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São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2003

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QUESTÃO INDÍGENA
Ministério Público Federal anuncia que abrirá ação judicial contra portaria do ministro da Justiça
Acordo para redução de reserva é anulado

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Os três procuradores titulares da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria Geral da República, em Brasília, decidiram ontem anular o acordo assinado entre fazendeiros e índios do sul do Pará, usado pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para baixar portaria que reduziu em 17,2% a Terra Indígena Baú, originalmente com 1,85 milhão de hectares, em Altamira (PA).
A câmara, que trata de comunidades indígenas e minorias étnicas, considerou o acordo inconstitucional. Ontem também ficou decidido que dois procuradores do Distrito Federal vão entrar com ação judicial para tentar anular a portaria do ministro.
A notícia da decisão de Bastos -vista pelos procuradores como um "precedente perigoso", que pode dar margem ao agravamento de conflitos em diversas áreas no país- provocou reação imediata do procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, que manteve reunião em Brasília com o procurador no Pará Nilo Marcelo de Almeida Camargo.
Camargo havia afiançado o acordo assinado entre fazendeiros, índios, Prefeitura de Novo Progresso e Funai (Fundação Nacional do Índio), pelo qual os produtores pagariam R$ 120 mil anuais, ao longo de dez anos, à prefeitura, que prometeu repassar o dinheiro aos índios na forma de "benfeitorias". O procurador, que está há três meses na função, foi chamado para que explicasse a Fonteles e aos integrantes da 6ª Câmara as razões pelas quais aceitou intermediar e fechar o acordo.
"A decisão [ministerial] é muito grave. Ele [governo] disse que é um caso específico, mas é lógico que poderá haver repercussão em outras áreas", disse a coordenadora da 6ª Câmara, Ela Wiecko.
"Nós não podemos admitir isso [o acordo]. É incompatível com a proteção dada às terras indígenas pela Constituição", afirmou.
A procuradora da 6ª Câmara Deborah Duprat também vê "risco enorme de [o caso de Baú] servir de exemplo" para outras situações de conflito. "A questão dos limites das terras indígenas é definida antropologicamente, não por critérios de conveniência ou oportunidade", disse Duprat.
Camargo foi procurado pela Folha para comentar o assunto, mas não foi localizado ontem e anteontem. A reportagem apurou que ele argumentou, na reunião em Brasília, que a situação na área Baú era de conflito iminente entre fazendeiros e índios, e alguma decisão precisava ser tomada. Ele teria dito ainda que era sua obrigação "dar uma resposta" aos pedidos das partes.
A presidência da Funai divulgou ontem uma nota pela qual afirma que a decisão de Bastos "contribui para consolidar a área de 14 milhões de hectares do território caiapó", colocando na conta todas as áreas caiapós ou de subgrupos caiapós do Pará e de Mato Grosso, demarcadas ao longo de mais de 30 anos.
Segundo a Funai, o acordo assinado na área Baú tinha "como objetivos principais o estabelecimento da fronteira do território e a proteção do rio Curuá".
O rio Curuá já fazia parte da área indígena descrita na portaria original, do ministro Renan Calheiros, publicada em 1998, e na portaria de 1991, do ministro Jarbas Passarinho, que reconheceu Baú como território indígena.
A assessoria de imprensa do ministro Bastos informou que ontem ele estava na Argentina e não poderia ser localizado para comentar a decisão dos procuradores federais.

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