São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 2006

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JANIO DE FREITAS

Antes do estopim

Não só a soldadesca é despreparada; também a oficialidade, precipitando blindados pelas ruas

DESDE O COMEÇO da década de 90 discute-se a inclusão do Exército nas ações repressoras de tumultos urbanos criminosos. Discussão até agora inútil. E, pior, sem sinal promissor de progresso, por pequeno que seja.
Era em intervenções de sentido político que os militares pensavam quando, durante a Constituinte, pressionaram para que a atribuição constitucional das Forças Armadas fosse a da "segurança externa e interna", e não só a primeira, como é próprio dos países civilizados e constava do projeto original da Constituição. Já por aquela motivação se explicaria a resistência do Exército, em numerosas ocasiões, a participar de ações pela ordem pública. A primeira experiência de participação no Rio comprovou que havia mais motivos. E, portanto, que os refratários à idéia, fossem militares ou civis, tinham razão. Embora a diferença de seus argumentos.
Não só a soldadesca é despreparada. Também a oficialidade, logo precipitando blindados e artilharia pelas ruas e diante de favelas, mostrou total incompreensão tanto da natureza da desordem como do modo de prestar colaboração real para solucioná-la. O espetáculo, em suas três ou quatro representações idênticas, não resultou favorável ao Exército nem à cidade. Mas, pelo que se viu de tanques à procura de um punhado de fuzis há pouco roubados, não serviu de ensinamento algum.
O que não quer dizer que as Forças Armadas não tenham contribuições a dar. E que não as estejam de- vendo. A questão é quais e como devam ser. Ao menos para suscitar tal debate os tumultos de São Paulo deveriam servir, se formos capazes de entendê-los pelo que têm de mais profundo: são prenúncios de outros episódios perigosos, assim como foram precedidos de ocorrências que a irresponsabilidade imaginou restritos ao Rio, e não como decorrências parciais de uma realidade nacional que só depende de um estopim.

Sem resposta
As mortes de civis libaneses ultrapassaram as 200, pelo noticiário preliminar de ontem à tarde sobre os efeitos dos ataques israelenses ao Líbano. Ocasião em que o primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, incluiu interessante concepção em um discurso: "O governo do Líbano é contra [o Hizbollah] mas é o responsável [pelo seqüestro de dois soldados israelenses pelo Hizbollah, causa alegada dos bombardeios israelenses que arrasam o Líbano]". Com a conclusão serena: "Os ataques vão continuar até que os soldados sejam devolvidos".
Uma questão que não sei se ainda tem algum sentido humano ou já se trata só de aritmética: a quantos libaneses equivalerá um soldado a serviço do extremismo belicista que se impõe em Israel?


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