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A REVANCHE DOS 300
Novo presidente da Câmara promete não atrapalhar Lula e aumentar salário parlamentar
Governo enfrenta pesadelo e traição na noite dos severinos
RANIER BRAGON
FABIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo sofreu sua maior
derrota no Legislativo com a eleição na madrugada de ontem de
Severino Cavalcanti (PP-PE) para
a presidência da Câmara dos Deputados, fato inédito na história
recente, já que não há registro de
vitória de um candidato de oposição numa disputa com um governista para dirigir a instituição.
Severino, que assumiu ontem
como o 99º presidente da Câmara, teve 300 votos no segundo turno, 105 a mais do que Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), candidato apoiado pelo Palácio do Planalto, que obteve 195 votos.
Logo em seu discurso de posse,
adotou um tom conciliador ao dizer que não criará "empecilhos ao
meu conterrâneo de Pernambuco
[o presidente Lula]" e prometeu
aumentar o salário dos deputados
-de R$ 12.800 para R$ 21.500.
A manifestação do Hino Nacional puxado pelos apoiadores de
Severino foi assistida por perplexos petistas, que não conseguiam
acreditar na quebra da tradição
segundo a qual a maior bancada
da Casa -no caso, o PT, com 91
deputados- indica o presidente.
A votação demorou mais de 12
horas. Começou às 18h de anteontem, e o resultado foi proclamado
às 6h38 de ontem. No primeiro
turno, anteontem, Greenhalgh
venceu com 207 votos contra 124
de Severino. O candidato rebelde
do PT, Virgílio Guimarães (MG),
obteve 117 e ficou em terceiro.
"Esse episódio foi uma explosão
de uma coisa contida, de todo um
sentimento anti-PT, anti-governo", afirmou o deputado Alberto
Goldman (PSDB-SP). "Votamos
contra o Lula. Começamos hoje
[ontem] a derrotar a reeleição dele", disse José Carlos Aleluia (BA),
que também foi candidato e recebeu 53 votos no primeiro turno.
A traição foi clara, facilitada pelas votações secretas. A base governista soma 377 deputados,
73% do total de 513. "Os partidos
que compõem o governo não foram leais. Senão todos, grande
parte", disse Beto Albuquerque
(PSB-RS), um dos vice-líderes do
governo. A suspeita paira sobre
PMDB, PTB e PP, que freqüentemente se dizem insatisfeitos com
o atendimento dado pelo Planalto: não-liberação de verbas para
as emendas apresentadas ao Orçamento, não-efetivação de indicados para cargos federais e mau
atendimento pelos ministros em
relação aos pleitos dos deputados.
"É melhor não falar nada do que
falar coisa que não deve", limitou-se a dizer João Paulo Cunha (PT-SP), que deixou ontem o posto de
presidente da Câmara. "Muitos
acharam que essa era a forma de
revidar uma insatisfação com o
governo", afirmou José Múcio
(PE), líder da bancada do PTB.
A insatisfação não foi contida
nem mesmo com a promessa de
distribuição de verbas e de cargos
que o governo teria feito, segundo
vários deputados ouvidos.
Petistas já falavam ontem em retaliação, principalmente ao PP de
Severino, partido cotado para assumir um ministério. A responsabilidade pelo fracasso também era
atribuída aos ministros políticos,
em especial Aldo Rebelo (Coordenação Política) e José Dirceu
(Casa Civil). A derrota do Planalto se torna mais contundente porque vários ministros se empenharam pelo candidato oficial.
Greenhalgh cumprimentou Severino, mas não quis dar entrevistas. Virgílio afirmou que não se
sente culpado pela derrota petista
e disse que sempre alertou haver
na Casa um sentimento de independência em relação ao Planalto.
Severino, 74, que terá mandato
como presidente até fevereiro de
2007, é defensor histórico do aumento de recursos para os deputados e freqüentemente caracterizado como o defensor do "baixo
clero", como são conhecidos os
deputados de pouca expressão
política.
"É a vitória do retrocesso. Um
grupo que pretendeu atingir o governo, atingiu a si próprio", disse
Chico Alencar (PT-RJ).
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