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Juiz absolveu doleiro que elogia em gravações
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O doleiro uruguaio Najun Turner, elogiado pelo juiz federal da
4ª Vara Criminal de São Paulo,
João Carlos da Rocha Mattos, em
gravação telefônica apreendida
pela Operação Anaconda, foi absolvido pelo mesmo juiz, há três
anos, em processo que o acusava
de crime contra o sistema financeiro. Um bilhete e declarações da
ex-mulher do juiz Norma Regina
Emílio Cunha também indicam
que Turner convidou um filho de
Mattos para passeio.
Uma cópia da sentença de Rocha Mattos que beneficiou Turner, datada de maio de 2000, foi
encontrada pela Polícia Federal
no escritório do empresário Wagner Rocha, no centro de São Paulo. O juiz e Rocha estão presos na
Polícia Federal sob acusação de
integrar uma quadrilha com ramificação na Justiça federal.
No processo que tramitou sob
responsabilidade de Rocha Mattos, Turner é acusado de realizar
"inúmeras operações" irregulares
nos mercados financeiro e de capitais entre julho de 1982 e janeiro
de 1989, segundo a denúncia oferecida por três procuradores da
República em 1996.
O doleiro ganhou notoriedade
ao participar de uma tentativa de
salvar o mandato do ex-presidente Fernando Collor de Mello,
ameaçado de impeachment em
1992, a Operação Uruguai.
Os elogios a Turner feitos pelo
juiz aparecem numa conversa telefônica gravada pela ex-mulher
de Rocha Mattos. "Eu acho que
ele é uma boa pessoa e que merece
confiança", disse o juiz, ao ser
perguntado por Norma se podia
confiar no doleiro, que vinha se
oferecendo para levar o filho do
casal para ver um jogo de basquete e ter aulas de esgrima com uma
filha dele no Clube Paulistano.
Na mesma conversa, Rocha
Mattos faz uma referência truncada sobre Turner: "Ele é uma boa
pessoa. Eu acho que ele já provou,
até pelas coisas que ele assumiu
que ele não fez. Você sabe, né, não
precisa entrar em detalhes".
Em outro trecho da conversa, o
magistrado comenta sobre uma
"ajuda" específica do doleiro: "Ele
tentou ajudar, indicou aquele médico lá. Eu acho que ele é uma boa
pessoa, sim".
O juiz ainda fez um comentário
em código: "Você sabe que não
existe mais, não funciona, aquela,
aquela movimentação... Então
não existe mais nada, entendeu?".
Um bilhete, encontrado também na casa de Norma pela Polícia Federal e assinado por "Najun", confirma que houve convite
para um passeio com um filho de
13 anos do casal.
No processo em que foi absolvido por Rocha Mattos, Turner fora
acusado de infringir três artigos
da lei que regula o sistema financeiro. Para inocentá-lo, o juiz acolheu um argumento da defesa, o
de que o uruguaio era "operador
autônomo" no mercado financeiro e, assim, "não pode ser equiparado a instituição financeira".
Segundo Rocha Mattos, "não
tendo atuado como instituição financeira, mas sim como agente
autônomo de investimentos, não
era o acusado obrigado a manter a
escrituração e contabilização da
movimentação de recursos financeiros ou valores exigida pela legislação de uma instituição financeira propriamente dita".
O juiz chegou a sugerir o possível crime que Turner teria cometido, o de sonegação fiscal, mas
concluiu: "Esta imputação também não consta da denúncia".
Ao analisar o processo, Rocha
Mattos escreveu que Turner, pelas certidões e documentos reunidos pelo Ministério Público em
sete páginas, "com vários registros de inquéritos e de algumas
ações penais", era possuidor de
"maus antecedentes". Isso não
impediu o magistrado de frisar,
na sentença, que os documentos
"atestam ser o réu primário".
Turner também foi condenado,
em 2000, a três anos de prisão sob
acusação de contrabando de ouro. A pena prescreveu e ele não
chegou a ser preso.
Entre os documentos achados
no escritório de Wagner Rocha
também aparece um processo judicial que tramitou na mesma 4ª
Vara Criminal Federal no qual é
réu outro doleiro ligado a Rocha
Mattos, Sandor Paes de Figueiredo, dono da casa de cambio paulistana Suntur.
Figueiredo tinha estreito relacionamento com o casal Rocha
Mattos, a ponto de ser convocado
como testemunha de Norma Cunha numa medida judicial que
acompanha o processo de divórcio do casal. Norma queria, com o
depoimento do doleiro e de mais
duas pessoas -entre as quais o
agente da Polícia Federal César
Herman Rodriguez, também preso pela Operação Anaconda-,
comprovar o relacionamento
conjugal com o juiz.
Testemunhas nesse tipo de processo normalmente frequentam a
intimidade do casal.
Procurados pela Folha desde a
semana passada, Turner e Figueiredo não foram localizados.
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