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São Paulo, sexta-feira, 17 de janeiro de 2003

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JANIO DE FREITAS

Muito além de Sarney

O empenho do governo, ontem recompensado com o êxito inicial, para impedir a eleição de Renan Calheiros e fazer de José Sarney o presidente do Senado, tem alcances muito além dessa disputa e, mais importante, além até do objetivo tático da cúpula governamental.
A adesão de Sarney à candidatura Lula ainda na primeira hora eleitoral tem sido dada, com frequência, como razão do empenho petista. Pode haver o componente de retribuição, sim, mas não bastaria para justificar o investimento governamental iniciado quando ainda trazia risco para a eleição de um petista à presidência da Câmara. Muitos outros deram contribuição expressiva à candidatura Lula e não recebem nem o mínimo sinal de reconhecimento.
As presidências da Câmara e do Senado desfrutam de liberdades regimentais, muitas delas contrárias à própria natureza do Parlamento democrático, que permitem influência decisiva no destino de matérias e decisões. Sem a presença de Luís Eduardo Magalhães na presidência da Câmara, com seus truques na operação de prazos, tramitações, pauta e outros ingredientes, é incerto que fossem aprovadas todas as reformas constitucionais do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Renan Calheiros é experiente, conhece os truques da atividade parlamentar mais do que conviria e integra a corrente do PMDB mais hostil ao PT. Em parte por si mesmo, mas sobretudo pelo que representaria na presidência do Senado, Calheiros é considerado um risco para os projetos que o governo quer ver apreciados no Congresso sem as "negociações" em tudo exigidas pela corrente que há tantos anos domina o PMDB. Por sua adesão à candidatura Lula e agora ao governo, Sarney é visto como fator de normalidade na condução do Senado. Ou, convém presumir, se houver truque, será pró-governo. E seu bom entendimento com o PFL será fortalecido, nas discussões em torno de matérias e comissões, pela posição mais elevada no Senado.
Até aí estão resultados práticos que explicam a investida do comando governista no Senado - registre-se, aliás, que muito bem conduzida por José Dirceu, com participação do próprio Sarney. Na outra instância de resultados da operação, se afinal vitoriosa, este é o previsível: assim como o insucesso de ontem de Renan Calheiros e sua corrente, na tentativa de já derrotar o adversário dentro do partido, prenuncia a vitória de Sarney, esta prenuncia a virada na futura convenção peemedebista para escolha do comando partidário.
Com a ajuda explícita e decisiva do governo passado, os peemedebistas contrários à corrente fisiológica foram sucessivamente derrotados nas convenções nacionais do PMDB. Se o comando exercido por Michel Temer, Geddel Vieira Lima, Moreira Franco e congêneres é substituído, afinal, pela corrente mais autêntica do PMDB, daí advêm, por certo, mudanças imensas na vida política, no Congresso, em muitos Estados e em muitas das reformas necessárias. Com realce, no caso, para uma reforma política e partidária verdadeira,sempre impedida pelos fisiológicos do PMDB e parte do PFL.


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