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São Paulo, domingo, 20 de abril de 2003

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ELIO GASPARI

O erro novo de Berzoini com a fila dos pobres

A maior distância do universo é aquela que começa nos erros do governo passado e termina nos acertos futuros do governo presente. Veja-se o que fez o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, ao saber de uma reportagem de Ernesto Paglia que mostrava uma fila de aposentados num bairro de São Paulo. Ela começa no fim da tarde e, falando baixo, atravessa a noite. Busca uma das 250 senhas distribuídas a partir das 9h da manhã. Luz de poste, banheiro zero.
A fila, no bairro da Liberdade, dá acesso ao Juizado Especial Federal e leva o cidadão a uma espécie de paraíso. Um fórum onde um juíz pode decidir seu caso na hora. O fim da empulhação. Berzoini atribuiu a fila a anos e anos de abandono (parcialmente falso) e disse que só se resolve esses casos com os recursos do orçamento de 2004. (Inteiramente errado.)
Veja-se o caso da primeira pessoa da fila na noite de segunda-feira, três dias depois da aula de Berzoini: Carmem Miranda tem 52 anos, mora em Guarulhos e chegou pouco antes das 21h. Cobre a cabeça com um cachecol. Veio com genro, o funileiro Elias José da Matta, de 39 anos. Quando o dia raiar, ele vai trabalhar. Carmem guarda o lugar para o pai, João Clemente de Oliveira, de 82 anos, aposentado há cerca de 20 porque cortou quatro dedos de sua mão. Ele virá às 5h da manhã, trazido pela filha. Qual é o pleito? Tendo trabalhado por quase 30 anos, Clemente recebe R$ 133. (Contra R$ 2.600 do metalurgico Luiz Inácio da Silva, que hoje os acumula com R$ 6.830,42 líquidos do presidente Lula).
Graças ao Juizado Especial da Justiça Federal, o fórum da Liberdade está inteiramente informatizado. Os juízes são 18, mas até o inicio da semana passada os procuradores do INSS eram seis, para três computadores. (Acredita-se que virão mais dez procuradores.) A Justiça Federal pode colocar até 30 novos juízes. A fila da Liberdade é produto do encontro da eficácia (o atendimento) com a inépcia (a falta de misericórdia dos pachás do INSS, que desestimulam acordos em casos de valores baixos, suficientes para a choldra).
Alguem deveria fazer uma pergunta à turma do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social: "Quando foi a última vez que o companheiro entrou numa fila noturna?"

Na merenda, os paloccistas de Ribeirão optaram pelo erro velho

O companheiro Antonio Palocci Filho, ex-prefeito de Ribeirão Preto, precisa pedir aos vereadores petistas da cidade que defendam a sua administração sem cometer erros velhos. No início do mês, uma ação do PT na Câmara de Vereadores mandou ao arquivo um pedido de prorrogação do prazo de funcionamento de uma Comissão Especial de Estudos que tratava das coisas estranhas sucedidas com a merenda escolar durante o seu mandato. Arquivar investigação é erro velho. Veio o troco. Na quinta-feira, a vereadora Silvana Resende (PSDB) conseguiu criar uma nova comissão, com o mesmo propósito. Teve o apoio de 16 de 19 vereadores, entre eles quatro petistas.
A merenda escolar e a compra de cestas básicas durante gestão palocciana deixaram três problemas no caminho do atual ministro da Fazenda. A saber:
1) Uma despesa de R$ 5,5 milhões para a compra de alimentos da merenda foi decidida sem o respeito à norma federal que pede a presença de técnicos em nutrição nas comissões de licitação. Venceu a empresa Cathita, de São Caetano. A falta de técnicos já tinha acontecido. A outra vencedora chamara-se Gesa. Também de São Caetano;
2) Noutra licitação, de 40.500 cestas básicas, a prefeitura exigiu que os candidatos incluíssem latas de "molho de tomate refogado e peneirado, com ervilhas" em suas ofertas. Denunciou-se que só a firma gaúcha Oderich produzia esse molho e que só o vendia por intermédio de uma empresa de São Caetano. Qual? A Cathita. Três empresas habilitaram-se para vender as cestas. Uma era a Cathita. O ministério público glosou a operação e o prefeito Palocci suspendeu a compra. Dias depois, a justiça concedeu uma liminar congelando a transação.
3) Suspensa a licitação do molho de tomate com ervilha, era preciso comprar cestas básicas para os pobres de Ribeirão Preto. Fez-se uma compra emergencial junto à Gesa. Tudo nos conformes. Salvo o seguinte: A Cathita pertence aos senhores Fausto Avoglia e Otávio Gottardi. E a Gesa? A duas senhoras, Rosana Avoglia e Suzana Gottardi, casadas com Fausto e Otávio.
O então prefeito Palocci abriu uma sindicância para conferir a lisura do trato. Não se sabe de conclusão. O Ministério Público investiga o caso.

Sem essa

José Serra não será candidato a prefeito de São Paulo. Em hipotese alguma.

Com essa

Fernando Henrique Cardoso só pensa naquilo: o Alvorada

Justiça devida

Passou praticamente despercebida, ou pelo menos pouco reconhecida, a morte, em fevereiro, aos 95 anos, de Scylla Medici, viúva do general Emílio Medici, presidente do Brasil entre 1969 e 1974.
Seria injusto que a vida exemplar dessa senhora não fosse lembrada pela devoção ao marido, pela austeridade e discrição pessoais. Seria ainda mais injusto deixar sem registro que a viúva Medici nascida numa família de prósperos estancieiros, morreu em condição econômica precária. Essa circustância revela as virtudes da família em que viveu e as misérias da sociedade em que morreu. Seu marido foi general e presidente. Passou pelo poder com tamanho escrúpulo que vendia seus bois antes de assinar aumentos da carne. Esse é o capítulo da grandeza da família.
O capítulo da miséria da sociedade está na circunstância de uma austera viúva de general, mãe de professor aposentado de universidade federal, chegar ao fim da vida em relativa dificuldade financeira.

Boa notícia

Vem aí um gesto de grandeza e humildade. A presidência de Lula acabará com o desterro geográfico, burocrático e intelectual do diplomata Francisco Alvim, atual cônsul em Rotterdam.
Um dos valentes de sua época, o sereno Chico Alvim é um dos maiores poetas do idioma.

EREMILDO, O IDIOTA

Eremildo é um idiota e acredita em tudo. Em 1970, acreditou numa história de Guerra Popular que o PC do B faria no Araguaia. Ia embarcar no mesmo onibus que José Genoino mas, por idiota, chegou atrasado na rodoviária. Lastimou sua inépcia até que, 15 anos depois leu um entrevista de Genoíno dizendo que aquilo foi um grande engano.
Sabendo-se idiota, Eremildo passou a achar tudo o que José Genoíno acha. Em 1984 Eremildo lutou como um fox-terrier enfurecido para impedir que o PT apoiasse a eleição de Tancredo Neves. Quinze anos depois soube que Genoíno achou que aquilo foi um grande engano. Em 1989 idiota também combateu a aliança do PT com Ulysses Guimarães. Agora acaba de saber que Genoíno viu na decisão um grande engano.O idiota entendeu que se deve esperar 15 anos para se associar o pensamento à ação de Genoíno. De qualquer forma, Eremildo consolou-se ao saber que o ilustre hierarca, admite ter mudado de idéias , sem ter mudado de lado. O que o idiota não entende é como a caciquia petista possa estar do lado em que sempre esteve se os prédios do Citibank continuam à direita de quem sobe, tanto na avenida Paulista quanto na Lexington, em Nova York.


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