São Paulo, domingo, 19 de julho de 1998

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Para Peter Mandelson, governo deve equilibrar esforço administrativo com a divulgação de suas realizações
Conselheiro de Blair visita FHC amanhã

de Londres

O governo brasileiro, como o de qualquer país, deve sempre buscar um equilíbrio entre o trabalho diário de administrar a nação e um esforço coordenado de divulgação das suas realizações.
O conselho é de Peter Mandelson, um dos principais estrategistas da bem-sucedida campanha eleitoral do Partido Trabalhista britânico no ano passado.
Ministro sem pasta do governo do premiê Tony Blair -cargo que reúne as funções de um chefe da Casa Civil e um secretário de Comunicações-, Mandelson chega ao Brasil amanhã.
Ele atende a um convite feito pelo próprio Fernando Henrique Cardoso em sua visita ao Reino Unido, em dezembro passado.
Considerado um dos políticos mais influentes do governo trabalhista, Mandelson tem um jantar marcado com Fernando Henrique, amanhã, no Palácio do Alvorada. Ele também se reunirá com os secretários de Comunicação, Sérgio Amaral, e de Assuntos Estratégicos, Ronaldo Sardenberg.
(ISABEL VERSIANI)

Folha - O que o senhor espera da visita ao Brasil?
Peter Mandelson -
Estreitar ainda mais o relacionamento entre os dois governos e os dois países, com a promoção de comércio.
O Brasil, com uma economia em expansão e uma política estável, está se tornando um dos mercados mais importantes para o Reino Unido. As visitas entre os dois países têm sido cada vez mais frequentes, e eu estou satisfeito em contribuir nesse processo.
Folha - O presidente Fernando Henrique Cardoso é candidato à reeleição. Considerando que o senhor foi um dos principais arquitetos da campanha de Blair, pode-se esperar que assunto vá ser discutido durante a visita?
Mandelson -
Eu não acho que nós vamos discutir isso, porque eu não sou "expert" na política doméstica de campanha no Brasil. Mas há uma similaridade de idéias e de abordagem entre o presidente Cardoso e o primeiro-ministro Blair, e isso criou uma amizade muito forte entre os dois líderes e aproximou os dois países. Eu acho que minha visita reflete isso.
Folha - O senhor considera que Tony Blair e Fernando Henrique podem preencher a chamada terceira via (na teoria, uma espécie de caminho político alternativo entre o liberalismo total e o protecionismo estatal)?
Mandelson -
Há um novo consenso internacional entre vários governantes, incluindo o presidente Cardoso e Tony Blair, de que nós precisamos de uma nova via, que combine o dinamismo econômico e a justiça social.
No passado, pessoas da direita, como Thatcher (Margaret Thatcher, ex-premiê conservadora britânica), defenderam muitas reformas necessárias. No entanto, colocaram toda a ênfase nos mercados e ligaram muito pouco para a inclusão social e a unidade da nação.
Ela argumentava que você não podia ter ao mesmo tempo eficiência e complacência, que você tinha que escolher.
Nós rejeitamos isso. Nós achamos que você pode ter competência e eficiência e também ter políticas que se importam com as pessoas, que criam justiça e oportunidades para todo mundo ter um lugar na sociedade.
Isso, se você quiser, é a terceira via. Não o dogma da direita, do livre mercado, mas também não os estilos e as idéias antigas da esquerda tradicional, que acreditava em gastos altos, taxação alta, no Estado atuando como empresa e governo centralizado.
Folha - O senhor é considerado muito habilidoso no trato com a mídia e no trabalho de divulgar para o público as realizações positivas do governo. Que conselhos o senhor poderia dar para um governo como o de FHC?
Mandelson -
Em todos os países e governos você se torna tão absorvido pela administração diária e pelo trabalho do seu departamento, que muitas vezes você perde de vista o quadro geral e a necessidade constante de se comunicar direto com o eleitorado.
A mídia não tem mais nada a fazer a não ser reportar as más notícias. Quer dizer, esse é o seu trabalho, não estou fazendo uma crítica. Se os ministros passassem todo o seu tempo lidando com a mídia, eles teriam pouco tempo de sobra para administrar o país. Então você tem que achar um equilíbrio.
Os ministros devem ter equipes apropriadas e bem treinadas para lidar com essas demandas e dar uma direção para que essas equipes possam responder às demandas. Você precisa do pessoal, da organização, o pessoal tem que ser profissional, deve receber bem.
Os que lidam com a mídia devem sempre ter em mente que eles são menos importantes do que os próprios ministros mas, ao mesmo tempo, é preciso haver um trabalho de equipe.
Folha - Na opinião do senhor, que papel o Brasil pode desempenhar no cenário mundial?
Mandelson -
O presidente Cardoso é um homem de enorme prestígio internacional, um homem de considerável carisma. Eu acredito que, com seu apelo pessoal, ele está elevando o status do Brasil internacionalmente.
Ele está fazendo a voz do país ser ouvida com as relações pessoais que ele está construindo, o que é importante.
Folha - Fernando Henrique pode não ser reeleito. Até que ponto a imagem internacional do Brasil depende da sua figura?
Mandelson -
O prestígio internacional de Cardoso ajuda o Brasil, mas a força principal do país vem da estabilidade de sua política, da força de sua sociedade, da cultura e do crescimento de sua economia. Isso é o que está fazendo do Brasil um país no qual se deve prestar atenção.
Folha - O senhor foi uma figura importante no trabalho de reformulação do Partido Trabalhista. Como foi esse processo e quais as principais dificuldades?
Mandelson -
Se nós quiséssemos ser eleitos, precisávamos repensar completamente nossas políticas, organização e até nossa constituição como partido. Tínhamos que nos modernizar, nos fazer relevantes para o país de novo, criar uma coalizão de apoio ampla.
A resistência a essa modernização veio primeiro de gente de dentro do nosso próprio partido, que preferia se ater às velhas maneiras de fazer as coisas, às velhas idéias.
Depois, é claro, nós tivemos a intervenção pouco útil de nossos oponentes e também de parte da mídia. Mas nós vencemos os obstáculos e as resistências que foram colocados no nosso caminho.
Folha - Nesse processo, o partido não se afastou dos sindicatos, seu eleitorado tradicional?
Mandelson -
Eu acho que sim. Nós não cortamos os nosso laços com os sindicatos, mas estamos menos dependentes deles.



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