São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2000

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POLÍTICA E PALHAÇADA

Complexo de rejeição pode levar políticos ao divã

HUGO POSSOLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O mais importante não é saber em quem você acredita, mas quem você rejeita. As pesquisas estão atrás de saber quem rejeita quem.
Os políticos, que sempre sustentaram os analistas econômicos, vão ter que destinar parte de suas verbas aos analistas freudianos, jungianos, reichianos, baianos e troianos. Não há divã que aguente tanta rejeição. Freud explica, mas também não ajuda. Não há motivos para rejeitarmos os pobres coitados. É preciso dar alento àqueles que tão bem cuidam do que é seu. Seu, deles, é claro.
O índice de rejeição do Maluf, por exemplo, está tão alto que daqui a pouco dá para reunir todos os malufistas em uma única pizzaria. E ainda dá para todo mundo sentar na mesma mesa. O ACM rejeita o Jader Barbalho porque ele é bom de rima. O Jader rejeita o ACM porque tem um bigodinho igual ao do Sarney. O FHC rejeita o espelho porque ele deve ter vergonha.
No horário político, a Marta adotou a expressão "se for eleita", com medo do clima de já-ganhou. Ela não quer ser rejeitada por aqueles que a rejeitaram no primeiro turno. E muito menos quer ser rejeitada por aqueles que não a rejeitaram. Tem medo dos que votaram nela, mas discordam de alianças. Como sexóloga, ela sabe: o eleitor é um traidor potencial. Maluf que o diga.
Este, negando que está isolado, sem alianças, afirma que casou com o povo sofrido. Casar com o Maluf só mesmo a dona múmia. Já não basta o povo ser sofrido e ainda vai arranjar casório com ele? Só se for por interesse. E sem separação de bens. Já pensou? O Maluf dividindo o patrimônio pessoal declarado de 75 milhões com o povão? Só em obra de ficção.
E a campanha do PT deve ter rejeitado os cantores de seu jingle. Contrataram uns atores que destoam das vozes que dublam. Soa falso. Parece novela mexicana do SBT. É a cara do atual PT. O retrato de um partido que não combina seu discurso com sua ação.
Por sinal, as crianças estão rejeitando os jingles. Não se vê um petiz azucrinando nossos ouvidos como em eleições passadas. Esperteza delas ou falta de competência dos publici-otários?
Aliás, o Maluf trocou de publici-otário e o atual já está rejeitando o patrão. Deixou passar o refrão: "a gente merece quem sabe o que faz". Merece mesmo. Por isso que o Maluf está sendo tão rejeitado nas pesquisas.
Até no futebol a rejeição está destruindo os egos aparentemente inabaláveis. Marcelinho Carioca está se sentindo rejeitado só porque ganha uma fortuna por mês para ser expulso. Já o Romário trocou o complexo de rejeição que o Luxemburgo tinha por ele. Rejeitou-se a pagar imposto.
E o Luxemburgo, depois de rejeitado como técnico da seleção, está com a síndrome de fuga. Fuga de dólares para o exterior.
Enfim, temos que ser mais delicados e carinhosos com os pobres senhores que cuidam da vida pública. Depois de eleitos, carregados de mágoa, eles podem se vingar da gente.
Por favor, caro leitor, não confunda complexo de rejeição com complexo de Requião. Este é aquele que queria ser oposição e não conseguiu. Muito menos confunda com complexo requeijão. Este é o do Itamar, que quer fazer a República das Bananas se tornar República do Pão de Queijo.
Rejeição é coisa séria. Rejeite imitações. Para isso, é preciso seguir as leis do neoliberalismo que mandam no mundo. Ou seja, amor com amor se paga, mas, antes, deve-se retirar uma comissão.


Hugo Possolo é palhaço, dramaturgo e diretor do grupo Parlapatões, Patifes & Paspalhões


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