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São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 2003

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PREVIDÊNCIA

De 19 nações pesquisadas, maioria tem plano especial de aposentadoria

Militar recebe mais em país que sofreu regime de exceção

LILIAN CHRISTOFOLETTI
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

O Ministério da Defesa preparou um estudo em 19 países para mostrar que, na grande maioria deles, as Forças Armadas têm um regime especial de Previdência. O que o ministério não destacou é que as melhores aposentadorias estão concentradas nos países que tiveram governos militares. Naqueles com longa tradição democrática, a tendência é a de o militar entrar para a reserva ganhando menos do que na ativa.
Essa pesquisa foi apresentada a vários ministros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para reforçar a tese de que os militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica não podem ser incluídos na reforma da Previdência -que prevê um regime único de aposentadoria para todos os servidores e trabalhadores da iniciativa privada.
De todas as nações estudadas, em apenas uma os militares não têm um regime de aposentadoria especial -a exceção é a Noruega, que tem sistema único e considerado eficaz. Em dois países (China e Coréia do Sul), os dados apresentados são incompletos. Por isso, a Folha optou por trabalhar com o resultado de 17 países.
Pelo mapa da Previdência, os países em que os militares se aposentam com o último salário da ativa, como no Brasil, são: Chile, Paraguai, Argentina, Uruguai, Peru, Portugal, Espanha e Venezuela. Em muitos casos, o militar recebe "prêmios" quando entra para a reserva. No Chile, por exemplo, são 24 salários. No Peru, cerca de US$ 30 mil.
O único desses países que não passou por um governo de exceção é a Venezuela, apesar de o atual presidente, Hugo Chávez, ser coronel reformado. Em compensação, a contribuição dos militares sobre o salário é de 11,5% -no Brasil, é de 7,5%.
Os dois países europeus, Espanha e Portugal, conviveram com um regime militar até 1975 e 1974, respectivamente. Os espanhóis, com o general Francisco Franco, e Portugal, com Antônio de Oliveira Salazar. Os demais países da América Latina enfrentaram, quase concomitantemente, os regimes militares.
"Paraguai, Argentina, Chile e Peru são altamente hierarquizados, com castas militares. São sociedades com grandes desigualdades sociais e, nesse cenário, os militares foram mais beneficiados", afirmou Maria Celina D'Araújo, cientista política e historiadora da FGV (Fundação Getúlio Vargas) do Rio.
No Peru, por exemplo, o regime é considerado menos conservador. Deu início, por exemplo, à reforma agrária. Porém as Forças Armadas gozam de uma tradição muito forte. "É uma instituição de brancos em um país de índios", disse Maria Celina.
No Chile, os militares têm muita influência política e poder constitucional. Os comandantes, quando se aposentam, tornam-se senadores vitalícios. Foi o que ocorreu, por exemplo, com o general Augusto Pinochet, que governou o país de 1973 a 1990.
No Paraguai do general Alfredo Stroessner (1954-1989), os militares eram automaticamente filiados ao partido militarizado, o Colina, e não pagavam impostos.
Nos países com longa tradição democrática, os militares vão para a reserva recebendo menos do que ganhavam na ativa. Nos Estados Unidos, na Alemanha e no Reino Unido eles recebem 75% do último salário. Na França, a relação entre os vencimentos da reserva e da ativa é de 60%.
"O militar vai para a reserva ganhando menos, mas ele tem muitos benefícios sociais", disse a historiadora. Também paga menos aos militares a Colômbia, que nunca teve regime militar.
A Bolívia é a exceção no grupo dos "democráticos". "Os bolivianos tiveram regime militar, mas as Forças Armadas perderam prestígio, perderam terras e perderam todas as guerras em que se envolveram nos anos 50", disse Maria Celina.



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