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REGIME MILITAR
Cópias de documentos indicam que órgãos de segurança trocaram presos e informações nos anos 70 e 80
Papéis ligam Brasil à Operação Condor
LUIZA DAMÉ
WILLIAM FRANÇA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara recebeu ontem 101
páginas de cópias de documentos,
que indicam a participação brasileira na articulação e na troca de
informações entre os serviços de
inteligência com os demais países
do Cone Sul durante os regimes
militares nos anos 70 e 80.
A comissão encaminhará hoje
ao presidente Fernando Henrique
Cardoso pedido para que ele determine a abertura dos arquivos
militares e dos órgãos de informação, a fim de que sejam conhecidos documentos sobre prisões,
cárceres, mortes e ocultação de
cadáveres ocorridos no período.
A proposta é a primeira decisão
tomada após a audiência pública
realizada ontem para apurar indícios da existência, no Brasil, da
Operação Condor, a articulação
entre os serviços de informação
dos países do Cone Sul (Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai) voltada para reprimir ações
contrárias aos regimes vigentes.
Os nomes "Brasil" ou "governo
brasileiro" vinculados à Operação
Condor não aparecem formalmente em nenhum dos documentos apresentados ontem.
Ontem foram ouvidas três pessoas envolvidas direta ou indiretamente com a Operação Condor:
o jornalista Nilson Mariano, autor
do livro "Operación Cóndor"; o
presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de Porto
Alegre, Jair Krischke; e Victória
Grabois, diretora do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio.
Os três foram unânimes em
apontar indícios da participação
brasileira na Operação Condor.
Krischke entregou à comissão várias cópias de documentos que citam, por exemplo, a troca de informações entre a 6ª Divisão do
Exército, em Porto Alegre, e os
governos uruguaio e argentino.
Há entre as cópias relatório que
teria sido preparado pelo ex-presidente João Baptista Figueiredo,
na época (1965) coronel do Exército, ao embaixador paraguaio
Raul Peña, sobre a articulação de
paraguaios no Mato Grosso contra o governo do presidente Alfredo Stroessner.
Há também relatos sobre a
"subversão" no Brasil, recolhidos
entre as mais de duas toneladas de
documentos que foram localizadas no Paraguai em 1992, o chamado "Arquivo do Terror".
Cobrança a FHC
Na Câmara, Victória e Krischke
cobraram de FHC um comportamento "mais democrático e mais
responsável" com as famílias dos
mortos e desaparecidos.
"Está na hora de o governo Fernando Henrique ter a coragem de
abrir os arquivos, pois sabemos
que eles ainda existem. Eles (órgãos de repressão) não foram
burros ou idiotas de destruí-los.
Nós, familiares, precisamos saber
quem matou, onde matou, como
matou e por que matou. É uma
questão de humanidade", disse
Victória em seu depoimento.
Krischke cobrou de Fernando
Henrique Cardoso, "que se diz
um democrata identificado com a
esquerda", decisões mais firmes
diante das Forças Armadas, da
qual é o comandante supremo.
Ele citou o caso do presidente
uruguaio Jorge Battle, que em menos de quatro meses de governo
demitiu o comandante do Estado-Maior da Defesa que havia
discordado de decisão sua para
identificar uma sobrevivente da
repressão argentina no Uruguai.
"Nós não queremos que os arquivos sejam abertos apenas para
responder ao juiz argentino, mas
para qualquer interessado", afirmou o deputado federal Marcos
Rolim (PT-RS), presidente da comissão. "Não há chance de o governo abrir os arquivos se não
houver pressão da Câmara e da
sociedade."
O juiz argentino Cláudio Bonadio encaminhou à Justiça brasileira questionário sobre a participação brasileira na Operação Condor. Ele investiga o desaparecimento de três argentinos no país,
supostas vítimas do esquema.
O governo brasileiro acatou o
pedido e está preparando as respostas.
Victória Grabois reclamou ainda do pouco caso dos deputados
com o assunto. A sessão, que durou cerca de duas horas, contou
com a presença de 13 deputados
federais, dos quais apenas cinco
permaneceram todo o tempo dos
depoimentos. Além disso, ouviram os depoimentos representantes das embaixadas do Uruguai e
do Chile.
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