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ELIO GASPARI
Lula e sua diplomacia da canelada
Se ninguém fizer nada, antes do fim do seu primeiro
mandato, Lula incompatibiliza
o Brasil com boa parte do mundo. Logo ele, que é uma figura
biograficamente estimada. Formado nas lutas sindicais e no
oposicionismo retórico, Lula habituou-se a entrar nos plenários
jogando em todos os conflitos.
Reforma agrária? Já. Calote?
Sempre. Maioria parlamentar?
Trezentos picaretas. Todas as
bobagens que disse ao longo de
três décadas não produziram
um contencioso maior do que
lembranças inoportunas. No
poder, a história e os riscos são
outros.
Nas relações internacionais,
exercício de uma agenda compulsiva leva a desastres. Humilhada, a candidatura brasileira
à presidência da Organização
Mundial do Comércio já foi a
pique. A pretensão herdada de
FFHH de uma vaga cativa no
Conselho de Segurança da ONU
azedou. (Justiça seja feita, azedou pelas restrições feitas ao Japão e, em certa medida, à Alemanha.) As relações do governo
brasileiro com o da Argentina
nunca estiveram piores, desde
que os dois países têm presidentes civis.
Se tudo isso fosse pouco, Lula
resolveu se jogar na disputa pela
secretaria geral da Organização
dos Estados Americanos. A OEA
é uma esplêndida inutilidade.
Serve para empregar amigos y
amigas. Sua secretaria-geral vagou porque o titular, o ex-presidente da Costa Rica Miguel Angel Rodriguez, renunciou para
se defender, em seu país, de um
escândalo de ladroagens.
Há dois candidatos ao lugar: o
ministro do interior do Chile,
Jorge Miguel Inzulza, e o chanceler mexicano Luis Ernesto
Derbez. Já se realizaram cinco
votações e os dois estão empatados com 17 votos cada um. Lula
apóia o chileno. Até aí é o jogo
jogado. O Brasil precisava escolher um entre dois candidatos e,
sem ofensa, ficou com Inzulza.
Eis que o companheiro almoça
com seu colega chileno Ricardo
Lagos e promete sair em campanha, ajudando seu candidato.
Novamente, é o jogo jogado, admitindo-se que o presidente
brasileiro não tenha coisa mais
importante para fazer. Foi então que Lula prometeu:
"Vamos falar com muita gente porque a OEA merece o melhor".
Precisava desqualificar o candidato mexicano? Ganha uma
viagem a Cuba quem achar
uma declaração semelhante
partida dos chilenos. É a diplomacia da canelada, que Lula
aprendeu nos corredores da Delegacia Regional do Trabalho
com patrões que combinavam
uma coisa e faziam outra. Hoje,
seus parceiros e seus adversários
são outros. Se porventura o candidato chileno prevalecer, Lula
terá colocado algumas gotas de
mágoa no pote das relações com
o México.
Não há na OEA uma disputa
entre o pior e o melhor. Há, no
máximo, um choque de pontos
de vista. O candidato brasileiro
à presidência da OMC ficou na
lanterna do apronto e foi retirado do páreo. Isso não significa
que ele ou Lula tenham sido
considerados piores que os sobreviventes.
A diplomacia da canelada começou em 2003. Depois de uma
reunião da OMC, Lula disse que
deu "uma trucada" nos países
ricos. Em outubro do ano passado, quando resolveu disputar a
presidência da organização, o
chanceler Celso Amorim, desqualificou o candidato uruguaio Carlos Pérez del Castillo.
Disse que sua atuação na Conferência de Cancun "não teve
futuro", expressão que não quer
dizer nada, mas que não quer
dizer boa coisa. Segundo Amorim, Castillo "desgostou muito
os países em desenvolvimento".
Numa patifaria do multilateralismo, o companheiro poderá
ser obrigado a escolher entre
Castillo e o duque do protecionismo europeu, o francês Pascal
Lamy.
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