São Paulo, quarta, 16 de julho de 1997.



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RUMO A 2002
Objetivo é mudar sistema de governo em um eventual segundo mandato tucano
Governo trabalha por parlamentarismo

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília

A articulação para implantar o parlamentarismo no Brasil é para valer e o Executivo vem dando passos efetivos nessa direção.
O objetivo não é mudar o sistema de governo agora, mas na segunda metade de um eventual novo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Pelo menos quatro providências estão sendo tomadas para sedimentar a instituição do parlamentarismo:
1) instalação ainda neste ano das agências reguladoras de energia, petróleo e telecomunicações, criando órgãos autônomos e independentes do conjunto do governo em três áreas estratégicas de desenvolvimento;
2) criação no primeiro semestre de 1998 de um Ministério da Defesa, acima dos três ministérios militares (Exército, Marinha e Aeronáutica);
3) fortalecimento da burocracia estatal, por meio das reformas constitucionais e alterações infraconstitucionais da administração pública e da Previdência Social;
4) uma reforma política, especialmente na parte eleitoral, para dar maior consistência aos partidos. O líder do PSDB no Senado, Sérgio Machado, já tem um projeto esboçado em comum acordo com o governo.
Como base, o projeto prevê voto distrital misto, fidelidade partidária, exigências para representação no Congresso e maior proporcionalidade entre população e bancadas estaduais.
As quatro medidas visam criar condições para a troca de sistema de governo, mas duas coisas já estão descartadas: a realização de um plebiscito sobre o assunto em 98, simultaneamente às eleições presidenciais, e a discussão de um sistema híbrido, meio termo entre parlamentarismo e presidencialismo.
Conforme a Folha apurou, entre os que discordam do plebiscito e do sistema híbrido está FHC. A última consulta popular sobre o parlamentarismo foi em 93 e ele acha que não teria sentido repetir a dose em tão curto espaço de tempo. Um outro argumento é o de que seria um complicador a mais para o clima da campanha eleitoral de 98.
Quanto ao regime híbrido, é rejeitado tanto pelos parlamentaristas quanto pelos presidencialistas. "Já imaginou este Congresso aí podendo demitir um ministro? Ia cair ministro toda semana", disse um articulador do movimento.
Chefe de Estado
O presidente, segundo seus mais próximos aliados, não quer se envolver diretamente com a discussão sobre o parlamentarismo e sempre repete a mesma frase: "Essa é uma decisão do Congresso".
Ele está convencido de que, se encabeçasse o debate, seria acusado de estar querendo um terceiro mandato, como chefe de Estado, a partir de 2002. É essa a desconfiança no meio político, até porque FHC tem um perfil mais próximo de chefe de Estado do que de chefe de Governo.
Num regime parlamentarista, o chefe de Estado representa o país junto aos demais países. O chefe de governo cuida do dia-a-dia da administração interna do país.
Conforme a Folha apurou, FHC tem dito que está sentindo o peso do primeiro mandato, sabe que um eventual segundo também seria difícil e, aos 66 anos, prevê que não terá vontade para mais uma fase no poder.
No Congresso
Há pelo menos dois pólos de irradiação da discussão sobre o parlamentarismo no Congresso.
Um é liderado pelo deputado e ex-governador Franco Montoro (PSDB-SP), que marcou para ontem a comemoração de seu 81º aniversário com uma grande festa parlamentarista.
Montoro tenta criar uma frente suprapartidária parlamentarista, com a participação também de líderes sindicais e empresariais.
O outro pólo é ainda ensaiado pelo senador e ex-governador Guilherme Palmeira (PFL-AL), que está convencido de que o presidente foi eleito com toda a força em 94, ainda sob o impulso do Real e com a imagem de intelectual recém-chegado à política. As condições agora são outras.
Na segunda eleição, o Real pode não ter a mesma força eleitoral e FHC já perdeu a aura de político neófito, depois de se envolver diretamente com a conquista de votos no Congresso. Até as trocas de chefias na Suframa e no DNER mineiro foram passar na sua mesa -o que é típico do presidencialismo. Os partidos aliados brigam. Quem desempata é o presidente.
A conclusão do raciocínio é que, se for eleito, o presidente deverá sair mais fraco da segunda do que da primeira eleição.
Desgaste
Estrategistas do parlamentarismo usam Bill Clinton, nos EUA, Carlos Menem, na Argentina, e Alberto Fujimori, no Peru, para mostrar que há um sinal amarelo favorecendo o parlamentarismo: o segundo mandato no presidencialismo é, invariavelmente, mais difícil do que o primeiro.
O presidencialista Marco Maciel ressalva que aqueles países são muito diferentes do Brasil e que os personagens também são muito diferentes de FHC.
Para o vice, há dois contrapontos de reeleição bem-sucedida: a Inglaterra e a França. Mas esses dois países são parlamentaristas.
Para se resguardar no ano da eleição e no início de um eventual segundo mandato, FHC espera aprovar no segundo semestre as reformas da administração e da Previdência, que exigem três quintos de votos da Câmara e do Senado. Com isso, diminuiria o poder de pressão dos partidos aliados sobre o governo.
Além das duas, falta também a aprovação do FEF (Fundo de Estabilização Fiscal), que pode sair ainda durante a convocação extraordinária deste mês de julho.
A partir daí, os aliados governistas vão se dedicar com afinco à reforma política. Com os partidos desmantelados como estão, seria inviável qualquer aventura parlamentarista, reconhecem até os adeptos históricos da mudança do sistema de governo.
Os estrategistas políticos do governo sugerem que, para garantir a sobrevivência do PSDB, os tucanos devem abraçar o projeto parlamentarista. Essa foi a principal bandeira do partido na sua criação em 1988. Pode ser a garantia de sua permanência no poder a partir de 2002.



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