São Paulo, domingo, 20 de agosto de 2000


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OBRAS PÚBLICAS

Ponte rodoferroviária liga São Paulo ao Mato Grosso do Sul

Obra recebe R$ 185 mi após parecer contrário do TCU

ELIANE SILVA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

A obra do Fórum Trabalhista de São Paulo não foi a única a receber, mesmo sob suspeita de irregularidades, milhões de reais governo federal. A ponte rodoferroviária de 2.600 m e dois andares sobre o rio Paraná, ligando o Mato Grosso do Sul a São Paulo, recebeu R$ 119,2 milhões da União em 97 e mais R$ 66,2 milhões em 98.
Nos dois anos, a ponte estava incluída na lista das obras cujas execuções orçamentárias eram vedadas porque uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) em 96 havia detectado irregularidades graves.
A obra, inaugurada pelo presidente Fernando Henrique em 29 de maio de 98, teve um custo total de R$ 586,3 milhões (ou US$ 566,7 milhões, seguindo os valores do dólar da época de liberação das verbas). O Estado de São Paulo, executor da ponte, liberou R$ 322,6 milhões. A União repassou ao todo R$ 263,7 milhões.
A auditoria dos técnicos do TCU identificou falhas graves em termos que foram aditados ao contrato de licitação assinado em 91. O projeto básico da ponte foi alterado, trocando o concreto protendido por treliça metálica, aumentando a altura do gabarito de navegação de 10 m para 13 m e alargando a faixa rodoviária de 9,6 m para 14,7 m.
Outra mudança foi a inclusão de obras complementares de acesso à ponte. Essas duas alterações acarretaram uma elevação de 144% no preço licitado da obra. Além disso, foram detectados erros de cálculo no famoso fator K (reajustava os preços na era inflacionária) que favoreciam a construtora, distorções no total de horas orçadas e alguns preços de materiais teriam sido cotados pela própria empreiteira, o que é ilegal.
As irregularidades foram discutidas na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso. Legalmente, a ponte só poderia receber recursos da União depois que "medidas saneadoras" fossem tomadas pelo Executivo e comunicadas ao Congresso.
Segundo a secretaria da comissão, em 97, o Executivo não enviou nenhum tipo de comunicação sobre a adoção das "medidas saneadoras". Em fevereiro de 98, o Congresso recebeu um comunicado do Executivo com esclarecimentos sobre a ponte, que foi arquivado, sem votação, em julho.
"Esse papel fiscalizador do Congresso é frágil, quase ficcional. Não há corpo técnico para acompanhar a execução orçamentária", diz o deputado federal Giovanni Queiroz (PDT-PA), integrante da comissão há oito anos.
Segundo o deputado, os técnicos do TCU, órgão auxiliar do Poder Legislativo, são muito competentes, mas no julgamento das auditorias, que ele chama de "julgamentos políticos", ocorre a "permissão de superfaturamento e das ilegalidades detectadas".
O vice-presidente do TCU, o ministro Humberto Souto, nega o caráter político do órgão e diz que a fiscalização na obra da ponte foi um dos melhores trabalhos do tribunal nos últimos anos.
O deputado federal Sérgio Miranda (PC do B-MG), integrante há sete anos da comissão, faz uma autocrítica em relação à fiscalização no caso da ponte. "Depois a gente vê que poderia ter se dedicado mais a essa obra, mas o governo FHC se empenhava muito nessa obra. Acho que era uma forma de ajudar ao Olacyr de Moraes, um dos proprietários da Ferronorte e da Constran, que estava em crise."
A Constran era a responsável pela construção da ponte. A obra representava a ligação dos trilhos da Ferronorte com a malha ferroviária paulista (a Fepasa, que foi privatizada em 99) para o escoamento dos grãos da região Centro-Oeste até o porto de Santos.
A Agência Folha procurou Olacyr de Moraes em seu escritório durante a semana passada, adiantando o assunto com suas secretárias. Ele não entrou em contato com a reportagem.
Além de FHC, a ponte era uma obra defendida pelo governo de São Paulo e pela bancada paulista no Congresso.



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