São Paulo, Domingo, 18 de Abril de 1999
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JANIO DE FREITAS

Os destruidores em ação


Seja qual for a natureza do interesse que comprometeu Francisco Lopes, quando presidente do Banco Central, com a "ajuda" governamental ao banqueiro Salvatore Cacciola, o que se comprova nesse episódio vai muito além de um escândalo circunscrito. É a entrega da economia e das finanças do país à prepotência suspeita de uma turma de economistas-tecnocratas, para os quais não há limitações éticas nem legais. São os sucedâneos dos coronéis e generais da linha-dura nos tempos ditatoriais.
O comportamento de Francisco Lopes no Banco Central vem a ser outra amostra da liberdade de manipulação do processo privatizador, como no caso grampeado das telefônicas, ou de esbanjamento de fabulosos R$ 21 bilhões na suposta prevenção de crise bancária, sem qualquer regra estabelecida para isso, senão apenas pela vontade ou interesse de um grupinho sempre avesso às discussões públicas. E ao próprio público, no sentido de povo.
Mesmo no episódio dos dólares baratinhos que foram do Banco Central para as contas externas do dono do Banco Marka, foi uma parte da turma de economistas-tecnocratas que decidiu contra os cofres públicos. Francisco Lopes coordenou-se com Salvatore Cacciola, advertiu-o para amansar a divergência de Cláudio Mauch, também diretor do Banco Central. Mas foi a turminha da direção do BC que combinou entre si e mandou vender a Cacciola dólares do Banco Central a preços mais baixos que os do mercado.
O poder concedido a esses economistas-tecnocratas, desprovidos de ética e de sujeição à lei, é a essência do tipo de governo iniciado com Fernando Henrique Cardoso. Nele, o presidente se incumbe das encenações do protocolo, da política e da propaganda, mas as decisões já lhe chegam prontas, ditadas pelos economistas-tecnocratas. É isso que explica a exótica inexistência de despachos administrativos de rotina, entre o presidente e cada ministro. De tempos em tempos, fazem uma grande reunião ministerial, que nada tem a ver com governar, é só para efeitos publicitários.
Nesse tipo de governo sem presidente-governante, são apenas lógicos os espetáculos do presidente-publicitário louvando, hoje, o que ontem assegurava ser um ato impatriótico que seu governo jamais cometeria. Por exemplo, a desvalorização do real, como lembrou nesta semana um agudo editorial da Folha. Mas se explica: o presidente-propagandista diz o que os economistas-tecnocratas estabelecem; logo, se há mudança nesse grupinho, muda o que deve ser dito. E ao propagandista só cabe propagandeá-lo.
Felizes os que não privaram, nem um pouco, com essa espécie proliferante que é o economista-tecnocrata. Um ser inculto e, portanto, suficiente; ambicioso como só um certo sociólogo alcança ser; fascinado pela riqueza alheia e pela caça indiscriminada à própria. Prepotente como requer a ignorância bem situada -que o digam os seus predecessores fardados da ditadura-, odeia a reflexão, apegado a umas poucas fórmulas que supõe científicas. Felizes os que não privaram com essa espécie, porque assim não sabem quem e como está destruindo o Brasil, um país agora quebrado.


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