identificasse como a segunda do ranking de créditos do BNDES.
Incomodado, o presidente do CVC (Citibank Venture Capital), Mike Carpenter, veio ao Brasil, em setembro daquele ano, para uma audiência com Dirceu.
Carpenter não só teria se queixado da demora do empréstimo mas também da ameaça de alijar o Citi da emissão de títulos do Brasil no exterior. Dirceu teria falado das restrições dos fundos de pensão ao Opportunity.
Então presidente do conselho da Brasil Telecom, o advogado Luiz Octávio da Motta Veiga diz que em uma conversa,sem testemunhas, no dia 16 de junho, Dirceu teria dito: "O problema você sabe qual é. Os fundos querem o controle da Brasil Telecom".
Coincidentemente, o dinheiro só foi liberado em novembro de 2004, depois que o Citibank já tinha retirado seu apoio a Dantas na briga judicial pelo comando da Brasil Telecom. "A minha avaliação é que, com a demora na liberação dos recursos do BNDES, os americanos tiveram o que chamam de "evidence" [indício, prova]. Por isso, Carpenter veio ao Brasil", opina Motta Veiga.
A Brasil Telecom é a operadora de telefonia fixa que atua nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sul. Apesar de majoritários, o Citi e os fundos de pensão entregaram a administração da empresa ao Opportunity em 1999. Em abril deste ano, o banco foi destituído.
A interlocutores Dantas também descreve o teor de três conversas mantidas com Dirceu sobre a BrT. Na primeira, em 4 de maio de 2003, Dirceu teria reconhecido que os fundos reivindicavam o controle da BrT e avisado que o então presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, fora escalado para convencer Dantas a abrir mão da operadora.
As duas conversas com Casseb, costuma contar, foram "ásperas". Dantas avisou que recorreria ao Citigroup para impedir a transferência. Casseb teria advertido que, se não espontaneamente, o controle seria tirado "na raça".
Com o fracasso da negociação, Dantas procurou Dirceu. Nas duas conversas seguintes, Dirceu teria afirmado ser contra a intervenção do Estado em negócios, mas reiterou que a opção pelos fundos era uma decisão de governo. À ocasião, Dantas teria reclamado especificamente da ofensiva do ministro Luiz Gushiken (Secom) em favor dos fundos. Dirceu teria mostrado constrangimento com o papel de porta-voz do governo nessa queda-de-braço.
A defesa da transferência foi endossada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 28 de maio de 2003. No encerramento do 1º Seminário Internacional dos Fundos de Pensão, Lula disse que "os fundos de pensão, no mundo inteiro, deveriam ter uma visão de solidariedade maior que a do Citibank". Isso teria acendido o alerta no Citigroup, que buscou uma aproximação com os fundos.

Marcos Valério
Dantas reconheceu a amigos ter sido apresentado a Marcos Valério de Souza no Opportunity, em São Paulo. O encontro não teria passado dos cumprimentos em um dos corredores do banco.
Não é a versão de Valério. Também a interlocutores o publicitário diz ter se reunido com Dantas pelo menos uma vez na sede carioca do Opportunity. Valério também teve contato com o sócio de Dantas, Carlos Rodenburg.
Valério diz que foi procurado por ser amigo do então tesoureiro do PT, Delúbio Soares. O Opportunity estaria interessado em se aproximar do governo. Queria ajuda para derrotar os fundos e Gushiken no caso Brasil Telecom.
Rodenburg diz a pessoas próximas que ele teria sido procurado por Valério e Delúbio. Diz não ter havido achaque porque os dois não sentiram espaço para esse tipo de abordagem.
Dantas diz que não gostou de ser chamado pela CPI. Para ele, o mais lógico era a convocação dos presidentes da Telemig e da Amazônia Celular, que creditaram R$ 145 milhões a DNA e SMPB.
Amigos de Dantas, porém, não acreditam que ele esteja tão insatisfeito assim. Inferem que o banqueiro está se preparando para lançar algumas dúvidas. A primeira é por que o presidente do Banco do Brasil não foi convocado para explicar os créditos que o banco fez às agências de Valério -R$ 241 milhões de 2003 a 2005.
Para esses interlocutores Dantas também deverá aproveitar a chance de pôr em dúvida as relações dos fundos com a Telemar.


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