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São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 2003

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Em depoimento à CPI da Pirataria, Norma Cunha tenta envolver diretor da PF com suspeitos de venda de sentenças

Ex- auditora reconhece ter sonegado renda

Roberto Stuckert Filho/Agência "O Globo"
A ex-auditora Norma Cunha chega para depor para a CPI da Pirataria, na Câmara dos Deputados


ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A auditora fiscal aposentada Norma Regina Emílio Cunha tentou justificar parte dos US$ 550 mil e dois quilos de ouro encontrados pela Polícia Federal em sua casa dizendo que foi dona de um garimpo cujo rendimento nunca declarou. Também colocou o atual diretor da PF, Paulo Lacerda, no rol de policiais que frequentavam sua casa e o gabinete do ex-marido, o juiz João Carlos da Rocha Mattos.
Segundo o Ministério Público, o juiz seria o mentor de uma suposta quadrilha que extorquia dinheiro, traficava influência e vendia sentenças judiciais. A suposta atuação do grupo é investigada pela Operação Anaconda. Rocha Mattos e sua ex-mulher estão presos por conta dessa denúncia.
As afirmações de Norma foram feitas a deputados, como testemunha da CPI da Pirataria. O garimpo, em Cuiabá (MT), teria lhe dado ""muito dinheiro".
Lacerda disse que nunca foi à casa de Norma, que fica em São Paulo. Mas confirmou que esteve algumas vezes no gabinete de Rocha Mattos. O propósito da visita seria tratar de assuntos relativos a algumas CPIs que assessorou.
"Não há nenhum ilícito nesses encontros. O juiz João Carlos sempre foi crítico da corrupção do Judiciário", afirmou Lacerda.
O diretor-geral da PF afirmou que a última ocasião em que esteve no gabinete do juiz foi em 2001, para pedir ao magistrado que determinasse a condução coercitiva do empresário Ari Natalino da Silva -acusado de adulterar combustíveis- para depor na CPI do Roubo de Carga.

Recuo
A maior parte das perguntas feitas pelos deputados foi sobre diálogos gravados pela PF e pela própria depoente. Em algumas conversas, ela faz referência a "dinheiro de corrupção" e afirma que seu ex-marido roubava.
Ao depor, no entanto, recuou das acusações. Tratou o conteúdo dos diálogos como um "conjunto de insinuações", "tentativas [que fazia] para tentar" se "proteger".
"Passei muito tempo de minha vida investigando, porque queria me vingar dele. Mas não consegui nada", declarou a auditora aposentada da Receita Federal.
Ela também não soube explicar a razão, conforme levantamento da CPI, de sua movimentação bancária ter saltado de R$ 156 mil, em 1998, para R$ 872 mil em 1999.
"A quebra de sigilo fiscal mostra que ela tem movimentação incompatível com seus rendimentos. Não explicou nada, o que nos leva a crer que ela sabe mais do que disse", disse a deputada Vanessa Grazziotin (PC do B-AM).
Diante das perguntas sobre supostos amigos de seu ex-marido, Norma afirmou desconhecer se Rocha Mattos tinha relações de amizade com o chinês Law Kim Chong, acusado de ser um dos maiores contrabandistas do país.
O presidente da CPI, Luiz Antonio de Medeiros (PL-SP), afirmou que a depoente estava tentando defender Chong e a chamou de "mafiosa". Diante da acusação, Norma invocou seu direito de permanecer em silêncio.
O mesmo direito foi acionado quando Julio Lopes (PP-RJ) indagou-a sobre as fitas gravadas pela PF na investigação do assassinato do prefeito de Santo André Celso Daniel, em janeiro de 2002.
Lopes perguntou ainda se ela não responderia para não se incriminar, um direito que tem por lei, ou se temia pela sua segurança. "Eu me sinto em risco", declarou.
Ao ser preso, Rocha Mattos, juiz que determinou a destruição das fitas que teriam sido gravadas em um procedimento da PF considerado ilegal, afirmou que guardara cópia das gravações na casa de sua ex-mulher e que as fitas estariam em poder da Operação Anaconda. A PF nega, e deputados ouvidos pela Folha acreditam que ela tentou corroborar a suspeita levantada pelo ex-marido.
"O depoimento foi uma farsa. Ela mentiu o tempo todo", declarou o deputado Medeiros.


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