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JUDICIÁRIO/OUTRO LADO
Para a presidente do tribunal, juízes saberão se justificar à altura; ex-diretor-geral nega conhecer irregularidades
Suspeitas são gravíssimas, diz juíza do TRT-SP
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo,
juíza Dora Vaz Treviño, afirma
que "são gravíssimas as suspeitas
levantadas pelo Ministério Público Federal" acerca da suposta manipulação dos sistemas de distribuição de processos que tramitaram no órgão entre 1994 e 2004.
Em nota oficial, a juíza informa
que assumiu a presidência do tribunal em 15 de setembro de 2004,
e somente tomou conhecimento
das suspeitas de irregularidades
apontadas pelo Ministério Público quando procurada pela Folha.
"Solicitarei à Procuradoria da
República informações sobre o
procedimento investigativo em
curso naquela instituição, para
adotar, com a máxima urgência,
as medidas administrativas cabíveis", afirma a juíza.
Conforme a nota, "se irregularidades tiverem sido efetivamente
praticadas, os honrados juízes e
os servidores deste tribunal saberão dar resposta à altura".
Procurada pela Folha, a servidora da Justiça do Trabalho Heloísa Bernardi, que é citada como
testemunha de pelo menos uma
fraude, segundo depoimento colhido pelo Ministério Público no
curso da investigação sobre irregularidades na distribuição de
processos no TRT, afirmou: "Eu
não vou nem descartar que isso
poderia ter acontecido. E vou dizer mais: eu só não faço o que um
juiz manda se ele mandar eu me
jogar daqui de cima".
Bernardi disse ainda ser comum
juízes sugerirem manipular a distribuição de processos. "Sempre
sugerem. Sempre rola. Sugerem.
Eles pedem tudo que querem."
Entre setembro de 1994 e setembro de 2005, os sistemas de distribuição de processos foram subordinados a Flavio Bulcão Carvalho,
que era diretor-geral de Coordenação Judiciária.
Cabia a Carvalho organizar, em
um laptop, a distribuição dos processos cuja tramitação, na Justiça
do Trabalho, começava diretamente pelo tribunal. Quando em
férias, repassava sua senha para
que Bernardi fizesse o serviço.
Esse tipo de distribuição, segundo a Procuradoria, está sob suspeita, com base em depoimentos
colhidos na investigação.
Carvalho diz não ter conhecimento das irregularidades apontadas pelo Ministério Público e
nega ter recebido qualquer pedido ou proposta financeira para
manipular a distribuição.
Segundo Carvalho, é dos presidentes do tribunal a responsabilidade pela distribuição de ações
que nascem no tribunal, como os
mandados de segurança.
"É por isso mesmo que eu estou
indignado. Quem faz as distribuições é o presidente do tribunal. Eu
não sei o que o servidor tem a ver
com isso. Passei por cinco presidentes e nunca vi isso", afirmou o
servidor na quinta-feira.
Carvalho negou ter conhecimento de que seria tecnicamente
possível apagar dados relativos à
distribuição, desde que isso fosse
feito no mesmo dia.
Distribuição irregular
Até o momento, segundo o Ministério Público, foram levantados fortes indícios de distribuição
irregular, no tribunal, de 22 processos oriundos da primeira instância da Justiça do Trabalho. A
tramitação de 20 deles se deu na
gestão de Carvalho. Outros dois
foram distribuídos pelo seu antecessor, Ivan Freddi.
Freddi disse à reportagem que é
um servidor concursado e que
sempre atuou dentro da lei e em
respeito ao regimento do TRT.
A juíza Maria Aparecida Pellegrina, que segundo depoimento
colhido pelo Ministério Público
teria pedido à servidora Heloísa
Bernardi que direcionasse a distribuição de um processo, nega
veementemente a acusação.
No entendimento da Procuradoria, é suspeita a distribuição do
mandado de segurança proposto
pelo Corinthians contra o jogador
Marcelinho Carioca, em setembro de 2001. Segundo Pellegrina,
como se trata de um mandado de
segurança, a distribuição cabe aos
presidentes do tribunal. Ela ocupou esse cargo entre 2002 e 2004.
"O mandado de segurança é
distribuído perante o presidente.
Não pode me passar pela cabeça
que o presidente mandou para
mim de uma forma "a pedido". Isso daí é um verdadeiro absurdo. A
única coisa que posso te dizer é
que eu não pedi a ninguém para
distribuir. Ninguém pede. Não
existe isso", disse Pellegrina.
O então presidente do tribunal,
juiz Francisco Antonio de Oliveira (2000-2002), hoje aposentado,
disse à Folha que a distribuição de
processos, "feita pelo laptop, não
é totalmente segura", porque passa "pela mão humana" [refere-se
ao servidor que prepara o procedimento]. Por mais que você confie no funcionário, no laptop essa
distribuição pode vir preparada e,
na hora, você só faz a mis-en-scène", disse Oliveira.
Gallo e Rede TV!
A juíza Laura Rossi, para quem
foi distribuído o processo trabalhista que envolve o empresário
Rogério Gallo e a Rede TV!, disse,
por meio da assessoria do TRT,
ter tomado conhecimento da
existência de rumores sobre irregularidades naquela distribuição.
Rossi disse que chamou a advogada de Gallo, Gilda Figueiredo
Ferraz, para conversar sobre o assunto. Na ocasião, segundo a juíza
disse ontem por meio de assessoria, a advogada teria insinuado
que, se perdesse o processo, iria à
imprensa contar dos rumores.
A juíza disse, então, ter achado
melhor julgar-se impedida e deixar a causa. A relatoria foi redistribuída para a juíza Sônia Forster
do Amaral. Gilda negou a acusação. Disse que não foi "chamada"
pela juíza. "Lá estive acompanhada de uma colega, a advogada
Adionan Arlindo Pitta, para entregar um memorial, o que é usual
num processo dessa magnitude,
sendo ela [Rossi] a relatora."
Também por meio da assessoria, a juíza Sonia Forster do Amaral disse que atuou na causa Gallo
x Rede TV! porque, como substituta, recebeu o processo, como
qualquer outro, em lugar de algum magistrado que estava em
férias. A Rede TV! negou ter conhecimento de qualquer irregularidade na distribuição do TRT.
A Pedreiras Cantareira, que é
parte em quatro processos cuja
distribuição foi considerada irregular pela Procuradoria, informou que "o Código de Conduta
do Grupo Holcim condena qualquer tipo de procedimento irregular. Causa-nos surpresa a menção da empresa, pois acreditamos
na imparcialidade e correção nas
condutas do Poder Judiciário".
Pelo juiz Renato Mehanna Khamis, que atuou em uma das causas da Cantareira e hoje está aposentado, falou sua mulher, Cecília. Disse que o marido está com
grave problema de saúde e que os
juízes apenas recebem os processos. Não têm participação nos
procedimentos de distribuição.
O Sport Club Corinthians disse
que a condução do mandado de
segurança foi feita por uma empresa norte-americana, sua parceira comercial à época. A Folha
procurou a assessoria do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva
Advogados, que propôs a ação.
Não houve resposta até a noite da
sexta-feira.
(ANDRÉA MICHAEL)
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