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São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003

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VIAGEM À AMÉRICA

Presidente quer atrair investimentos de fundos de pensão dos EUA

Sem citar os EUA, Lula volta a atacar "anexação" comercial

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ASSUNÇÃO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a usar a palavra "anexação", associada a acordos comerciais, a apenas 36 horas de reunir-se em Washington com seu colega George Walker Bush.
Na campanha eleitoral, Lula havia dito que a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) não era um mero acordo comercial, mas um processo de "anexação" da América Latina pelos EUA.
Ontem, na entrevista de encerramento da cúpula do Mercosul, um jornalista paraguaio perguntou, depois de citar a União Européia, se o Brasil pretendia "aumentar a ajuda econômica a Uruguai e Paraguai", os países mais pobres do bloco do Sul.
Lula respondeu que "o processo de integração da União Européia é o que teve mais sucesso, em primeiro lugar porque não houve um processo de anexação. Os países pobres receberam ajuda para seu desenvolvimento".
A inferência lógica é a de que, se não há na Alca mecanismo similar, a idéia de "anexação" vale para o bloco que se pretende construir entre os 34 países americanos, excluída apenas Cuba.
De todo modo, a Folha perguntou a Lula se o raciocínio era válido, quando ele deixava o salão em que se realizara a entrevista.
"Faz tempo que nós reivindicamos...", começou dizendo o presidente, para depois ser praticamente arrastado para fora do salão por uma nuvem de seguranças e jornalistas, sem tempo ou condições de completar a resposta.
Parece uma referência à proposta insistente do hoje senador Aloizio Mercadante, então secretário de Relações Internacionais do PT, para que a Alca incluísse um mecanismo de fundos estruturais, iguais aos da União Européia, para diminuir a brecha entre países ricos e pobres.
Na Alca, aliás, a diferença entre países como Bolívia e Estados Unidos, por exemplo, é bem maior do que a que há na Europa, entre Alemanha e Grécia.
De todo modo, o tema Alca não será o principal da conversa entre Lula e Bush. Fará parte dela, mas o essencial já foi discutido no nível ministerial. Ficou assim: do ponto de vista brasileiro, ou se reduz a ambição da agenda Alca ou se aumenta o prazo para implementá-lo (fixado em 2005, se seguido o calendário original).
"Estamos mais próximos da redução da agenda", avalia o chanceler Celso Amorim.
Por isso, sempre do ponto de vista brasileiro, a viagem de Lula terá como ponto forte a reivindicação de financiamentos norte-americanos para o processo de integração física da América do Sul, uma das prioridades do governo.
Ontem, aliás, na mesma entrevista em que mencionou a "anexação", Lula disse que a integração sul-americana não pode ficar limitada "ao discurso sentimental", mas tem que passar pela integração física.
Emendou, falando sobre seu encontro com Bush: "Eu não perderia a oportunidade de, estando no país mais rico do planeta, dizer o quanto é importante que possa ajudar nesse processo".
Também o encontro com os líderes da central sindical AFL-CIO estará muito longe de ser "sentimental", entre um ex-metalúrgico e dirigente sindical e seus antigos colegas. A idéia é explorar a possibilidade de os fundos de pensão vinculados à AFL-CIO investirem pesadamente no Brasil.
"Nada mais natural, em se tratando de uma central sindical e de um governo do Partido dos Trabalhadores", torce o ministro Celso Amorim. O chanceler acha que o encontro com Bush, típica reunião Norte/Sul, complementa perfeitamente a nova ênfase da diplomacia brasileira no relacionamento Sul/Sul.
"O relacionamento com os países do Sul é bom por si mesmo e ainda tem como subproduto o fato de que, quanto mais fizermos no Sul, mais vamos receber do Norte", calcula o chanceler.
É uma alusão ao fato de que, podendo aliar-se a países grandes mas isolados do Sul, como Índia, China e África do Sul, mais forte se torna em tese a voz do Brasil.
"Se nós nos juntarmos, será mais fácil resolver nossos problemas junto a outros países", reforça o presidente.


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