|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ESQUERDA NO DIVÃ
Taxas prejudicam reforma agrária e combate à fome, diz Gunder Frank
Para sociólogo, juro corrói prioridades
FERNANDA DA ESCÓSSIA
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Estrela do primeiro dia de debates do seminário sobre hegemonia e globalização realizado nesta
semana no Rio, o sociólogo André Gunder Frank, 74, criticou
ontem a política econômica do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e disse que os juros altos já
acabaram com duas prioridades
do governo petista: a reforma
agrária e o combate à fome.
"Tudo será para pagar aos norte-americanos com dólares", afirmou Gunder Frank, hoje professor da Northeastern University,
nos Estados Unidos.
Em entrevista à Folha por e-mail, antes de chegar ao Brasil, ele
já havia mostrado preocupação
com os rumos do governo petista
e defendido a moratória.
"O Brasil já pagou o montante
original de sua dívida umas quatro ou cinco vezes. Por que pagar
ainda mais juros outra e outra
vez? O FMI [Fundo Monetário Internacional], sob o controle do
Tesouro americano, nem quer
que o Brasil e outros países latino-americanos acabem com sua dívida -porque é ela que permite o
controle externo sobre a política
interna", afirmou o sociólogo.
Gunder Frank comparou Lula
ao líder do sindicato polonês Solidariedade, Lech Walesa, que, ao
assumir a presidência do país, fez,
segundo ele, uma política monetária e fiscal mais conservadora
que a de seu antecessores.
Segundo Gunder Frank, se o
Brasil, até o final do ano, renovar
o acordo com o FMI, será mais
um indicativo de que não será
possível esperar a concretização
das mudanças prometidas.
"Não se faz a reforma agrária
sem comprar terras para os camponeses. O orçamento para isso
foi cortado. Uma vez que se toma
este caminho, é difícil mudar para
outro", afirmou ele.
"Como isso vai, ou pode, favorecer os pobres? Lula corre o risco
de terminar como [Salvador]
Allende [presidente socialista chileno deposto em 1973] ou [Hugo]
Chávez [presidente venezuelano
que enfrenta a oposição da mídia
e dos empresários], não por fazer
demais, mas por não fazer o suficiente", completou ele.
Autor de mais de 30 livros e um
dos formuladores da teoria da dependência, Gunder Frank influenciou uma geração de intelectuais de esquerda no Brasil, inclusive Fernando Henrique Cardoso,
de quem disse ser amigo.
Já veio ao Brasil várias vezes.
Perguntou, por exemplo, quem
era o autor da frase "O Brasil vai
bem, mas o povo vai mal" (o ex-presidente Emilio Garrastazu Médici). Questionado se a frase ainda
valia, disse que sim, e que era tempo de saber se o governo de Lula
seria capaz de alterá-la. "Vamos
ver se poderemos dizer que o Brasil vai bem e o povo também."
Texto Anterior: Orçamento: Social terá mais verba em 2004, diz Mantega Próximo Texto: Hegemonia dos EUA predomina no debate sobre globalização Índice
|