|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NO PLANALTO
Surge em Bauru o Pedro Collor do escândalo da filantropia
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Ele se chama Mauro Leite
Toledo. Integra um ilustre clã
do município de Bauru. Compareceu espontaneamente ao Ministério Público e à Polícia Federal.
Prestou depoimentos explosivos.
Delatou a farra que a família
dele empreende numa instituição
chamada ITE (Instituto Toledo de
Ensino). A fuzarca é patrocinada
pelo contribuinte, ou seja, você.
A escola foi fundada em 1956.
Vende aulas de direito. Figura nos
arquivos do Ministério da Justiça
como "entidade de utilidade pública". Para a Previdência, é uma
organização "filantrópica". Não
paga impostos. Em troca, deveria
primar no atendimento a alunos
carentes. Converteu-se, porém, em
usina de negócios oblíquos.
Há sete meses, graças ao roteiro
oferecido pelo testemunho de
Mauro Leite Toledo, abriu-se uma
investigação. Desencavou-se nos
subterrâneos da escola um feixe de
desmandos. Abaixo, laivos dos
achados:
1) parte do dinheiro arrancado
dos alunos na forma de mensalidades, taxas de matrícula e vestibular não chega à contabilidade
da escola. Toma atalhos que convergem para um caixa dois. Só entre março e dezembro de 2000 desviaram-se R$ 771.793;
2) Mauro Leite Toledo, o Pedro
Collor de Bauru, maneja munição
pesada. Recolheu-a numa vida de
serviços prestados à escola. Depois
das denúncias, foi levado ao freezer pela família. Embora sem poder decisório, ainda ocupa o cargo
de secretário-geral da instituição.
"Sou o vagabundo mais bem remunerado do país", diz. Ele entregou às autoridades relatório de
auditoria da Soteconti Auditores
Independentes. Traz a análise das
contas da faculdade de 1995 a
1997. Contabiliza "desvio de numerários" de R$ 10,067 milhões.
Anota os nomes dos beneficiários.
São todos Toledo. Não escapa nem
o denunciante;
3) a Soteconti farejou "evasão de
receita". Entre fevereiro e julho de
1997, evaporaram R$ 582.388. Eis
a anotação dos auditores: "Fomos
informados (...) de que parte do
valor foi utilizada para a compra
de notas fiscais de prestação de
serviços para cobrir saídas de caixa sem comprovação, cujos serviços jamais foram prestados, e o
restante foi considerado como suprimento de caixa paralelo";
4) o embuste não alcança apenas as notas de serviço. Lotes de
notas frias de fornecimento de
material também aportam nos livros contábeis da faculdade. Uma
delas registra a compra de R$
3.360 em cimento, no dia 3 de
agosto de 2000, na firma Panorama Materiais de Construção, de
São José do Rio Preto. Contatada
pelo repórter, a Panorama informou: não fez negócios com a faculdade dos Toledo. Confrontada
com a via do talonário, a nota levada aos arquivos da escola confirma sua vocação glacial. O logotipo não bate, a data de emissão é
outra (24 de dezembro de 1999), a
forma de preenchimento é distinta, o valor é inferior e o produto
vendido não é cimento. Preenchida em computador, a nota gelada
traz na lateral direita o nome de
quem a imprimiu: Albert Gráfica
Ltda. A via do talonário, redigida
à mão, foi encomendada à Grafi-City Gráfica Ltda.;
5) outra nota informa que, no
mesmo dia, 3 de agosto de 2000,
adquiriu-se R$ 1.543,50 em concreto da firma Concreband Ltda.,
também de São José do Rio Preto.
A nota traz o número 19.638. Na
quinta-feira, por volta das 16h, a
última nota emitida no balcão da
Concreband ostentava o número
15.510. O talonário contém cinco
vias de cada nota. O documento
da escola faz menção a seis vias.
Um acinte;
6) nacos da contabilidade da escola de Bauru foram ao lixo. Venderam-se diários de caixa e outros
documentos para uma firma de
reciclagem de papel. Dados relativos à suposta concessão de bolsas
de estudo a alunos pobres em 1999
e 2000 foram inutilizados;
7) impedida por lei de receber
salários, a alta direção da faculdade embolsa estipêndios sem paralelo no mercado educacional. A
paga mais generosa alça a R$ 28
mil. A fraude está documentada
em planilhas individuais. Cada
Toledo tem a sua. Há ainda um
papel batizado de "Levantamento
da Folha de Pagamento Família
Toledo";
8) os principais parceiros do butim são Ana Maria Leite Toledo,
Maria de Lourdes Leite Toledo,
Edson Márcio Toledo Mesquita e
Antônio Eufrásio de Toledo Filho.
Este último beliscou, em setembro
de 2000, quatro cheques de R$
7.000. Registrados em extratos
bancários, os saques não constam
da contabilidade oficial. A prática
é corriqueira. Só de uma conta
(número 13-000313-7, agência 505
do Banespa) dissiparam-se R$
188,8 mil entre outubro e dezembro de 2000;
9) há Toledos de quem não se
exige nem a contraprestação de
serviços. Em 1997, Marina Guimarães Toledo recebeu R$ 48.590 sem
derramar nenhuma gota de suor
nos corredores da escola. Cláudia
Mansani Queda Toledo e Flávio
Carvalho Toledo foram beneficiados com R$ 23.867 embora seus
nomes não ornassem a folha de
salários da instituição;
10) os Toledo realizam com a escola inusitadas transações imobiliárias. Um exemplo: Maria de
Lourdes Leite Toledo "comprou"
do ITE, por R$ 68 mil, um apartamento de 260 m2 avaliado no mercado imobiliário de Bauru por até
R$ 200 mil. Ainda não se encontrou nenhum vestígios do ingresso
do dinheiro nas contas da instituição.
Procurado, o Toledo que atua
como porta-voz da escola, Antônio Eufrásio, indicou o advogado
Damásio Evangelista de Jesus para falar em nome da instituição. O
repórter discou cinco vezes para
Damásio, sem sucesso.
Os números da carochinha produzidos pela faculdade dos Toledo
vêm sendo gostosamente digeridos
por Brasília. O último certificado
de filantropia que a instituição
obteve na Previdência é de 28 de
março de 2000. Um pedido de renovação até 2003 aguarda decisão
do Conselho Nacional de Assistência Social.
O ministro Roberto Brant (Previdência), nunca é demasiado
lembrar, entregou ao Planalto
propostas de decretos que socorrem faculdades e hospitais filantrópicos com as contas carunchadas. Dá-lhes três anos para se
ajustar. Gente como os Toledo, penhoradamente, agradece.
Texto Anterior: Janio de Freitas: Por baixo do festival Próximo Texto: Panorâmica - Judiciário: STF indefere pedido contra Itamar Índice
|