São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

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CAMPANHA

Campanha eleitoral leva novos visuais para a televisão e os outdoors

Hora do Botox

PAULO SAMPAIO
DA REVISTA DA FOLHA

A foto do aperto de mão entre Lula e José Sarney foi capa do jornal -na surpreendente confraternização, Sarney, com 72 anos, parece mais jovem que Lula, 57.
"Eu tenho de tratar esse corpo que carrega essa alma atribulada", justifica o senador, que está com os cabelos e o bigode mais escuros. "Uso uma mousse, dou uma ajudada. Como disse um repentista aqui da região, "o senhor chegou aos 70 com o pescoço fino e a cara de menino"."
A foto de capa despertou a atenção para outros casos de "new faces". Alguns carregaram na tinta e outros estão sob forte suspeita de uso ostensivo de Botox -toxina botulínica que "alisa" rugas faciais- e preenchimentos, que resolvem sulcos profundos na região do bigode chinês (entre o nariz e a boca) e pescoço.
"Não sou contra mexer no rosto dos candidatos, mas só o suficiente para deixá-los com a expressão tranquila. Tem gente que parece que bebeu Botox, está deformada", diz o marqueteiro Nelson Biondi, de José Serra.
Ele explica que, em geral, um marqueteiro não orienta o candidato a fazer ou não retoques, é uma decisão pessoal -mas há casos de exagero. Segundo Biondi, "Orestes Quércia é um que não tem mais nem um risco na cara".
"Nem sei o que é Botox...Preenchimento? O que é isso?", pergunta Quércia, que, na hora de declarar a idade, diz que tem "64, com aparência de 37". Ele assume, no máximo, uma plástica feita no nariz há 25 anos e o uso do produto Grecin nos cabelos acaju.
"Rá, rá, rá", reage o candidato a deputado Roberto Jefferson. "E o [candidato a deputado Rubem" Medina, não fez nada?", debocha. Jefferson se submeteu a uma plástica para retirar 8 quilos de pele depois de uma cirurgia de redução de estômago que o levou a perder 78 quilos. "Eu estava com uma fralda de gordura na região pubiana que me deixava constrangido de tirar a roupa até na frente da minha esposa. Agora, só falta essa barba de touro (excesso abaixo do queixo). Vou tirar depois das eleições", conta.
Na opinião de Jefferson, "os candidatos deveriam assumir os retoques". "O eleitorado se identifica com pessoas que passaram por um esforço pessoal, um sacrifício. Você vira o ideal de ser humano deles", acredita. Segundo ele, desde que adquiriu o novo layout as mulheres querem tocá-lo, abraçá-lo... "O retorno que a boa aparência traz, em termos de votos, é incrível", avalia.
Outro sob forte desconfiança de "porre de botox" é Luiz Carlos Santos, 70, que em sua aparição no horário eleitoral praticamente só mexe a boca -permanece de olhos bem abertos. Santos recebe o telefonema da Folha com muito bom humor. "Finalmente uma notícia boa no dia: você está me achando mais jovem!", diz. Em seguida, ele explica que "plástica, propriamente, eu não fiz". Fez o que, então? "Uma intervenção nas bolsas abaixo dos olhos....só."
Ele assume a hipocondria e diz que é por causa dela que sabe tanto de "medicina". Afirma que entende "pouco do Botox", mas acaba dando uma aula. "É aplicado entre as sobrancelhas ou na testa e pés de galinha. Mas perde o efeito em três ou quatro meses..."

Conhecimento de causa
A dermatologista Ligia Kogos, botoqueira oficial das socialites paulistanas, diz que "os políticos estão muito bem informados". "Eles lêem tudo que sai sobre o assunto. Nos procuram porque sofrem tensão e têm de aparentar calma. O que mais gostam é o Botox, porque o procedimento, em si, não dura mais de cinco minutos, e os resultados são rápidos", diz. Ligia não diz quais políticos frequentam sua clínica (mas conta que são muitos). Sabe-se que Quércia posou com a família para "Caras", no aniversário do marido de Kogos. Pitta e Maluf também estariam "retocados".
Pitta nega, por meio de sua assessoria, qualquer intervenção no rosto. Diz que se cuida, caminha pela manhã -agora na periferia- e tem alimentação saudável.
"O Luiz Carlos Santos e o Pitta são os mais esticadinhos", diz um consagrado dermatologista que assistiu ao horário eleitoral gratuito para fazer uma avaliação.
Ele diz que a toxina botulínica e os preenchimentos funcionam bem para atenuar as expressões de tristeza, austeridade e mau humor dos candidatos, mas devem ser usados com parcimônia. "O Botox em exagero pode, em vez de atenuar, acabar com a expressão do político." O médico explica que o procedimento é feito no consultório, com o uso de uma pomada anestésica. "A dor é muito suportável, e a aplicação só deixa pontinhos vermelhos, que desaparecem em quatro dias."
O custo do procedimento é R$ 800 por área -testa, pés de galinha, pescoço. A vantagem, segundo o especialista, é que dá para fazer retoques ainda antes da eleição. "A plástica, por causa da recuperação mais demorada, tem de ser feita no mínimo um ano antes da exposição maciça", diz.
O senador Ney Suassuna, outro especialista em "retocados", diz que "todo mundo está botocado" -ele proíbe a publicação da lista dos nomes, mas ela é extensa.
Suassuna diz que aplicou Botox entre as sobrancelhas e na região dos pés de galinha. "Mas eu não sou candidato!", reage. O senador afirma que a grande vedete agora é o que chama de "botox eletrônico". "O computador deu um jeito. Quem não foi de Botox está tão transformado nas fotos que não dá para reconhecer."


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