UOL

São Paulo, terça-feira, 16 de setembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CONTAS PÚBLICAS

Em entrevista ao "El País", ministro diz que só ficará no cargo se puder oferecer educação para todos

Cristovam volta a reclamar do Orçamento

DA REDAÇÃO

O diário espanhol "El País" publicou ontem uma entrevista com o ministro da Educação, Cristovam Buarque, concedida durante a 13ª Conferência Ibero-americana de Educação, realizada na semana passada na cidade de Tarija (Bolívia). O ministro voltou a reclamar da falta de verbas de seu ministério e disse que não será ministro "a qualquer preço".
Eleito mediador do encontro, Cristovam incluiu no texto final uma proposta para a troca da dívida externa por investimentos em educação. Leia trechos de sua entrevista para o "El País":
 

Pergunta - Tarija mudou o curso dos encontros ibero-americanos de educação, pois foi a primeira que apresentou um documento com reivindicações muito concretas aos chefes de Estado e de governo.
Cristovam Buarque -
O importante é que todos os ministros presentes apoiaram a minha sugestão e a do ministro argentino. É que, ainda que não exista um só governo na América Latina que negue que a educação é o coração da democracia, quando chega o momento de fazer os orçamentos eles se esquecem disso. Por isso decidimos pedir algo que eu já defendia desde 1998, a troca da dívida externa por educação.

Pergunta - O sr. acredita que essa proposta é factível?
Cristovam -
Ela é, sim. Já temos experiência de troca de dívida por investimentos ambientais. Por isso lançamos a proposta. Há diversas formas de implementá-la. Por exemplo, é possível deduzir 10% da dívida externa, que iria para um banco a ser criado, que canalizaria as verbas para os diferentes projetos educativos de cada país.

Pergunta - Todos olham com certa esperança a experiência do Brasil, porém o primeiro Orçamento do governo Lula, o reajuste para a educação cobre só a inflação anual.
Cristovam -
Para a educação e para o social em geral, teria sido desejável um Orçamento mais generoso. Por isso quando Lula o apresentou, eu me atrevi a dizer-lhe que o projeto não tinha sua cara, isto é, a cara da esperança que a gente tinha depositado nele. Eu sou realista. Apóio, como indispensável, a atual política econômica do ministro Antonio Palocci e até entendo que, constrangido pela herança que recebeu, Lula não pôde apresentar um Orçamento mais voltado para a educação e para o social. Porém o que eu gostaria é que ele tivesse dito: "Este não é o orçamento que eu desejava, porém eu asseguro que os próximos vão ter a cara da esperança, do novo Brasil que queremos construir, com mais e melhor educação para todos".

Pergunta - Lula estaria tendo problemas com seu partido, o PT, que o levou ao poder com o apoio dos movimentos sociais?
Cristovam -
O problema de fundo de Lula é que o PT não acertou as contas com seu passado antes de chegar ao poder. E agora convivem nele várias almas que lutam entre si. Eu entendo que é necessário punir os deputados que votaram contra as reformas, mas compreendo também que alguns companheiros não entendem por que têm de votar contra aquilo que o partido sempre defendeu, sem que tenha havido um congresso extraordinário que indique que tipo de partido se deseja, agora que a esquerda chegou ao poder. O PT tinha nascido para defender algumas categorias concretas, entre elas a dos funcionários públicos, e os sindicatos. Hoje o mundo e o Brasil mudaram. Teremos ainda que elaborar o que é o "lulismo", algo que é sem dúvida importante e sugestivo.

Pergunta - Seria doloroso ter de deixar o ministério por causa de composições políticas?
Buarque -
Não creio que eu vá sair, porém o que é certo é que eu não serei ministro a qualquer preço. Aceitei ser ministro, como havia sido governador ou reitor da Universidade de Brasília, para trabalhar pelo sonho de uma educação de qualidade para todos os brasileiros. Só isso me interessa, e Lula, que sofreu na sua própria pele o fato de não poder estudar e de ter uma mãe analfabeta, sabe disso e o compreende muito bem.


Texto Anterior: Previdenciária: Líder do PT no Senado quer ajustes no projeto aprovado pela Câmara
Próximo Texto: Lula não "pagou à elite", diz ministro
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.