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São Paulo, domingo, 15 de junho de 2003

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CASO CC-5

Procurador americano afirma que não recebeu informações que a Justiça de seu país exige para quebrar sigilo

EUA se negam a abrir contas e criticam PF

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos se recusou a quebrar o sigilo bancário de 16 contas indicadas pela Polícia Federal como beneficiárias de dinheiro enviado do Brasil que passou pela agência do Banestado de Nova York entre 1996 e 1997.
As autoridades americanas que não atenderam à solicitação alegaram inconsistência e falta de dados específicos na investigação brasileira. Numa dura carta enviada ao Brasil, à qual a Folha teve acesso, o procurador americano Michael Burke criticou a falta de objetividade da Polícia Federal.
Juntas, essas 16 contas movimentaram cerca de US$ 374,1 milhões somente nos anos de 96 e 97 (muitas delas continuaram operando depois). São 13 contas nos bancos Chase Manhattan, MTB e do Brasil em Nova York e três nos bancos Ocean, Republic e Real em Miami (EUA).
No grupo estão contas de cinco pessoas físicas, seis identificadas por apelidos - "Aquarius", "Recife", "Flamingo", "CSS", "Yukon River" e "Campari"- e cinco em nome de empresas.
Uma das contas que tiveram o sigilo mantido é a do irmão do senador Jorge Bornhausen (PFL-SC), Paulo Bornhausen, que recebeu US$ 58 mil. Em fevereiro último, procurados pela Folha, ambos negaram irregularidades (veja texto na página 17).
Também foi pedida -e negada pelos EUA- a quebra do sigilo da conta no Banco Real de Miami do deputado federal licenciado Wigberto Tartuce (PP-DF). Ele também negou irregularidades nas remessas.
Não há uma razão clara, por parte da PF, para a escolha dessas duas contas que se relacionam a políticos. Elas movimentaram valores pequenos se comparadas a dezenas das cerca de 27.000 operações sob suspeita. Depois das duas, a conta menos robusta girou US$ 2 milhões.

"Pesca"
Em fevereiro, a secretária nacional de Justiça, Claudia Chagas, esteve em Washington e em Nova York, onde se reuniu com autoridades americanas e acertou que, mediante entrega de documentos obtidos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público brasileiros, seria solicitada a quebra de sigilo de cerca de cem contas da agência nova-iorquina do Banestado (Banco do Estado do Paraná, privatizado em outubro de 2000).
Feito o acordo, Chagas retornou ao Brasil e deixou a cargo da equipe da PF as tratativas para encaminhar o pedido de quebra em etapas, incluindo contas de outras instituições bancárias. O primeiro pedido foi o das 16 contas.
A recusa do Departamento de Justiça foi a gota d'água para que o procurador americano Michael Burke enviasse uma carta à diretoria de Assistência Judiciária Internacional do Ministério da Justiça com severas críticas às autoridades brasileiras, afirmando que já conhecia fatos gerais, precisava de documentos de caráter específico sobre as transações financeiras e não liberaria mais nenhuma informação necessária ao caso brasileiro antes que o acordado em fevereiro fosse cumprido.
Burke revela ainda que o acordo de cooperação bilateral estaria seriamente prejudicado.
"O que ainda não recebemos por escrito é pelo menos um exemplo detalhado de uma transferência de dinheiro específica que tenha se originado no Brasil em uma conta CC-5 [para não-residentes] e tenha sido então transferida para uma conta específica do Banestado de Nova York e que tenha sido transferida para um terceiro banco em Nova York ou Miami, cujos registros recebemos a solicitação de obter mediante ordem judicial", diz Burke em carta enviada no dia 21 de abril.
Na carta, Burke esclarece que tais explicações são necessárias para que os tribunais dos EUA sejam convencidos da eficácia da investigação. "Sem tais exemplos específicos (...) e uma metodologia bem explicada, os pedidos de assistência jurídica do Brasil podem parecer para os tribunais americanos uma "expedição de pesca" descontrolada."
O procurador americano explica que "precisa informar" aos tribunais americanos os seguintes pontos: número da conta CC-5 e o banco na qual foi mantida; o que a investigação brasileira descobriu sobre quem abriu a conta CC-5, quando ela foi aberta, no nome de quem e quem controlava a conta; e as datas e valores de uma transferência específica da conta CC-5 para o Banestado de Nova York que a força-tarefa brasileira está investigando. Burke escreveu que precisa "de fatos, em vez de conclusões e afirmações".
A possibilidade de rompimento do acordo bilateral provocou uma imediata ação do Ministério da Justiça, que vem tentando reverter a situação com iniciativas técnicas, começando por levantar documentos do Banestado para remetê-los à Justiça americana. (ANDRÉA MICHAEL E RUBENS VALENTE)


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