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Filha quer exumação do corpo para "saber o que aconteceu'
Familiares também rejeitam hipótese de suicídio
PATU ANTUNES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BARCELONA
"Nunca pudemos saber o que
houve realmente com ele. Queremos esclarecer esse episódio
e que se faça a exumação do
corpo para saber o que aconteceu com ele na prisão."
A afirmação é de Maria del
Carmen Sabat, 53, filha do espanhol Miguel Sabat Nuet, localizada pela Folha na Venezuela, juntamente com Minerva Sabat, 73, sobrinha e uma
das pessoas com quem ele mais
tinha contato durante seus 23
anos de vida na Venezuela.
"Nunca acreditamos em suicídio, mesmo porque em um dos
documentos que vimos na Embaixada brasileira em Caracas
constava que ele tinha fraturas.
Para nós, Miguel foi torturado
até a morte", diz Minerva.
A hipótese de suicídio também é rejeitada pelo irmão de
Miguel, Carlos Sabat, 78, e outra sobrinha, Carmen Francisco, 61, localizados pela Folha
em Barcelona, cidade onde Miguel nasceu e de onde emigrou
para Caracas por volta de 1950.
"Não acreditamos nessa hipótese, ainda mais que falaram
que foi com o cinto... Essa é a
primeira coisa que tiram do
preso, não?", questiona Carlos.
Miguel foi preso em São Paulo em 9 de outubro de 1973. Segundo documentos do Dops,
ele teria pulado de um trem em
movimento, na estação Barra
Funda, e deixado uma mala.
Funcionários da empresa ferroviária chamaram a polícia e
através do conteúdo da mala
chegaram até ele. A família rejeita essa explicação.
"Como é que Miguel, um homem de 50 anos, ia pular de um
trem em movimento?", afirma
Carlos. Minerva Sabat diz ter
sido informada pela Embaixada brasileira em Caracas, à época da morte, de que Miguel foi
preso ao voltar de Buenos Aires
para Caracas. Ele teria sido revistado e em sua mala foram
encontrados documentos que
levaram à sua detenção.
Nos papéis, Miguel demonstraria ser comunista e ter sofrido perseguição da Igreja Católica -ele seria o autor de uma
certa filosofia "Hectólogos para la Paz y la Fraternidad Universal". A família não reconhece que ele possa ter tido militância política relevante.
Maria del Carmen, a segunda
dos três filhos que Miguel teve
na Venezuela e com os quais
pouco contato mantinha, diz
que seu pai sempre teve trabalho fixo e não era de conhecimento da família que ele pudesse estar envolvido com algum tipo de organização.
Mas alguns meses antes da
viagem a Buenos Aires, Miguel
teria confidenciado a Josefina
Díaz, sua ex-cunhada, que o estavam perseguindo e queriam
matá-lo. Naquele momento,
Miguel teria problemas financeiros, o que dificultava sua fuga da Venezuela.
Para Carlos Sabat, Miguel foi
a Buenos Aires e em seguida ao
Brasil para tentar resgatar uma
dívida contraída com sua família durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939).
Família distante
Segundo filho de uma família
de cinco irmãos, Miguel não
contava aos parentes na Europa detalhes da sua vida na Venezuela. Casado com Adoración Díaz, também de Barcelona, ele manteve um relacionamento distante com os três filhos, Lorenzo, Maria del Carmen e Miguel, por conta do divórcio pedido por ela.
"Quando eles se separaram,
nós éramos pequenos, Lorenzo
tinha 4 anos. Meu pai ficou
muito chateado com a separação e depois disso nos vimos
poucas vezes", conta Maria del
Carmen. Ela viu Miguel pela última vez aos 16 anos, em 1970.
Miguel e Lorenzo o viram em
1971. Em 30 de novembro de
1973, provável data da morte,
Maria del Carmen estava estudando na Inglaterra. A notícia
chegou só 20 anos depois.
"Nós só soubemos da morte
dele em 1992 ou 1993, minha
mãe já tinha falecido também.
Descobrimos porque fomos ao
Ministério das Relações Exteriores, foi a idéia que nos ocorreu, pois ele era estrangeiro."
Segundo Minerva, alguns
anos antes de morrer, Miguel
vivia com uma colombiana, a
primeira a receber notícia da
morte. Mas por não estarem legalmente casados, ela não pôde
retirar documentos na embaixada brasileira em Caracas.
"Sempre quisemos saber o
que aconteceu com nosso pai.
Mas acho que tínhamos medo,
não sabíamos por onde começar. Agora queremos que tudo
se esclareça", conclui Maria del
Carmen.
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