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HERANÇA MILITAR
PF acha documentos de outros órgãos queimados na Base Aérea
Arquivos do Dops e do SNI foram "plantados" na Bahia
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Peritos da Polícia Federal informaram ao governo que os documentos referentes à ditadura militar (1964-1985) encontrados em
Salvador não estavam arquivados
na Base Aérea, onde foram parcialmente queimados. Conforme
a PF comunicou aos ministérios
da Justiça e da Defesa e ao Comando da Aeronáutica, os papéis
foram trazidos de fora e introduzidos na Base Aérea, não se sabe
ainda por quem.
A Folha obteve cópias de parte
dos papéis oficiais que escaparam
do fogo. São documentos com carimbos de "secreto" e "confidencial" de diferentes órgãos do governo, inclusive da própria base.
Há papéis dos órgãos de inteligência da Aeronáutica, da Marinha e do Exército e também dos
antigos Dops (Departamento de
Ordem Política e Social) e SNI
(Serviço Nacional de Informações). A partir da Bahia, eles controlavam outros Estados do Nordeste. Daí haver, no meio da papelada, relatórios das secretarias
de segurança estaduais.
Os alvos eram movimentos estudantis e feministas, partidos à
época clandestinos e órgãos internacionais de difusão do comunismo. Foram encontrados, ainda,
documentos com "lições" sobre
grupos e ações terroristas, como
seqüestro e explosões de aviões.
Há prontuários posteriores ao
fim da ditadura militar. Um é da
Aeronáutica, de número 17.235,
de 7 de maio de 1991, sobre um
militante do Partido Comunista
do Brasil. O presidente era Fernando Collor de Mello, primeiro
presidente civil eleito por voto direto depois da abertura política.
Outro documento foi produzido pelo Comando do Segundo
Distrito Naval, da Marinha, no dia
30 de maio de 1989 -ano da eleição de Collor, no governo José
Sarney. É sobre o discurso do vereador do PSB de Sergipe Marcélio Bonfim Rocha, que chegara de
uma viagem a Cuba e elogiava a
ilha de Fidel Castro.
Comparação
A conclusão dos peritos da PF
de que os documentos eram de
fora e foram introduzidos na Base
Aérea foi tirada principalmente
do confronto entre os papéis que
foram salvos do incêndio com outros dos arquivos da própria Base,
que está sendo vistoriada.
Os peritos também relataram
que, na vistoria, não foi encontrado nenhum local que pudesse ter
abrigado os documentos e depois
esvaziado recentemente sem deixar vestígios. Não há, por exemplo, salas, estantes, caixas ou arquivos de aço vazios, como se tivessem sido limpos pouco antes.
A PF, que auxilia o IPM (Inquérito Policial Militar) sobre o caso,
está fazendo também a comparação entre os documentos parcialmente queimados e os que foram
encontrados intactos depois, a 70
metros deles, num saco plástico.
A informação repassada pela PF
a escalões superiores foi recebida
com alívio, especialmente no Comando da Aeronáutica, porque as
suspeitas mais fortes desde o início do caso -com a divulgação
pela Rede Globo da destruição
dos papéis, no domingo passado- são as de queima de arquivo
comprometedor pelos próprios
oficiais da base.
Em entrevista publicada pela
Folha na quarta-feira passada, o
comandante, brigadeiro-do-ar
Luiz Carlos Bueno, admitiu a possibilidade de os documentos estarem com militares da reserva da
FAB (Força Aérea Brasileira), e
não com oficiais da ativa.
Com a informação da PF de que
os documentos foram provavelmente introduzidos na Base Aérea, porém, os oficiais que ali servem ainda continuam sob suspeita. Não há, até agora, nenhum indício de quem, nem por que, teria
levado os documentos para serem
queimados numa sede militar.
Mas não está descartada a hipótese de os autores terem sido ajudados por pessoas da própria base.
O "Diário Oficial" da União publica amanhã portaria do comandante Bueno indicando o tenente-brigadeiro-do-ar José Carlos Pereira para coordenar o "exame
dos arquivos do Sistema de Inteligência da Aeronáutica (Sintaer)
referentes ao período de 1964 a
1985, com intuito de identificar a
documentação ali existente".
Pereira é comandante-geral do
Ar, segundo posto na hierarquia
da Aeronáutica, e, na portaria, o
comandante estabelece que, para
os militares envolvidos no exame
dos documentos, os trabalhos de
coordenação "têm precedência
sobre as demais atividades".
Documentos
Em ofício de 30 de novembro,
Bueno requisitou a todas as unidades os documentos sobre a
época do regime militar.
Na semana passada, a nova Comissão de Averiguação e Análise
de Informações Sigilosas, que
reúne sete ministros, inclusive o
da Defesa, José Alencar, tomou
decisão mais abrangente: os documentos, sejam de órgãos civis
ou militares, deverão ser concentrados na Casa Civil.
Antes da descoberta dos papéis
queimados na Base Aérea de Salvador, a Aeronáutica garantia que
não tinha documentos. Na versão
da Força, eles teriam sido destruídos, num total de 30 toneladas,
durante um incêndio no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, em 1998.
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